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21 abril, 2020

Japão em Mudança


JAPÃO EM MUDANÇA

DMU (Digital MockUp) do F-3.
in “Global Security” em https://www.globalsecurity.org/military/world/japan/f-3.htm

O Japão é um dos países mais estáveis e até dos mais previsíveis do planeta, focado no progresso económico (3ª maior economia do mundo), no desenvolvimento tecnológico, na aliança com os Estados Unidos, central para a defesa e segurança do arquipélago japonês e na postura pacífica e cooperante que fazem parte integrante da política de Tóquio no pós-II Guerra Mundial.

Plano Militar
Contudo, no século XXI, particularmente na década passada, o Japão começou a mostrar um suave mas contínuo padrão de mudança. Tal passou por um gradual relaxamento nas limitações auto-impostas no âmbito militar e numa postura mais assertiva face a uma China crescentemente ameaçadora, a uma Coreia do Norte nuclear e a uma Coreia do Sul ainda marcada por ressentimentos passados.

Agora, o Japão leva o seu incremento militar a um novo patamar lançando o processo de concepção, construção e incorporação de um caça de 5ª geração, o F-3, que deverá substituir os F-2 (um offshoot do F-16) e os F-15. O F-3 coexistirá com o F-35 Joint Strike Fighter de fabrico norte-americano (Lockheed-Martin), mas o objectivo do Japão é conceber um avião que cumule as características do F-35 e do F-22 Raptor, tornando-o melhor do que qualquer um dos mais recentes caças americanos.

Depois de a aquisição de caças F-22 pelo Japão ter sido vedada pelos EUA, Tóquio optou por assumir a liderança e o controlo do projecto do F-3. Contudo, o Japão estará receptivo às abordagens feitas pelo Reino Unido e pelos EUA no sentido de integrarem o desenvolvimento do projecto do F-3, mas a maior quota-parte do projecto ficará a cargo da indústria aeronáutica nipónica.

O desenvolvimento do F-3, the Next Generation Fighter (NGF) é vital para o Japão manter a capacidade militar que lhe permita fazer frente à crescente ameaça da China, cujo orçamento para a defesa quadruplicou entre 2008 e 2018 e cujo comportamento no Extremo Oriente se pauta por uma hostilidade e agressividade crescentes.



Global supply chain

Plano Económico
As importações da China para o Japão caíram 50% em Fevereiro deste ano na sequência da paragem económica chinesa devido ao corona vírus. A exemplo do que vai sucedendo nos Estados Unidos e noutros países, o Japão consciencializou as vulnerabilidades resultantes das global supply chains que se tornaram uma componente vital do comércio internacional e um factor na deslocalização empresarial.

Perante este cenário, o governo japonês, no quadro do seu pacote de estímulo da recuperação económica, alocou 2.2 biliões US$ de incentivo à saída da indústria japonesa da China, sendo 2 biliões afectados ao regresso dessas unidades industriais ao Japão e os restantes 200.000 para empresas que se desloquem para países terceiros.

Esta medida, se for bem recebida pelas empresas, trará várias vantagens para o Japão: reforçar o tecido industrial localizado no seu território, maior proximidade das cadeias de fornecimento, maior empregabilidade e receita fiscal, aproveitamento das capacidades japonesas ao nível da alta tecnologia, tais como robótica, automatização, inteligência artificial e 3D printing. Last but not least, o Japão reduz a dependência da China e recupera alguma autonomia.

Resumindo, a ameaça chinesa, a ameaça epidémica, a crescente tensão geopolítica na região da Ásia-Pacífico, algumas dúvidas sobre o papel que os EUA estarão dispostos a desempenhar na segurança do Pacífico Ocidental e um prevalecente clima de incerteza internacional, levam o Japão a tomar medidas que defendam os seus interesses geopolíticos, económicos e de segurança. Tal é feito para bem do Japão, mas é de esperar oposição da China e da Coreia do Sul que resistem sempre a qualquer movimento nipónico no sentido de mais autonomia e assertividade.

08 dezembro, 2013

Senkaku: A Sarajevo do Pacífico?

