12 agosto, 2013

Amuos de Washington com Moscovo

AMUOS DE WASHINGTON COM MOSCOVO

 
Barack Obama cancelou a cimeira que teria em Moscovo, em Setembro, com Vladimir Putin.

Motivo oficial: os dossiers bilaterais mais relevantes para os EUA estão estagnados, pelo que a cimeira não teria resultados e por isso o melhor era não a realizar.

Motivo oficioso: a Rússia não extraditou Snowden para os Estados Unidos.

Motivo mais real: a situação política interna norte-americana aconselhava a tomada de uma posição de força dos EUA face à Rússia.

Motivo acrescentado por mim: Putin cancelou há pouco mais de um ano a sua presença numa Cimeira NATO-Rússia que se realizou nos EUA.
 
Putin versus Obama


Curiosamente, alguma imprensa americana, fontes oficiais e oficiosas e analistas concluíram que Putin é que queria muito a cimeira por causa do prestígio que ela lhe traria e houve quem, como o diplomata e analista, Sthephen Pifer, sentenciasse com gravidade e sem apelo, que a Rússia acabava de se tornar irrelevante para os Estados Unidos. Finalmente, o próprio Obama, numa tirada estafada a que recorre quando Moscovo não faz o que ele pretende, acusou a liderança russa de ter recaídas de mentalidade de Guerra Fria.

Os Estados Unidos não conseguem lidar com a frustração de serem contrariados. Tique de Superpotência, agravado com a eleição em 2008 de um Presidente arrogante e convencido de que com as suas ditosas palavras conseguiria mudar o mundo. Previsivelmente, deu com os burros na água. Mesmo assim, esse Presidente não mudou muito. Façamos um pequeno exercício:

1-      Se a Rússia enganasse a Rússia na aprovação de uma Resolução de intervenção de índole humanitária na Líbia, os EUA reagiriam passivamente?
2-      Se, pouco depois, os Russos tentassem a mesma jogada com a Síria, os Estados Unidos deixar-se-iam enganar novamente?
3-      Se um qualquer Snowdov procurasse asilo nos EUA, estes deportá-lo-iam para a Rússia?
4-      Se a Rússia banisse agentes políticos e dos serviços de segurança norte-americanos envolvidos, por exemplo, num espancamento até à morte de um cidadão desarmado e inofensivo, de entrarem na Rússia, Washington reagiria com conformismo?
5-      Se a Rússia condenasse histrionicamente e repetidamente os EUA por incidentes ocorridos nas Guerras do Afeganistão e do Iraque, acusando-os de desrespeito pelos direitos humanos e de autoritarismo, os EUA acusariam a culpa?

Não, não, não, não e não. E podíamos continuar.



As diferenças e semelhanças dos Estados Unidos e da Rússia na Guerra Civil na Síria.


Quanto às questões de conteúdo, a situação actual é a seguinte: Putin quer que os EUA parem a instalação de dispositivos anti-míssil na Europa; Obama quer que Putin devolva Snowden, que deixe cair Assad na Síria e que assine novo tratado de redução de forças nucleares estratégicas. Neste último caso, quere-o desesperadamente porque se convenceu por um discurso proferido pelo próprio em Praga, em 2009, que vai varrer as armas nucleares da face da Terra. É óbvio que não o vai conseguir, mas pelo menos quer coleccionar umas reduções bilaterais que acha que lhe vão conferir um lugar na história.

No cenário actual, o mais provável é nenhum dos Presidentes conseguir o que quer. Saldo final: Putin, 3 – Obama, 1.

Uma palavra final para a questão da Guerra Fria. É verdade que a Rússia continua a encarar os Estados Unidos como o seu principal rival geopolítico, o que acaba por ser normal dado o poder e preponderância que Washington tem no xadrez político mundial. Não deixa de ser curioso, contudo, que o principal antagonismo que se detecta nas lideranças políticas nos EUA, quer na Casa Branca, quer no Congresso, é em relação à Rússia. E não é por causa do autoritarismo, porque há bem pior pelo mundo, a começar pela China, mas que não gera a mesma repulsa. Ou é um problema do foro freudiano, ou então a Rússia é mesmo relevante.

Amuos e recriminações, prestígio e convencimentos à parte, certo é que, quando Obama entrou na ribalta política mundial, já Putin tinha sido eleito Presidente da Rússia duas vezes e quando Obama sair de cena, Putin provavelmente lá continuará por mais uns anos. Até por isso, me parece que Obama é capaz de precisar mais de Putin do que o contrário.

2 comentários:

Joaquim de Freitas disse...

"Possuímos 50% das riquezas do planeta, mas somente 6% da população. Nesta situação, a nossa principal tarefa no futuro será de criar um tecido de relações que nos permitirá fazer perdurar esta desigualdade."Departamento do Estado - Planning Study 23
Caro Dr. Miguel Ribeiro : Estas palavras bastam para justificar a política dos EUA e o jogo que descreve entre Putin e Obama.
A NATO, esta "aliança" de 28 países que possui 24 000 aviões de combate, 800 navios oceânicos e 50 aviões radars Awacs, está pronta para o ataque e absorve todos os anos mais de 1 000 biliões de $ de despesas de manutenção. Meios colossais em relação à tarefa indicada mais acima! O posto avançado desta autêntica força de dissuasão é a Turquia, com as suas 24 bases aéreas, navais e de espionagem eletrónica, com o Landcom de Izmir. Sem esquecer o Jfc de Lago Patria em Nápoles. Visados o Irão e a Síria .

Rui Miguel Ribeiro disse...

Eu já fui um grande defensor e admirador da NATO. Hoje em dia é uma organização um pouco à deriva, desunida, sem liderança e estratégia claras.
Cada país defende os seus interesses nacionais. Neste jogo de xadrez, Putin tem levado claramente a melhor sobre Obama.