07 novembro, 2013

Diálogos e Consensos

DIÁLOGOS E CONSENSOS

 
Depois das investidas de Cavaco Silva no Verão, a questão da premência e obrigatoriedade do diálogo e do consenso voltou à baila, desta vez por iniciativa do Governo e das suas extensões: o CDS e, especialmente, o PSD. A esta renovada pressão, junta-se o clamor dos opinion makers do regime. O alvo é o PS.

A pressão é intensa: Cavaco Silva diz que sem diálogos e consensos não somos um país europeu normal; Marco António acrescenta que o PS se tornou um partido radical; outros declaram que o PS não tem alternativa – TEM que se sentar à mesa das negociações.


Que fundamento e viabilidade têm estes apelos/ameaças?


Recuemos a 2011. Passos Coelho faz tremendos ataques ao Governo de José Sócrates e promessas de red lines que não pisará. José Sócrates negoceia o PEC IV à sorrelfa, sem dar cavaco a Cavaco nem ao PSD. O PSD, CDS, PCP e BE chumbam o PEC IV. O Governo demite-se. Vem o Memorando de Entendimento com a Troika, uma campanha eleitoral agreste e tensa, eleições e um novo governo.


Em retrospectiva, o chumbo do PEC IV pelo PSD e CDS foi um erro crasso. Bem, na verdade foi uma manobra de assalto ao poder. Derrubado o governo, Passos Coelho subscreve um memorando mal negociado por Sócrates e pelo seu incompetente Ministro das Finanças (Teixeira dos Santos), mais duro do que o PEC IV, renegando uma boa parte das suas promessas eleitorais (ver “Outro Mentiroso” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2011/07/outro-mentiroso.html ). As outras seriam repelidas já no governo.


Após estes acontecimentos, entre o PS socrático e o PSD coelhista só há bad blood. Contudo, com o cadáver de Sócrates ainda quente, António José Seguro anuncia que é candidato à liderança do PS, para a qual vem a ser eleito. Numa primeira fase da sua liderança, Seguro colabora com o Governo, mesmo fazendo umas ameaças ocas pelo meio (ver “O Idiota Útil” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/04/o-idiota-util-antonio-jose-seguro-foto.html  ).


Instalado no poder, com o conforto de uma maioria parlamentar laranja-azul, Passos Coelho e o PSD desprezam Seguro e o PS. Em bom Português, não lhe passam cartão e recusam qualquer diálogo com significado. Por muito sonso que fosse, chegou o ponto em que Seguro se fartou e começou a opor-se efectivamente ao Governo, votando contra o orçamento de Estado de 2012. Com a nova postura verificou que evitava grande parte das chatices internas no PS e ainda ganhava popularidade. E à falta de melhor, endureceu a postura em relação ao PSD.


Sucede que em 2012 o Governo começa a ver o comboio da governação a andar para trás. De forma mais precisa, a descarrilar. Então fez-se luz no PSD: com o navio a meter água por todos os buracos orçamentais, há que envolver o PS no processo de aplicação do Memorando, dar um balde ao Seguro e pô-lo a tirar água do navio. Este, contudo, satisfeito com os resultados da sua nova postura e com as renovadas perspectivas de sobrevivência política, disse que não: vocês meteram água, agora tirem-na.


Em 2013, com as eleições autárquicas no horizonte, a vontade do PS em negociar diminui proporcionalmente ao agravamento da desagregação do Governo. Para conter a crise política, o Presidente da República obriga PSD, PS e CDS a negociar. Já era tarde. Para prevenir qualquer recaída de Seguro, o PS jurássico emitiu avisos à navegação que torpedearam à nascença a remota hipótese de consenso.


Seja como for, os maus resultados da governação aliados aos bons resultados das Autárquicas, puseram Seguro em election mode: só quer eleições e quanto mais cedo melhor, não vá o balão esvaziar. Tal como Sócrates e Coelho antes dele, Seguro só pensa em ser Primeiro-Ministro. Espera-se que, se lá chegar, tal não aconteça de forma espúria como o anterior e o actual.


Por sua vez, PSD e CDS perderam o timing do diálogo e do consenso por soberba. Agora querem fazê-lo em desespero de causa e por dois motivos: por um lado, para arrastar o PS para um acordo que o torne cúmplice e co-responsável por uma governação desastrosa e extremamente impopular; por outro lado, para aprofundar e perpetuar os desígnios programáticos do Governo para além da Troika.


A assinatura do memorando de Entendimento foi um episódio de convergência acidental entre um Sócrates encostado à parede e um Coelho ávido do poder que estava a um passo de distância. A partir daí, os partidos divergiram continuamente, crisparam e barricaram-se nas respectivas trincheiras. Face à magnitude das divergências e do antagonismo, qualquer acordo assinado agora seria uma manifestação de hipocrisia ou o resultado de forte coacção, provavelmente externa.

É grave este afastamento e crispação? É grave a falta de consenso?

Não e não. Eu sei que a opinião publicada e transmitida tem vindo num clamor crescente pedindo/exigindo diálogos, consensos e acordos, mas trata-se de pessoas que em regra pertencem ao sistema, onde pululam os interesses, as trocas de favores e os acordos interesseiros, mas a resposta é mesmo “Não”.


Estou convencido que os Portugueses querem e precisam de alternativas e possibilidades de escolha. Também estou ciente de que o actual PS está longe de oferecer uma alternativa de confiança e não contará com o meu voto. Não obstante, penso que será difícil fazer pior, ou até tão mal como o actual Governo.


Portugal não precisa de acordos suspeitos que visem decidir pelos Portugueses o que cabe aos Portugueses decidir. Umas eleições entre o António José Coelho e o Pedro Passos Seguro seria um pesadelo a somar ao que já vivemos.


1 comentário:

Anónimo disse...

Olá Professor! Boa noite!

Não há a mínima viabilidade de/ou no diálogo. Desde o 25 de Abril que da "caixa de lápis" só saiu o rosa e o laranja. Estão gastos. De facto, nem o sentir-me desnorteada e sem soluções à vista é pior que ter mais do mesmo.
As soluções existem. Para mim passa pelos movimentos de cidadãos compostos por elementos extremamente competentes e igualmente sérios. Mas e a Constituição que não o permite? Ah Diógenes! Como eu precisava da tua lanterna! Ou da do Aladino?

Beijinho

Estella