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18 março, 2014

Back in Russia (Back in the USSR)


BACK IN RUSSIA

(BACK IN THE USSR)



One of the Beatles’ many hits was the 1968 song Back in the USSR. This post is about Crimea, but I got the inspiration for the headline from “The Beatles”.



The Beatles Back in the USSR!

Crimea is not back in the USSR, which passed away in 1991, but she’s definitely back in Russia. Actually, although many pundits like to establish analogies between present-day Russia and the former Soviet Union, it was in the Soviet time that Crimea was arbitrarily taken away from the Soviet Republic of Russia and given as a present (?) to the Soviet Republic of Ukraine. It was thus all in the family. And it is in the new Russian era that Crimea is snatched back by Moscow in the context of a serious family rift.

Celebrations at Lenin Square in Simferopol, Crimea, after the referendum.

in Agence France-Presse at http://www.afp.com/en/home/

Today’s Russia points to impressive figures: 83% voter turnout in the Crimean referendum and a 97% support for reunification with Russia.

The United States and the major European powers point to illegalities and coercion in the referendum and in the change of Ukraine’s borders.

Russia effectively annexed Crimea: first by establishing effective control on the ground, then by winning the referendum and, earlier today, formalizing Crimea’s return to Mother Russia in a ceremony in Moscow.

The West implemented some lame, symbolic sanctions targeting some Russian and Ukrainian officials, some of whom for publicly defending Crimea’s reunification with Russia. So much for freedom of thought and speech!

In spite of strong worded declarations and threats and weak sanctions from the West, this blog has long stated (A Faca e o Queijo na Mão, 03/03/2014 at http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/03/a-faca-e-o-queijo-na-mao.html ) that the future of Crimea depended almost exclusively on Russia’s will and, specifically, on President Vladimir Putin.

What were the decisive factors in the Crimea crisis outcome?


1- The powers that be, in this case, Russia.

2- Ukraine’s overall weakness and disunity.

3- The power that had the most at stake. Again, it was Russia. Check Battleground of Eastern Europe, 06/02/2014 at http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/02/battleground-of-eastern-europe.html

4- The will of the vast majority of the people of Crimea.

5- The swift, determined and undeterred actions Russia took to reach this outcome.

6- The Western powers’ naiveté (or wishful thinking) hoping that if they would just yell and threat a lot, the Russians would leave the Black Sea Peninsula. It was so much so that even TODAY, there were American and European senior officials saying that Putin could still back-off in a face-saving way. Hilarious!

Given these factors, the outcome was predictable: the most powerful and committed actor takes the prize home.

The Crimea game is basically over. Let’s see what happens in Ukraine, the Battleground of Eastern Europe.




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04 março, 2014

A Crimeia e a Carga da Cavalaria Ligeira

A CRIMEIA E A CARGA DA CAVALARIA LIGEIRA

Basta um rápido olhar sobre o mapa para intuir o papel estratégico primordial que está reservado à Península da Crimeia na geopolítica do Mar Negro. São apenas 26.000 km2, mas uma posição dominante no centro norte deste mar quase fechado, uma espécie de mega porta-aviões fixo do Mar Negro, ou para sermos mais exactos, uma plataforma logística para sedear meios navais e aéreos e controlar as rotas do Mar Negro.


A Crimeia no centro do Mar Negro.
in STRATFOR em http://www.stratfor.com/

A Crimeia esteve (está?) na posse da Rússia desde 1783, quando foi conquistada pela Czarina Catarina a Grande, e teve sempre um papel especial para a Rússia: não só pela posição estratégica, mas também pela beleza natural e pelo clima cálido: foi retiro de férias para a corte dos Romanov e para a clique dirigente da União Soviética. O general que a conquistou, Grigory Potemkin, chamou-lhe “o paraíso da Rússia”.

Foi na Crimeia que se combateu a primeira grande guerra na Europa após Waterloo: na Guerra da Crimeia (1854-1856), Grã-Bretanha e França combateram e venceram a Rússia para travar o seu avanço para sudoeste, à custa do combalido e decadente Império Otomano. Quase um século depois, em 1945, em vez da guerra, desenhou-se a paz, de forma tortuosa, para pôr termo à pior das guerras: a II Guerra Mundial. Foi em Yalta, na Crimeia, que se reuniram Churchill, Staline e Roosevelt.

