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03 agosto, 2020

Triângulo China-Irão-Paquistão


TRIÂNGULO IRÃO-CHINA-PAQUISTÃO

 

O Irão chegou a um acordo (China-Iran Agreement 2020) de longo prazo, 25 anos, com a China. Este acordo, originalmente proposto Xi Jinping em 2016, é abrangente, cobrindo a construção de infra-estruturas, estradas e ferrovias, comunicações, petróleo, cooperação militar e a integração de Teerão nos projectos BRI (Belt and Road Initiative) e CPEC (China-Pakistan Economic Corridor).

A parceria proporcionará ao Irão um escape à pressão económica e militar dos Estados Unidos e do antagonismo dos países árabes de pendor sunita.

Um terceiro agente, neste caso o Paquistão, também beneficiará deste “negócio”. As ligações Irão-Ásia Central-China cruzarão o território paquistanês, reforçando a importância de Islamabad e a possibilidade de uma cooperação militar trilateral propiciará um mais eficaz combate e/ou contenção à actividade terrorista na zona fronteiriça do Paquistão com o Irão, praticada por grupos rebeldes do Balochistão de ambos os lados da fronteira.

Particularmente importante para Islamabad será o substancial incremento da exportação de energia para o país, provinda do Irão (a exportação actual de electricidade é de 74 MW e poderá disparar para 3.000 MW). A isto acresce o gasoduto Irão-Paquistão, completado no lado persa, mas à espera de condições para construir do lado paquistanês, para o que a intervenção chinesa poderá ser instrumental. Finalmente, o Irão planeia construir um gasoduto de LNG (gás natural liquefeito) ao longo do CPEC. A cereja no topo do bolo para Islamabad é que esta importante rede energética passa ou termina no Paquistão, deixando a Índia, literalmente, em off-side.

Como nem tudo é perfeito, a aproximação do Paquistão ao Irão pode resultar num afastamento da Arábia Saudita, há muito o principal financiador do Paquistão, enquanto a crescente dependência da China, levará a uma relação menos amistosa com os EUA e a um maior antagonismo por parte da Índia.

Não obstante os potenciais ganhos de todos os envolvidos, o mais certo é ser a China quem lucrará mais, especialmente pelo protagonismo que deterá em todo o desenvolvimento de infra-estruturas, pelo controlo que exercerá sobre várias dessa estruturas, como as portuárias, pela garantia de importar petróleo iraniano nos próximos 25 anos com um forte desconto e ainda pela possibilidade de vir a ter um footprint militar no Médio Oriente, o que constituiria um desenvolvimento sem precedentes. Nada surpreendente: quem tem mais dinheiro, maior capacidade técnica e mais poder, lucrará sempre mais.

A concretização deste acordo poderá redundar numa revolução geopolítica no Médio Oriente e no Sul da Ásia e numa provável escalada das tensões regionais e do envolvimento de grandes potências.

30 setembro, 2016

O Nó Indo-Paquistanês



O NÓ INDO-PAQUISTANÊS

 
O T-90, de fabrico russo, é uma peça vital da estratégia Cold Start.

No passado dia 18 de Setembro, um comando jihadista atacou uma base militar indiana em Cachemira e conseguiu liquidar 18 soldados.

Imediatamente, como de costume, a Índia culpou o Paquistão pelo ataque; embora seja provável, ainda não é líquido que os atacantes viessem do Paquistão e ainda menos que tivessem apoio ou direcção do Exército ou do ISI (Inter-Service Intelligence - Serviços Secretos Paquistaneses).

Como também é habitual, a liderança indiana, neste caso o Primeiro-Ministro Narendra Modi e o Ministro da Defesa trovejaram retaliações. Finalmente, como também é habitual, pouco se viu de público, notório e relevante ao nível da retaliação. A Índia afirma ter feito um raid de forças especiais em que teria matado muitos militantes. O Paquistão nega que a Índia tenha entrado no seu território, mas que iniciou um duelo de artilharia que provocou a morte de dois soldados paquistaneses.

Apesar das ameaças, das pressões de poderosos grupos nacionalistas na Índia e até do ocasional clamor da opinião pública, os ataques terroristas na Índia, levados a cabo por grupos paquistaneses não provocaram significativas retaliações de New Delhi. Porque não, mais a mais sendo esta bem mais poderosa do que o Paquistão?

Muitos podem não gostar da resposta, mas esta resume-se em duas palavras: ARMAS NUCLEARES.

 
O míssil nuclear Haft IX (Vingança) é o antídoto paquistanês para o Cold Start.

Pois é, a receita que tão bem resultou entre a União Soviética e os Estados Unidos, também vai resultando entre Islamabad e New Delhi. Senão vejamos:

Suponhamos que uma organização paquistanesa, por exemplo, o Lashkar-e-Taiba (LeT) desencadeia um ataque terrorista de grande impacto em Bombaim, lançando o caos na capital económica da Índia. O Governo quer retaliar e a população exige-o. Se optar por uma invasão em larga escala do Paquistão, este poderá retaliar com um contra-ataque nuclear contra alvos importantes na Índia para a fazer recuar. Esta, por sua vez, retaliará e teremos um cenário de destruição e morte sem precedentes nos últimos 70 anos. Não é viável.

Então, os Indianos desenvolveram uma estratégia designada Cold Start que consiste numa ou várias incursões localizadas, rápidas e demolidoras em território paquistanês, executadas por forças mecanizadas, com apoio aéreo, mas não penetrando profundamente em território inimigo para não ameaçar os centro do poder político e militar e evitar uma retaliação nuclear maciça.

Contudo, a seguir ao tit, vem o tat (tit for tat), ou mais eruditamente, gera-se uma situação de estímulo-resposta, neste caso uma escalada militar. Então, o Paquistão apostou no desenvolvimento e emprego de armas nucleares tácticas, ou de teatro (battlefield nuclear weapons), que têm menor alcance e potência e se destinam especificamente a travar e destruir as forças inimigas, mas não os centros de decisão, nem as grandes cidades. Neste caso, a força invasora seria dizimada com armas nucleares, melting the Cold Start. A expectativa de Islamabad é que, dado o carácter limitado destas armas, elas não desencadearão uma retaliação total da parte da Índia.

Resumindo: grupos terroristas paquistaneses atacam a Índia que não retalia com receio de provocar um conflito nuclear. Por isso, a Índia desenvolve uma estratégia convencional (Cold Start) para contornar o problema: Seguidamente, o Paquistão desenvolve uma contra-estratégia nuclear que neutraliza a anterior. E tudo regressa à estaca zero neste múltiplo conflito assimétrico: terrorismo, guerra convencional, conflito nuclear.

Então, menos mal. O Paquistão e a Índia ficam num nó, de pés e mãos atados e nada de muito mau acontece: uns ataques terroristas, uns duelos de artilharia mais ou menos inconsequentes, queixas, acusações, ameaças e bravatas e tudo volta à normalidade, até à próxima vez.

No entanto, nem tudo neste conflito é irracional; os actos, bons ou maus, têm alguma razão de ser, um objectivo, uma CAUSA. E esse é que é o nó original. Enquanto a Índia e o Paquistão não desatarem esse nó (o que é altamente improvável), a dinâmica de conflitos assimétricos permanecerá, bem como, o risco de escalada até ao patamar nuclear. Ah, esse nó também tem nome: chama-se CACHEMIRA.

 P.S. Brevemente será publicado um post sobre Cachemira.