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22 janeiro, 2014

Yasukuni: O Uso e o Abuso

YASUKUNI: O USO E O ABUSO


in “The Economist” em www.economist.com

Yasukuni é um memorial aos mortos de guerra japoneses. Nele são lembrados perto de 2.5 milhões de Japoneses que morreram em combate desde 1868.

Yasukuni é também uma importante ferramenta de propaganda (e de difamação) para a República Popular da China e para as Coreias (do Norte e do Sul). Cada vez que um alto dignitário japonês visita o memorial, de Pequim especialmente, brotam gritos de protesto, indignação e insulto perante o que é representado como o ressurgimento do violento imperialismo nipónico da primeira metade do século XX.

Porquê?

O pretexto é que em Yasukuni, entre os 2.5 milhões de Japoneses homenageados, estão 14 (catorze!) criminosos de guerra Classe A. Portanto, quem vai a Yasukuni, não o faz por respeito aos 2.4 milhões, mas sim em memória dos 14.

A realidade é que o governo chinês tem interesse em diabolizar o Japão e manter acesa a imagem do Japão que varreu o Extremo Oriente entre 1905 e 1945, esquecendo que o Japão não esteve envolvido em qualquer acção bélica nos últimos 68 anos. Ao contrário da China que, desde a II Guerra Mundial, esteve em guerra, ou desencadeou escaramuças militares com a Coreia (1950/51), a União Soviética (1969), a Índia (1962) e o Vietname (1979), ou seja, com a maioria dos seus vizinhos. Nos três últimos casos, foi a China quem desencadeou as hostilidades.

Também interessa a Pequim que o “imperialismo” japonês ofusque na opinião pública a conquista, colonização e esmagamento do Tibete e do Turquestão Oriental (Xinjiang), o estacionamento de centenas de mísseis apontados a Taiwan, o bullying do Vietname e das Filipinas, a escalada de acções agressivas e provocatórias nos Mares do Sul da China e da China Oriental.

Mais incrível é que a rábula chinesa (e em menor grau coreana) seja tomada como boa e verdadeira pelos media ocidentais, que castigam um país com irrepreensíveis credenciais democráticas e um comportamento pacífico no plano internacional, exonerando uma ditadura repressiva internamente e agressiva externamente.
Recentemente, os embaixadores da China e do Japão em Washington publicaram dois artigos de opinião no “The Washington Post”. Vejamos alguns excertos:

Cui Yiankai, Embaixador da China em Washington (citações a roxo):
Shinzo Abe Risks Ties with China in Tribute to War Criminals*

His government’s efforts to accelerate Japan’s military buildup and his initiative to rewrite Japan’s largely U.S.-drafted pacifist constitution are disconcerting, […]
The prime minister has said that his changes to Japan’s constitutional military posture would only make Japan a “normal country.” Is he suggesting that the peaceful path Japan has followed is not normal? We see the homage at Yasukuni as nothing less than a challenge — not only to us but to the world.

Kenichiro Sasae, Embaixador do Japão em Washington (citações a vermelho):
China’s propaganda Against Japan**

Japan’s defense posture is quite modest. In contrast, as a result of annual increases of more than 10 percent, China has quadrupled its military expenditures, which are hardly transparent, in the past decade. During the same period, Japan has decreased its expenditures by 6 percent. We have increased our defense budget for the first time in 11 years, only by 0.8 percent in the current budget.

Japan can embrace a constructive and cooperative future for East Asia by discarding militarism.

What has become a serious, shared concern for the peace and security of the ­Asia-Pacific region is not our prime minister’s visit to the Yasukuni Shrine but, rather, China’s unparalleled military buildup and its use of military and mercantile coercion against neighboring states. The most recent example of this is Beijing’s unilateral declaration of an air defense identification zone. China has escalated the intrusion of government vessels into the territorial sea around the Senkaku Islands and in waters claimed by the Philippines, Vietnam and other maritime states in the region.