A Crimeia voltou à ribalta em 1954, quando o então Secretário-Geral do PCUS, Nikita Krushchev, teve a ideia peregrina de oferecer a Península à Ucrânia (pertencia à Rússia) como gesto de amizade e boa vontade. Gesto meramente simbólico dado que então Moscovo comandava a URSS com mão de ferro e a prenda ficava na família. Este acto, há exactamente 60 anos, está na origem dos problemas de 2014. Em 1991, com a implosão da URSS, a Rússia ficou sem a Crimeia que, além de tudo o que já foi referido, detinha o porto-sede da Esquadra Russa do Mar Negro: Sebastopol.




Rússia e Ucrânia chegaram a um entendimento que passou pelo leasing da base naval de Sebastopol à Rússia, cedência que foi recentemente prolongada até 2042. Não obstante, para muitos Russos, a Crimeia é russa e devia pertencer integralmente à Rússia. Acredito que Putin comungue dessa opinião.

A crise ucraniana proporcionou uma oportunidade única para a Rússia recuperar o seu paraíso. A grande questão é saber se Putin tem a coragem e o romantismo da cavalaria ligeira britânica da rainha Vitória a carregar de peito aberto sobre Balaclava.

Putin não é nenhum Lord Cardigan, mas é dele que hoje depende o futuro da Crimeia.


The Charge of the Light Brigade (1877), de Thomas Jones Barker.



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03 março, 2014

A Faca e o Queijo na Mão


A FACA E O QUEIJO NA MÃO


A Ucrânia está em estado de guerra. Não é uma guerra aberta, não há declarações de guerra, nem existem ferozes combates. Contudo, a guerra está omnipresente nos espíritos, nas atitudes, nas decisões e nas movimentações de tropas e equipamento bélico.

A Ucrânia é um país em alta tensão, sofrendo pressões fracturantes um pouco por todo o território.

Ironicamente, a primeira cidade em que um grupo lavrou uma declaração de independência unilateral foi Lvov, na Ucrânia Ocidental. Desde então, multiplicaram-se as regiões e cidades do Leste do país que emitiram declarações de autonomia e/ou de rejeição do novo poder de Kiev.

Notícias (rumores?) de rendições de tropas ucranianas e de unidades a declararem fidelidade a Moscovo, também abundam. E há a Crimeia, é claro, que parece já estar completamente fora do controlo de Kiev e à disposição da Rússia.

Ucrânia Ocidental e Ucrânia Oriental:
 uma possibilidade remota, ou uma visão do futuro?
in STRATFOR em http://www.stratfor.com/

Como era previsível, as celebrações e o triunfalismo com a consumação do golpe que derrubou Yanukovych, foram muito prematuras. Como já aqui escrevemos (“Battleground of Eastern Europe” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/02/battleground-of-eastern-europe.html ), o que que se dirime na Ucrânia vai muito para além de Yanukovych e tem duas vertentes fundamentais: uma geopolítica e com grandes implicações e interferências externas e uma outra, de ordem interna, relacionada com a integridade e a viabilidade da Ucrânia.


GEOPOLÍTICA

Como já referimos em Tempos Interessantes, a Ucrânia é demasiado importante estrategicamente para a Rússia para esta a deixar evoluir de forma que Moscovo entenda hostil, sem colocar séria resistência. A partir do momento em que a oposição apoiada pela Alemanha, Polónia e outros e alcandorada em grupos radicais logrou tomar o poder, era expectável que a Rússia reagisse.

A reacção russa foi fulminante e claramente já estava preparada:

* Apoio discreto a todas as manifestações de resistência e repúdio ao novo poder de Kiev.

* Pressão pública e notória sobre a Ucrânia através da realização de grandes exercícios militares de emergência na área do Distrito Militar Ocidental, entre o Mar Báltico e o Mar Negro.

* Operações militares cirúrgicas e discretas na Crimeia que efectivamente lhe conferiram o controlo sobre a Península.

Estas acções deixaram os novos senhores de Kiev à beira de um ataque de nervos porque não sabem quais são os próximos passos de Moscovo, nem até onde eles irão; por outro lado, sabem o que podem fazer para contrariar os Russos: muito pouco.

