25 janeiro, 2007

"Papá: O Fehér está nas Estrelas?"

“PAPÁ: O FEHÉR ESTÁ NAS ESTRELAS?"


Há precisamente 3 anos, levei pela primeira vez o meu filho Afonso Duarte a ver um jogo do Campeonato Nacional no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães. Era uma noite invernosa, mas havia muita gente no Estádio; afinal era um Vitória de Guimarães-Benfica.

O jogo aproximava-se do final com um persistente 0-0, até que o Benfica marcou o único golo do jogo através de um dos mais improváveis jogadores: Fernando Aguiar. Já quase ninguém se lembrará, porque nunca um golo decisivo no fim de um jogo terá sido tão irrelevante. Desse jogo ficou a memória do jogador que fez a assistência. Era Húngaro e tinha o nº 29. Já nos descontos, viu um amarelo, sorriu, caiu e não se levantou mais. Miklós Fehér.
 
O último sorriso.


Já passaram 3 anos e ainda hoje sinto um nó no estômago quando me lembro que fomos ao Estádio para ver um homem morrer. Os meus esforços para desviar a atenção do Afonso resultaram infrutíferos com a avalanche noticiosa que se seguiu em todos os media.


No dia seguinte tive uma conversa com o Afonso (tinha 4 anos, quase 5) para tentar explicar-lhe o que realmente havia sucedido. Ele ouviu-me com muita atenção e no final perguntou-me:


- “Papá: O Fehér está nas estrelas, não está?”


- “Sim Filhoteco. Está lá e deve estar a ver-nos, contente porque não nos esquecemos dele.”

Dei-lhe um abraço, olhámos para o céu e voltamos para casa.


Simão e Nuno Gomes, capitães do Benfica, colocam uma coroa de flores
no local onde Fehér caiu.
 
Seis meses mais tarde, no jardim da casa de Mindelo, jogávamos a bola e o Afonso personificava vários jogadores do Benfica: ora era o Nuno Gomes ou o Mantorras que marcavam um golo, o Simão ou o Zahovic que faziam uma finta, o Tiago, ou o Petit que faziam um passe. Até que a dada altura, foi o Fehér que marcou um golo. Fiquei estupefacto! Passados aqueles dias de Janeiro/Fevereiro, o assunto deixara de ser abordado.

E pensei que o Miklós Fehér devia estar mesmo contente, porque realmente não nos esquecemos dele. Mesmo um menino que tinha apenas 4 anos nunca mais se esqueceu de Miklós Fehér, o nº 29 do Benfica que num dos primeiros jogos que ele foi ver, fez o seu último jogo.

Eu e o Afonso sabemos que vês o Estádio da Luz com a tua camisola 29 gigante e a bandeira da Hungria e ouves os adeptos a cantarem MIKLÓS FEHÉR e os teus colegas a dedicarem-te golos e vitórias e talvez nos vejas aos dois a olhar para a tua estrela…

11 comentários:

. disse...

Foi uma cena que chocou o país, principalmente por ter sido vista em directo na tv.

Mas no dia de hoje estava à espera que relembrasse um outro jogador do seu Benfica - EUSÉBIO, que faz hoje 65 anos.

Luis Cirilo disse...