SENKAKU: A SARAVEJO DO PACÍFICO?

 
O Mar da China Oriental (East China Sea) está novamente agitado. Confinado pela China a Oeste, por Taiwan a Sul, pelo Japão a Nordeste, pela Coreia do Sul a Norte e pelo Pacífico a Oeste, o Mar da China Oriental é um espaço no qual estas potências convergem e onde os seus interesses colidem.

O mapa mostra a laranja as zonas de overlapping (sobreposição) das ADIZ do Japão, China, Coreia do Sul e Taiwan no Mar da China oriental e no Mar Amarelo.
in STRATFOR em www.stratfor.com

A mais recente de tensão foi despoletada de novo por causa das ilhas Senkaku, apresentadas aos nossos leitores a 1 de Agosto de 2012 (ver Senkaku & Takeshima em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012_08_01_archive.html) mais de um mês antes de serem notícia nos media. No dia 23 de Novembro, a China anunciou o estabelecimento de uma nova Zona de Identificação de Defesa Aérea (acrónimo inglês ADIZ). *

 Esta decisão de Pequim suscita dois problemas: as Senkaku estão sob administração e controlo do Japão que reclama a soberania sobre os ilhéus; a nova ADIZ sobrepõe-se a espaços e ADIZ’s de 3 outros países: Japão, Coreia do Sul e Taiwan. As consequências eram previsíveis:

* O Japão continuou a sobrevoar as ilhas e instruiu as companhias aéreas nipónicas para não responderem a qualquer solicitação de identificação ou de rota feita pelos Chineses nesse espaço.

* A Coreia do Sul anunciou a intenção de aumentar a sua ADIZ e deu às companhias de aviação sul-coreanas instruções similares às de Tóquio.

* Os EUA já atravessaram a nova ADIZ chinesa com dois bombardeiros B-52.

* Taiwan também já enviou patrulhas aéreas para a zona.

Não é a primeira vez que uma ADIZ é aumentada na Ásia Oriental. O Japão já o fez recentemente em resposta à crescente assertividade militar chinesa. A novidade neste caso, está na sobreposição das diversas zonas que esta medida provocou e que tem um óbvio cariz de afirmação, de provocação e de teste às reacções dos outros Estados.

O problema é que é claro nesta altura que os Japoneses, os Norte-Americanos e os Sul-Coreanos vão continuar os voos. E o que fará a China? Há duas hipóteses:

1- A China exige a identificação e rota aos aviões.

2- A China não materializa a ADIZ e nada exige às aeronaves que a atravessem.

No segundo caso, nada acontece. A China terá feito um political statement inconsequente, transmitindo fraqueza e receio e perdendo a face. Seria um grande fiasco.

A primeira hipótese desdobra-se em 3:

1A »»» Os aviões submetem-se à intimação chinesa. Japão, EUA e Coreia do Sul dão parte de fracos e convidam a China a fazer novos avanços e imposições. É altamente improvável.

1B »»» Os aviões ignoram a intimação chinesa e a China não reage, ou emite um protesto diplomático. É uma situação em tudo similar à segunda hipótese e as consequências serão as mesmas, mas é mais provável

1C »»» Os aviões ignoram a intimação e são interceptados pela Força Aérea do Exército Popular de Libertação.

Esta última seria a situação mais interessante (e dramática), porque poderia configurar um casus belli (motivo para guerra).

Não prevejo que a situação derrape a esse ponto a curto-médio prazo, mas as 3 potências asiáticas (há também a Rússia e os Estados Unidos) do Nordeste da Ásia sentem-se crescentemente desconfortáveis umas com as outras e a desconfiança é geral.

Tenho poucas dúvidas que as tensões geopolíticas na região tenderão a crescer num cenário em que os participantes têm todos pretensões conflituantes. Nestes power games, um pouco como na vida animal selvagem, exibe-se capacidades, posturas agressivas e retórica nacionalista mais ou menos exacerbada. E ninguém estará disponível para ceder ou recuar, porque tal acarreta sérios custos internos e externos.