As chancelarias da Europa Ocidental e da América do Norte entraram em histeria, gritando ameaças ocas e fazendo apelos frenéticos. Os EUA e as principais potências europeias continuam a ter grande intolerância com intervenções e ingerências que não as suas e continuam a não perceber ou a aceitar que nem todo o mundo se rege pelas suas regras.

Penso que não é muito provável que haja uma guerra. A Rússia tentará atingir os seus objectivos sem ter de recorrer a um conflito armado, evitando as consequências negativas de uma guerra. Certo é que já controla a Crimeia sem disparar um tiro.


INTEGRIDADE E VIABILIDADE

Estas são as outras grandes questões que Kiev enfrenta: é possível manter a Ucrânia una, quando a Crimeia e Donestk vão fazer referendos sobre a sua relação com Kiev? E quando Lviv e o resto do Oeste ucraniano puxa para Varsóvia e Berlim, ao mesmo tempo que Kharkov e o Leste puxam para Moscovo? Como é possível retirar a Ucrânia do poço económico e financeiro em que se encontra? E como reagirão os europeístas de hoje quando descobrirem amanhã o preço da ajuda que a EU e o FMI prometem? Será que o país entra em colapso se a Rússia fechar a torneira do gás? E se fechar a torneira do financiamento? E se fechar a torneira do comércio?


Neste momento, a Rússia parece ter a faca e o queijo na mão:

1- Tem um poder militar a que Ucrânia não tem possibilidades de enfrentar.

2- Sabe que nem os EUA, nem a Alemanha, nem a Polónia, nem a NATO intervirão militarmente para salvar os seus amigos em Kiev.

3- Tem uma panóplia de instrumentos económicos para espremer a Ucrânia.

4- Tem enorme apoio na Crimeia, que já controla.

5- Tem substancial apoio no Leste e Sul do país, curiosamente a zona mais rica da Ucrânia.


O jogo ainda não acabou e reviravoltas podem acontecer, mas neste momento a questão que se põe é: o que vai a faca fazer ao queijo? Ou, de outra forma, até onde está a Rússia disposta a ir para obter o que quer que seja que quer da Ucrânia.


P.S. A 21 de Fevereiro, no post “Kiev a Ferro e Fogo”, escrevemos o seguinte:


Perante uma realidade em fluxo permanente e uma torrente de informações, desinformações e rumores difíceis de filtrar e destrinçar, é particularmente difícil prognosticar o curso futuro da Ucrânia. Mesmo assim, do meu ponto de vista, as tendências que se desenham são:

            * A desagregação do poder estabelecido a curto prazo.

            * O protagonismo das forças radicais, a maioria das quais violenta.

* Fracturas, até agora incipientes, dentro do próprio país entre regiões com projectos e preferências diferentes.

* Um incremento da influência de países como a Alemanha e a Polónia no país.

* O aumento das probabilidades de retaliações por parte da Rússia.

Todas estas tendências incorporam riscos enormes para o futuro da Ucrânia. Estão em jogo a sua coesão geográfica e política; está em risco o funcionamento do seu sistema político; e está em grave risco a situação económica e financeira ucraniana, que já era grave antes da crise.

  

POSTS RELACIONADOS:


“KIEV A FERRO E FOGO”, 21/02/2014 em
http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/02/kiev-ferro-e-fogo.html

“BATTLEGROUND OF EASTERN EUROPE”, 06/02/2014 em
http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/02/battleground-of-eastern-europe.html

“SEM FUTURO”, 31/01/2014 em
http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/01/sem-futuro.html

06 fevereiro, 2014

Battleground of Eastern Europe

BATTLEGROUND OF 
EASTERN EUROPE

Está na moda, neste século, proclamar-se que velhos conceitos da Geopolítica como Balance of Power (equilíbrio de poder) e áreas de influência estão obsoletos e que já não são aplicáveis nas Relações Internacionais do III Milénio. Uma pequena confidência: não é verdade. A Ucrânia é um exemplo vivo disso mesmo.

A Europa Oriental, entre a Alemanha e a Rússia.
in STRATFOR em http://www.stratfor.com/

A Ucrânia ocupa uma posição estratégica relevante na Europa Oriental. Ocupa a maioria da costa setentrional do Mar Negro, constitui a maior massa territorial a separar a Rússia da Europa Central, detém a população mais numerosa entre a Alemanha e a Rússia e detém significativos recursos naturais. Contudo, não é um país particularmente poderoso nem auto-suficiente. É política e militarmente vulnerável e economicamente frágil. Conjugando estes factores, a Ucrânia torna-se um fruto apetecido para países mais poderosos e ambiciosos. Numa palavra, a Ucrânia é o Battleground da Europa Oriental.