Sendo óbvio que cada um dos embaixadores defende os interesses do seu país, não deixa de ser elucidativo que o Embaixador da República Popular da China ache “desconcertante” que o Japão queira modificar a sua Constituição, mais a mais tendo esta sido elaborada por um país terceiro. Tal como é clarificador que defenda que o Japão é um país “normal” enquanto renunciar a fazer investimentos nas suas forças armadas.  É evidente que nenhuma destas estupefacções e normalidades se aplica à própria China. Parafraseando George Orwell, para a China, uns países são mais normais do que outros.

A apresentação, pelo Embaixador do Japão dos números sobre a despesa militar e o histórico comportamental dos dois países na últimas décadas, também diz muito sobre quem é o quê na Ásia Oriental.

A China está em crescendo militar acelerado e quer demarcar território e não tolera bem quem reage no mesmo campo de poder e investimento militar. Por seu lado, o Japão percebe bem que a China que enfrenta hoje é bem diferente da do século XX e vai agindo em conformidade.

Yasukuni é mais uma pequena peça do completo xadrez geopolítico da Ásia Oriental. Vale o que vale, mas é apenas um símbolo, com valor e interesse diferentes em Tóquio e em Pequim. Uns usam Yasukuni; outros abusam de Yasukuni.

P.S. É curioso notar que as visitas de governantes Japoneses a Yasukuni só começaram a preocupar e a exaltar Pequim a partir de 1985, quando o desenvolvimento económico da China começou a permitir outros sonhos de grandeur….

It is important to note that China began raising this issue with political motives in 1985. At that time, more than 20 visits by prime ministers to Yasukuni had gone unchallenged, even after 14 Class A war criminals had been enshrined there in 1978.
Kenichiro Sasae, Embaixador do Japão em Washington,
China’s propaganda Against Japan in “The Washington Post”


Cui Yiankai, Embaixador da China em Washington 
Shinzo Abe Risks Ties with China in Tribute to War Criminals

** Kenichiro Sasae, Embaixador do Japão em Washington
China’s propaganda Against Japan 

04 outubro, 2012

Imparcialidade Perigosa

IMPARCIALIDADE PERIGOSA


Na Política e nas Relações Internacionais não costuma haver grande margem para imparcialidades. Em regra há interesses, compromissos, rivalidades em jogo que impedem ou desaconselham a imparcialidade. Quando não existem esses factores, normalmente a distância e o poder do actor em relação à disputa tornam a sua imparcialidade (ou falta dela) irrelevante. Se se tratar de uma Superpotência, a questão da irrelevância não se coloca, portanto uma eventual imparcialidade só pode derivar do desinteresse, leia-se, da falta de interesses relevantes na área.

Como já referi noutro post publicado a 30/08/2012 (Senkaku & Takeshima em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/08/senkaku-takeshima.html , a China tem múltiplas disputas marítimas (delimitação de águas territoriais com 6 países asiáticos. Em 2010, Hillary Clinton fez uma declaração relativa ao Mar do Sul da China repudiando acções unilaterais, apelando a um código de conduta, à resolução das disputas  de acordo com o Direito Internacional, à garantia da liberdade de navegação e distanciando os Estados Unidos destes conflitos.

 O Mar do Sul da China (South China Sea) e as pretensões marítimas da China e de Taiwan (a vermelho) e do Vietname (a amarelo).
in STRATFOR em www.stratfor.com

Este Verão, porem, o Departamento de Estado criticou a China por escalar o conflito. Logo se levantaram vozes críticas nos EUA (e na China obviamente) contra esta atitude. Por exemplo, Douglas Paal (investigador do Carnegie Endowment) escreveu que “[….] Washington will need to protect its position of impartiality and avoid repetition of the misconceived State Department press statement.”