Se o caminho for esse, o confronto será inevitável a prazo. As Senkaku são um bom candidato a ser o rastilho desse conflito, um Sarajevo do Extremo Oriente.


* A ADIZ (Air Defence Identification Zone) é uma extensão do espaço aéreo de um país. Enquanto o espaço aéreo nacional está legalmente definido como sendo o espaço sobre a totalidade do território e do mar territorial (12 milhas desde o litoral) e sobre o qual o detentor exerce total soberania, a ADIZ é estabelecida unilateralmente, para além do espaço aéreo e nela o país que a invoca, arroga-se o direito de exigir a identificação, rota e propósito de qualquer aeronave que atravesse esse espaço.

04 outubro, 2012

Imparcialidade Perigosa

IMPARCIALIDADE PERIGOSA


Na Política e nas Relações Internacionais não costuma haver grande margem para imparcialidades. Em regra há interesses, compromissos, rivalidades em jogo que impedem ou desaconselham a imparcialidade. Quando não existem esses factores, normalmente a distância e o poder do actor em relação à disputa tornam a sua imparcialidade (ou falta dela) irrelevante. Se se tratar de uma Superpotência, a questão da irrelevância não se coloca, portanto uma eventual imparcialidade só pode derivar do desinteresse, leia-se, da falta de interesses relevantes na área.

Como já referi noutro post publicado a 30/08/2012 (Senkaku & Takeshima em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/08/senkaku-takeshima.html , a China tem múltiplas disputas marítimas (delimitação de águas territoriais com 6 países asiáticos. Em 2010, Hillary Clinton fez uma declaração relativa ao Mar do Sul da China repudiando acções unilaterais, apelando a um código de conduta, à resolução das disputas  de acordo com o Direito Internacional, à garantia da liberdade de navegação e distanciando os Estados Unidos destes conflitos.

 O Mar do Sul da China (South China Sea) e as pretensões marítimas da China e de Taiwan (a vermelho) e do Vietname (a amarelo).
in STRATFOR em www.stratfor.com

Este Verão, porem, o Departamento de Estado criticou a China por escalar o conflito. Logo se levantaram vozes críticas nos EUA (e na China obviamente) contra esta atitude. Por exemplo, Douglas Paal (investigador do Carnegie Endowment) escreveu que “[….] Washington will need to protect its position of impartiality and avoid repetition of the misconceived State Department press statement.”

Embora se trate apenas do remate de um artigo (http://carnegieendowment.org/2012/08/11/dangerous-shoals-u.s.-policy-in-south-china-sea/dc0c), este tipo de posição enferma de vários problemas:

1-    O receio de enfrentar a China e os interesses chineses, mesmo quando estes afectam as potências ocidentais. Tal atitude (ou a falta dela), facilitou a rápida ascensão política, económica e militar da China nas últimas décadas. Isso não é intrinsecamente negativo, excepto quando é feito com prejuízo de terceiros, como é frequentemente o caso.

2-    O Mar do Sul da China é uma região de elevado interesse estratégico global, especialmente para os estados ribeirinhos e para o Japão, as Coreias, os Estados Unidos e a Rússia. Não é, portanto, uma área em relação à qual Washington se possa dar ao luxo da indiferença. Tanto assim é, que os EUA têm investido crescentemente politica e militarmente na mega-região da Ásia-Pacífico.

3-    Quando os poderes e a dimensão dos actores em jogo são tão díspares, como acontece com a China e os restantes 4 interessados no Mar do Sul da China (Vietname, Filipinas, Malásia, Taiwan e Brunei), uma atitude de imparcialidade equivale a um apoio tácito a Pequim, o que é absolutamente contrário aos interesses de Washington.

Paal aduz ainda que no Mar do Sul da China ainda não se atingiu “the Sudetenland moment”, numa referência à Conferência de Munique de 1938 que, para todos os efeitos, deixou a Checoslováquia à mercê do III Reich. Pois não, não estamos de facto num “Sudetenland moment”. O problema reside em retirar conforto desse facto. Se estivermos à espera do “Sudetenland moment”, então será demasiado tarde. Nesse momento, restarão duas opções aos EUA:

·         O appeasement, que será uma capitulação e a entrega da região ao domínio chinês.