Olhando para o vasto espaço que medeia entre o Báltico e o Mar Negro, não é difícil descortinar as potências com os meios e a tradição de hegemonia na região: a Rússia e a Alemanha são os países que melhor podem disputar a influência sobre a Ucrânia.

A Ucrânia está dividida internamente em partidos diversos, alguns irreconciliáveis, mas está principalmente dividida entre uma parte ocidental historicamente e culturalmente próxima da Polónia e da Europa Central e uma parte oriental étnica, linguisticamente e historicamente próxima da Rússia.

Contudo, o conflito actual é potenciado e manipulado por Berlim e Moscovo que querem atrair e fixar Kiev nas respectivas áreas de influência.

Ambas, Alemanha e Rússia, usam um mix de persuasão e pressão para atrair a Ucrânia. A Alemanha manipula parte da oposição, a Rússia trabalha o governo. Aquela quer a Ucrânia atada à EU liderada por Berlim, enquanto esta quer ver a Ucrânia na União Aduaneira liderada por Moscovo.

Outros países têm interesses na evolução e posicionamento da Ucrânia, como a Polónia e a Lituânia, mas o seu poder e capacidade de influenciar e pressionar são limitados.

Assim sendo, o jogo do atrito, de avanços e recuos, vai-se fazendo entre Berlim e Moscovo. Embora no Ocidente se diabolize o papel da Rússia, a verdade é que a ingerência na Ucrânia é multilateral. A título de exemplo, a principal figura da oposição ucraniana, Vitali Klitschko, é uma espécie de avençado da Alemanha, onde viveu, e por quem é apoiado, doutrinado e financiado.

A principal diferença entre A Rússia e a Alemanha é a importância que a Ucrânia tem para cada uma. A Ucrânia é vital para a segurança e para o equilíbrio geoestratégico da Rússia. Sem a Ucrânia, a Rússia fica vulnerável a uma agressão externa e a sua área de influência perde substância. Também não podemos ignorar que Kiev é o berço da civilização russa e que muitos são os russófonos e os russófilos que aí vivem. Do ponto de vista estratégico, a Ucrânia é, porventura, o país mais importante para a Rússia e por isso não surpreende que Moscovo se esforce por manter Kiev na sua esfera de influência.

Para a Alemanha a Ucrânia também é importante (foi um dos seus principais alvos em 1941), mas não é vital. Na última década do século XX e na primeira do século XXI, a Alemanha já estendeu muito a sua influência para Leste, especialmente no Báltico e na Europa Central. Fê-lo, fundamentalmente, numa fase em que a Rússia atravessava uma crise profunda. Agora, quando a Alemanha (e em menor grau, a Polónia, a Suécia e a Lituânia) tenta penetrar de forma assertiva na Europa Oriental (Bielorússia, Ucrânia, Moldova) e no Cáucaso, depara-se com uma Rússia renascida, mais forte e com uma liderança determinada, o que acaba por degenerar nos actuais confrontos.

Neste Great Game da Europa Oriental, a Ucrânia é o Battleground privilegiado e Russos e Alemães vão movendo os seus peões, bispos e torres e jogando os seus trunfos. O que se decidia com tanques em 1941/44, decide-se hoje de forma mais subtil, mas encarniçada. Ao contrário do que sucedeu há 70 anos atrás, hoje o jogo pode não ter um desenlace claro, talvez aquele que mais favoreça o tabuleiro do jogo, a própria Ucrânia, que não pode cortar os fortes laços que a ligam à Rússia, mas que também não pode prescindir das ligações à Alemanha e à Europa Ocidental.

A última ironia desta crise é que aqueles que, dos dois lados da barricada, afirmam lutar pela liberdade e autonomia da Ucrânia, estão na verdade a pugnar por uma escolha entre duas áreas de influência tuteladas pela Rússia e pela Alemanha.