Embora se trate apenas do remate de um artigo (http://carnegieendowment.org/2012/08/11/dangerous-shoals-u.s.-policy-in-south-china-sea/dc0c), este tipo de posição enferma de vários problemas:

1-    O receio de enfrentar a China e os interesses chineses, mesmo quando estes afectam as potências ocidentais. Tal atitude (ou a falta dela), facilitou a rápida ascensão política, económica e militar da China nas últimas décadas. Isso não é intrinsecamente negativo, excepto quando é feito com prejuízo de terceiros, como é frequentemente o caso.

2-    O Mar do Sul da China é uma região de elevado interesse estratégico global, especialmente para os estados ribeirinhos e para o Japão, as Coreias, os Estados Unidos e a Rússia. Não é, portanto, uma área em relação à qual Washington se possa dar ao luxo da indiferença. Tanto assim é, que os EUA têm investido crescentemente politica e militarmente na mega-região da Ásia-Pacífico.

3-    Quando os poderes e a dimensão dos actores em jogo são tão díspares, como acontece com a China e os restantes 4 interessados no Mar do Sul da China (Vietname, Filipinas, Malásia, Taiwan e Brunei), uma atitude de imparcialidade equivale a um apoio tácito a Pequim, o que é absolutamente contrário aos interesses de Washington.

Paal aduz ainda que no Mar do Sul da China ainda não se atingiu “the Sudetenland moment”, numa referência à Conferência de Munique de 1938 que, para todos os efeitos, deixou a Checoslováquia à mercê do III Reich. Pois não, não estamos de facto num “Sudetenland moment”. O problema reside em retirar conforto desse facto. Se estivermos à espera do “Sudetenland moment”, então será demasiado tarde. Nesse momento, restarão duas opções aos EUA:

·         O appeasement, que será uma capitulação e a entrega da região ao domínio chinês.

·         Ou a guerra, que poderá bem ser a III.

Como nenhum destes desenlaces se afigura agradável, bom será que os EUA sejam proactivos nesta matéria para prevenir males maiores.

19 abril, 2012

Índia: China na Mira

ÍNDIA: CHINA NA MIRA

  
Lançamento do Agni V.
in “The Wall Street Journal”

Em Janeiro a Índia tornou-se o 6º país no mundo a operar um submarino de propulsão nuclear: o INS Chakra da classe Akula II adquirido à Rússia (onde era o K-152 Nerpa).
Em 2013, a Índia lançará ao mar o INS Arihant, de concepção e construção indiana, e que transportará mísseis balísticos com capacidade nuclear.
Ontem a Índia testou o míssil Agni V. Disparado da Baía de Bengala, o Agni V cumpriu todos os parâmetros previstos e atingiu o seu alvo no Oceano Índico a 5000km de distância.
Estes desenvolvimentos mostram-nos que a Índia está a atingir aquilo que podíamos qualificar como a idade adulta da sua capacidade nuclear:
·        A que a Índia está na fase final de desenvolvimento de um ICBM (Inter-Continental Ballistic Missile), o que representa a capacidade de atingir alvos com ogivas nucleares, a longa distância e com precisão.
·        A Índia está em vias de alcançar a tríade nuclear: capacidade nuclear terrestre, naval e aérea.
O que é que isto significa em termos geopolíticos?
Normalmente, quando se soma “Índia” e “capacidades militares”, o resultado é “Paquistão”! Desta vez, o cálculo tem de ser outro. O arsenal nuclear indiano, incluindo os seus vectores, foi pensado tendo o Paquistão como alvo provável. Hoje, New Delhi tem mísseis de curto e médio alcance e meios aéreos que lhe permitem atingir qualquer alvo no Paquistão. Aliás, a prioridade indiana em qualquer conflito com o Paquistão passa por o resolver sem recurso a WMD (Weapons of Mass Destruction), dada a sua superioridade em armamento convencional.
Então temos de mudar a equação: “Índia + capacidade nuclear de longo alcance = “China”!!!
A Índia e a China sustentam uma rivalidade que tem décadas: combateram uma guerra fronteiriça em 1962; têm uma fronteira comum de 4000km sobre a qual têm múltiplas pretensões conflituantes; e são hoje as principais potências ditas emergentes, com aspirações a tornarem-se grandes potências (a bem dizer, a China já o é). A China tem estendido a sua presença e influência no Índico (Paquistão, Birmânia) com o intuito principal de proteger as linhas marítimas de abastecimento da sua economia, enquanto que a Índia tem dado os primeiros passos para marcar presença no Mar do Sul da China (Vietname) que a China encara como sendo seu.
O Agni V faz com que a Índia adquira a capacidade de atingir praticamente a totalidade do território chinês, incluindo Pequim e Xangai. Embora tal não signifique ainda a obtenção de paridade estratégica com a China, representa indubitavelmente um incremento substancial da capacidade dissuasora indiana. Podemos dizer que o Agni V, quando estiver totalmente operacional, será uma seta potencialmente apontada ao coração da China.
A evolução da correlação de forças entre os principais players asiáticos (China, Japão e Índia) e os Estados Unidos, será das questões geopolíticas mais palpitantes dos próximos anos (ou décadas).