·         Ou a guerra, que poderá bem ser a III.

Como nenhum destes desenlaces se afigura agradável, bom será que os EUA sejam proactivos nesta matéria para prevenir males maiores.

30 agosto, 2012

Senkaku & Takeshima

SENKAKU & TAKESHIMA

 
Senkaku e Takeshima são dois conjuntos de ilhéus no Mar da China Oriental e no mar do Japão, respectivamente. Os ilhéus nada valem per se: são demasiado pequenos para serem colonizados ou explorados de forma intensiva e lucrativa. As Senkaku são 5 ilhéus e 3 rochedos com cerca de 6km2. As Takeshima, aka Liancourt Rocks, são 2 ilhéus e vários rochedos com uma área total de 0.2km2. Porém, são tenazmente disputados pelas principais potências asiáticas: Japão, China, Coreia do Sul e ainda Taiwan e Coreia do Norte.

A Ásia Oriental (China, Taiwan, as Coreias do Norte e do Sul e o Japão e o Pacífico Ocidental. Destacadas, as Senkaku a sudoeste e as Takeshima a norte.
in STRATFOR em www.stratfor.com

 
O que está então em jogo para estas potências se bateram, para já diplomaticamente e retoricamente?

1-   Prestígio e História. Todos os contendores se julgam com direitos históricos sobre os ilhéus. Manter ou assegurar a sua posse significa prestígio interno e externo. Perdê-los ou deles abdicar emitiria um sinal de fraqueza e impotência para o exterior e representaria, no plano interno, a morte política do governo que o fizesse.

2-   Gás e Petróleo. Quer num caso, quer no outro, existem fortes indícios que os respectivos fundos marinhos possam ser ricos em hidrocarbonetos, nomeadamente gás natural. Tendo em conta que todos os pretendentes são praticamente destituídos de recursos naturais e que o único que não o é (a República Popular da China) é um sorvedouro de recursos energéticos, não surpreende que ninguém esteja disposto a abdicar de tais (eventuais) riquezas.

3-   ZEE. Com ou sem hidrocarbonetos, a posse destas amostras de terra potencia a dimensão da Zona Económica Exclusiva de quem as possuir, com as vantagens económicas que tal pode representar.

4-   Geoestratégia. Com a posse das Senkaku, prolongando as ilhas Ryukyu (das quais Okinawa é a mais conhecida), O Japão barra o livre acesso marítimo da costa setentrional da China ao Pacífico. Au contraire, a China garante um corredor de acesso ao mar aberto. A posse das Takeshima assegura um ponto de apoio para o controlo do Mar do Japão.

A Ásia Oriental é uma região em ebulição. À medida que a região cresce explosivamente em importância e poder económicos, a tendência é para que, entre as potências regionais, ocorram situações de atrito e de interesses conflituantes. Particularmente a ascensão militar da República Popular da China é vista com apreensão por quase todos os seus vizinhos. Discretamente, o crescimento do investimento militar no Japão, Coeria do Sul, Vietname, Filipinas, Singapura Indonésia, Austrália, já começou.

A agitação deste Verão tem como pretexto habitual o aniversário da rendição japonesa na II Guerra Mundial, ocasião sempre aproveitada por Pequim e Seoul para demonizar Tóquio e exigir o milésimo pedido de desculpas do Império Japonês pelos desmandos ocorridos entre 1910 e 1945.

Numa região marcada pelo mar e pela insularidade, é provável que eventuais problemas e conflitos comecem no mar em qualquer Senkaku ou Takeshima.

Nota 1: Adoptou-se neste post a designação japonesa dos ilhéus.

Nota 2: Senkaku e Takeshima não são casos únicos. As Curilhas no Mar de Okhotsk, disputadas por Rússia e Japão; as Spratly e as Paracell no Mar do Sul da China, sendo que aquelas são reclamadas no todo ou em parte por Vietname, República Popular da China, República da China – Taiwan, Filipinas, Malásia e Brunei e estas disputadas por Vietname, República Popular da China e República da China – Taiwan.