20 dezembro, 2013

Seis Meses

SEIS MESES
 
No dia 24 de Novembro, as negociações P5+1-Irão fruiram. As 6 potências e o Irão chegaram a um entendimento interino (Joint Action Plan), com a duração de 6 meses, que tem como objectivo fundamental criar um espaço de manobra, os tais 6 meses, para que os países envolvidos possam chegar a um acordo definitivo. Para viabilizar esse objectivo, tomaram-se medidas para reforçar a confiança entre as partes: travões ao programa nuclear iraniano por um lado e afrouxamento das sanções por outro.

 
Que avaliação se pode fazer deste acordo?

 
Ressalvando que se trata de uma avaliação a um acordo preliminar, o saldo é positivo, alcançando mais do que seria previsível há 6 meses atrás. Nos termos do acordo, o Irão pára a produção de urânio enriquecido a 20% e reconverte o stock já existente deste urânio; cessa a produção de combustível nuclear com mais de 5% de U 235; não constrói mais centrifugadores para enriquecer urânio, não coloca a funcionar os que se encontram parados neste momento, nem constrói mais unidades produtoras de centrifugadores; submete-se a um maior número de inspecções internacionais mais intrusivas e interrompe a construção do reactor de água pesada de Arak, passível de produzir plutónio para armas nucleares.

 
Em contrapartida, as potências libertam o equivalente a 7 biliões de US$ através do relaxamento de algumas sanções.

 
Todas estas cedências são provisórias, dependendo de um acordo definitivo.

 
É um acordo histórico como muitos disseram? Ou será um “erro histórico” como disse o Primeiro-Ministro de Israel, Benjamin Netanyahu?

 
A melhor resposta é….nim. Na verdade, tudo depende do acordo definitivo que venha (ou não) a ser assinado. Ainda pode haver um acordo histórico, um erro histórico, ou um fiasco se não houver acordo.

 
Quais são as principais questões que têm de ser resolvidas?

 
1- O Irão reclama o direitode enriquecer urânio. As potências não lho concederam, mas os termos do acordo provisório mostram que esse é um dado adquirido. Envolve riscos (Israel terá dificuldade em aceitar), mas é uma red line para Teerão.

 
2- Dando o ponto anterior por adquirido, torna-se crucial limitar e controlar essa actividade, colocando limites qualitativos (5%) e quantitativos ao enriquecimento como já faz o acordo provisório e colocando toda a actividade relacionada (produção de centrifugadores, centros de enriquecimento, produção de urânio enriquecido e o destino dado ao produto) sob rigoroso controlo da IAEA (Internacional Atomic Energy Agency).

 
3- O destino da unidade de enriquecimento de urânio de Fordow (enterrada debaixo de uma montanha nas imediações da cidade de Qom). As potências devem exigir o seu completo e verificado desmantelamento.

 
4- A central nuclear a água pesada de Arak, em construção, é altamente desestabilizadora e perigosa porque entre os sub-produtos que resultam da sua futura actividade encontra-se o plutónio que proporcionaria ao Irão um trilho alternativo para desenvolver armas nucleares. O seu desmantelamento ou conversão numa unidade de baixo risco é imperativo. Note-se que, ao contrário de outras instalações ligadas ao programa nuclear iraniano, a central de Arak é um alvo único e à superfície, vulnerável a um ataque aéreo, por exemplo, de Israel.

 
É, contudo, importante perceber que as questões relacionadas com o programa nuclear do Irão não se esgotam nas negociações com o P5+1. Existem problemas subjacentes de ordem política e geopolítica, de segurança e de percepção a que importa responder cabalmente, sob pena desse acordo poder resolver um problema e criar outros.

 
Refiro-me concretamente ao papel que venha a ser concedido ou reconhecido ao Irão no xadrez geopolítico do Médio Oriente. Se o P5+1 aceitar ou incentivar um papel de relativa hegemonia regional ao Irão, tal provocará profundo desagrado, receio e resistência em Riyadh, Jerusalém, Cairo, Ankara e no GCC (Gulf Cooperation Council).

 
Outro problema está directamente relacionado com o programa nuclear. Se Israel, a Arábia Saudita e outros não percepcionarem um putativo acordo como uma garantia real de terminus das aspirações nucleares bélicas dos ayatollahs, se persistir a percepção, convicção, ou receio que Teerão, mesmo não atingindo a capacidade nuclear no presente, retém o know-how e os meios para realizar o breakout nuclear no espaço de semanas ou poucos meses, poderemos encarar um Médio Oriente ainda mais crispado e perigoso do que o actual.

 
Nas Relações Internacionais, como noutras áreas, as percepções valem e contam. E quando assim é, a realidade e a percepção tendem a fundir-se.

 
Seis meses passam depressa. Let’s wait and see….

 
 

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