22 janeiro, 2011

Hu em Washington

HU EM WASHINGTON
 

A visita de Hu Jintao, Secretário-Geral do Partido Comunista Chinês, a Washington correu bem. Não que tenha havido grandes avanços em temas importantes das Relações Internacionais globais ou nos diferendos bilaterais, mas simplesmente porque nada correu mal.

Refere-se que na anterior visita, em 2005 com George W. Bush na Casa Branca, a visita foi considerada oficial e não de estado, nem teve banquete de gala (só um almoço) e que houve umas gaffes. Como desta vez a visita foi considerada como sendo “de estado”, como houve banquete, como as gaffes não surgiram e as duas partes emitiram mensagens de cordialidade, aí está o sucesso!

Not so fast. Nestes dias ouviram-se e leram-se muitas críticas dirigidas àqueles que prevêem um futuro pouco harmonioso nas relações sino-americanas. Vozes tão distintas como as de Henry Kissinger, que na sua velhice amoleceu muito em relação aquilo que era, defendia e fazia há 30/40 anos atrás, acusaram quem defende essa evolução como apóstolos de uma nova Guerra Fria entre os EUA e a China.

Contudo, a realidade não desapareceu nem se transfigurou com os brindes de Obama e de Hu. As divergências sobre a abordagem aos problemas colocados pela Coreia do Norte mantêm-se. O posicionamento em relação aos programas nucleares do Paquistão e do Irão é diferente, para não falar dos problemas na frente económica, nomeadamente a questão cambial.

Mais importante do que estes temas é a ascensão político-militar da Pequim que, mais cedo ou mais tarde, a colocará em rota de colisão com Washington. Os Estados Unidos são a potência militar no Extremo Oriente, poder esse sustentado na forte presença naval, nas bases espalhadas por toda a região e no estacionamento de tropas no Japão, na Coreia do Sul e em Guam.

A China, na sequência do seu sucesso económico, vem assumindo uma política externa crescentemente agressiva, nomeadamente face aos seus vizinhos, enquanto, paralelamente, lançou um forte programa de modernização militar que, a médio prazo, poderá pôr em cheque a supremacia norte-americana no Pacífico Ocidental.

Se tal vier a acontecer, nenhuma das duas potências poderá recuar sob pena de entregar os pontos estratégicos e as vitais rotas marítimas vitais, desde Malaca até à Península da Coreia, ao controlo do adversário (sim, nesta altura serão abertamente adversários).
 
O Mar do Sul da China (South China Sea), zona de atrito da China com os seus vizinhos e com os EUA.
 
É evidente que as coisas não têm que ser assim, mas os países da região (Japão, Singapura, Vietname) já se aperceberam que o trend é este e não é uma cimeira simpática que vai alterar as tendências estruturantes. Simplesmente não é provável que uma grande potência em ascensão se satisfaça permanentemente com a segunda posição, nem que uma potência dominante aceite de bom grado partilhar a sua hegemonia e muito menos a sua substituição.