È verdade faz tres anos.
Também eu tenho uma memória muito viva desse trágico acontecimento porque,acidentalmente,acabei por o viver muito por dentro.
Ao tempo assistia normalmente aos jogos no camarote presidencial,porque embora ja nao sendo dirigente do clube era convidado por uma questão de amizade e também por,tal como tu,ser deputado na assembleia da republica.
Depois do final do jogo dirigi-me com o então presidente aos balneários,onde quer no do Vitória quer especialmente no do Benfica já reinava a consternação,a desorientação e o medo do pior.
Fui então com o presidente Pimenta Machado para o hospital,acompanhar os dirigentes do Benfica,e lá chegados tivemos a triste noticia.
Confesso que raramente vi tanto desespero,nomeadamente em Luis Filipe Vieira,em toda a minha vida e ja vi muita coisa.
Foram horas de que nunca esquecerei.
Entretanto recebi um telefonema do nosso amigo,ao tempo secretario de estado do desporto,Herminio Loureiro que estava a chegar a Guimarães mas queria entrar no hospital sem ser visto pelas dezenas de jornalistas já acampados á porta.
La tivemos,juntamente com o director do hospital,de montar um esquema para ele poder entrar sem dar tempo a perguntas .
O que se conseguiu.
Depois foram chegando jogadores do Benfica,do Vitória,dirigentes dos dois clubes tudo desesperado.
Assisti á reuniao do H.L. com LFV,PM e responsaveis do hospital, e a mais um conjunto de momentos que nao gosto de recordar.
Nomeadamente a ida de LFV á morgue.
Adiante...
De Feher prefiro recordar o tal sorriso.
E o excelente jogador que foi.

Anónimo disse...

Também para mim que não sou "tiffosa", foi emotivo de mais assitir a uns minutos, poucos, como aqueles em que os adeptos e não adeptos viram um ser humano, jovem, no pleno da vida, provavelmente cheio de sonhos e de projectos, conquistar uma vitória e, de repente, caír por terra, inanimado, mas com um sorriso e um olhar tão intenso, que parecia mais contemplar ALGUÉM que o esperava, do que festejar um golo. Para aqueles que acreditam que a Vida não termina aqui em baixo, Deus reservou para todos uma estrelinha especial. Talvez hoje, data em que uma delas se tornou mais brilhante, o Céu reserve uma surpresa e, a do Fehér esteja mais brilhante...
I.D.

Anónimo disse...

Lindo post..
O Miki ficara para sempre no nosso coração.

Rui Miguel Ribeiro disse...

Touché Ana Cristina! Confesso que nem me lembrei de tal até ter visto a informação no site de "A Bola" ontem à noite.
Felizmente, não devem faltar ocasiões para relembrar o grande Eusébio e a morte de Fehér foi algo de marcante para nós...
De qualquer forma, obrigado por "trazeres" o Eusébio até aqui!

Anónimo disse...

Foi de facto um momento triste! Imagino que para quem assistiu tenha sido ainda mais terrível.
É sempre importante lembrar estas memórias...
Alexandra

Anónimo disse...

Foi, sem dúvida, dos momentos mais marcantes e mais tristes do futebol português e da minha vida. Ainda hoje, tenho aquelas imagens bem presentes. No entanto, uma ficará para sempre - todo o estádio a chamar pelo Miki, como se posse uma mãe a chamar pelo filho para que ele não atravessasse a estrada. Mas o Miki atravessou, e partiu... para sempre!

Estejas onde estiveres, estarás para sempre na nossa memória e o teu sorriso continuará a iluminar-nos!

Anónimo disse...

Esse momento foi um marco na história do futebol português, um dia emotivo e que não deverá ser esquecido. O Fehér não merecfia tal coisa. Mas para além do Fehér, também jogadores como Pavão, Hugo Cunha ou Marc-Vivien Foé faleceram em campo, fazendo o que mais gostavam, e devem ser lembrados por isso.

O teu sorriso não será esquecido...

Anónimo disse...

Triste cena. Incrível a sensibilidade do Afonso. Muito interessante ler sobre os bastidores da tragédia pelo Luís Cirilo.

Paulo

Anónimo disse...

Magnífico post. Maravilhoso o paralelo entre a tragédia e a visão pura, inocente e humana de uma criança. Tocou-me sinceramente.

P.S. Também gostei muito de ler o comentário do Sr. Luís Cirilo.

José Manuel

Anónimo disse...

Certamente que o Fehér está nas estrelas, a olhar por todos os que o recordam com aquele belo sorriso! Lindo texto, ate fiquei emocionada!