12 abril, 2008

NATO: Do Adriático ao Mar Negro

NATO: DO ADRIÁTICO 
AO MAR NEGRO


Fechada a cortina sobre mais um Conselho do Atlântico, desta vez realizado em Bucareste e com decisões (e omissões) de grande impacto, impõe-se uma breve análise sobre o alargamento, o não alargamento, o escudo anti-míssil e a ISAF no Afeganistão.

O alargamento à Croácia (esperado e tardio) e à Albânia veio consolidar o flanco sudeste da Aliança e reduzir o campo de instabilidade tradicional daquela região. Do ponto de vista estratégico, alarga a presença da Aliança Atlântica a praticamente toda a costa do Adriático e permite um mais completo controlo das rotas marítimas.

Mais atenção e impacto teve o não alargamento, especialmente à Ucrânia e Geórgia. Considerando que os Estados Bálticos constituem, por razões históricas, geográficas e políticas, uma excepção, este seria o primeiro alargamento ao território da antiga União Soviética.

Tendo em conta que, a Ucrânia era a segunda mais importante República da URSS, tem fortes laços históricos, culturais e até emocionais com a Rússia e que os dois países partilham uma extensa fronteira, abrir o caminho à adesão de Kiev à NATO seria uma humilhação política e um desaire estratégico para Moscovo. Por outro lado, a Geórgia é país da ex-URSS com o pior relacionamento com a Rússia.

O drive dos Estados Unidos para iniciar o caminho da adesão destes dois países foi precipitado e insensato, configurando uma provocação à Rússia e um factor de desnecessária polémica e divisão entre os Aliados.

Na verdade, o que é que a NATO teria a ganhar com a inclusão da Ucrânia e da Geórgia?
a) Irritar e indispor a Rússia (há áreas em que será mais importante fazê-lo);
b) Integrar dois países politicamente instáveis, sendo que na Ucrânia nem sequer há apoio popular maioritário à adesão;
c) Estender a presença da NATO ao Cáucaso, que é uma área de grande instabilidade, quando a capacidade de intervenção útil da NATO já está limitada pelos conflitos no Afeganistão (directamente) e Iraque (indirectamente);
d) Acolher um país (Geórgia) onde há bases e tropas russas e duas regiões que escapam ao controlo político e militar de Tblissi;
e) Portanto, pouco a ganhar e muito a perder.

A adopção do projecto de escudo anti-míssil dos EUA pela NATO foi a melhor e mais importante decisão saída de Bucareste. A NATO reconheceu a evidência de que os mísseis balísticos de médio e longo alcance constituem uma das maiores ameaças presentes e futuras à segurança do Ocidente. Trata-se do Irão, mas não só. A proliferação de mísseis balísticos é um fenómeno menos conhecido, mas muito mais disseminado do que a proliferação nuclear.

Dentro de 10 anos, serão certamente bastantes os países com capacidade para atingir a Europa com este tipo de vectores. Instalar um sistema que, a exemplo do guarda-chuva nuclear americano, proteja todos os membros da NATO será um precioso asset estratégico. Colocar a Rússia perante um facto consumado que já não se restringe aos EUA, Polónia e Rep. Checa, mas a 28 Estados, obrigará Moscovo a participar do sistema ou a ficar a falar sozinha.

Finalmente, o reforço da força da NATO no Afeganistão. Há muito que o comando da ISAF no Afeganistão clama por mais tropas, por menos restrições ao seu uso e por mais equipamento, nomeadamente helicópteros. Desta vez vão ter os reforços. Não os necessários, mas os suficientes para dar um sinal positivo aos Afegãos e aos países que têm dado o corpo ao manifesto. Estados Unidos, Reino Unido, França, Polónia e Roménia são os países que reforçam os respectivos contingentes. Especial destaque merece a inversão da postura francesa relativamente ao decisivo conflito afegão e, também, ao seu provável regresso à estrutura militar da Aliança Atlântica. Nota negativa para a contínua recusa da Alemanha em mudar de forma positiva o seu envolvimento no Afeganistão e, em menor escala, para Portugal, cujo principal contingente vai abandonar o Afeganistão no Verão (apenas parcialmente compensado com o envio de um C-130).

No cômputo geral foi um Conselho Atlântico com um saldo francamente positivo: as propostas mais importantes tiveram acolhimento e a mais negativa ficou para as calendas gregas. A NATO ancorou no Adriático e retraiu-se no Mar Negro; aderiu ao escudo anti-míssil e empunhou a espada com mais força no Afeganistão.