15 março, 2011

O Coronel Contra-Ataca

O CORONEL CONTRA-ATACA
Coronel Muammar Kadhafi, lider absoluto da Libia ha 42 anos, desde 1969.



Ao contrário de muitas expectativas, bem intencionadas mas ingénuas, o Coronel Muammar Kadhafi não só não caiu em 2 ou 3 semanas como Ben Ali na Tunísia, ou Hosni Mubarak no Egipto, como se encontra, ao fim de um mês de rebelião, deliberadamente no contra-ataque e com assinalável sucesso.


Tratando-se um personagem bem menos urbano e bem mais desprezível que os seus supra-mencionados congéneres, perguntar-se-á o porquê desta capacidade de resistência. Propomos 4 factores:

 
1- O regime de Kadhafi é muito mais opressivo e brutal do que os do Egipto e da Tunísia. Como tal, não surpreende a resposta violenta de cariz militar que foi desencadeada por Tripoli e que foi evitada pelo Cairo e por Tunis.



2- O carácter pessoal da ditadura líbia contrastando com os regimes egípcio e tunisino. Enquanto nestes, Mubarak e Bem Ali eram o topo de uma pirâmide instalada no poder, detendo poder e influência, exercendo esses poder e influência, beneficiando desse mesmo poder e, consequentemente defendendo-o com o chefe e para além dele, o que significa que o establishment não hesitou muito em despachar o líder quando ele deixou de ser um trunfo e passou a ser um ónus ou risco (liability), com o objectivo de salvar a sua própria posição dominante ou de privilégio. Na Líbia, porém, o poder é unipessoal, estando concentrado nas mãos de Kadhafi desde 1969 (!!!). O Coronel gere esse poder, beneficia este grupo, aquela tribo ou determinado indivíduo, mas mantém o poder nas suas mãos (directamente ou através dos filhos). Tal significa que o establishment líbio, se assim lhe podemos chamar, depende das benesses de Kadhafi, que acabarão com a eventual deposição deste. Daí, não tem o poder nem a vontade de derrubar o líder, porque seria arrastado com ele.



3- Debaixo da aparência de loucura e do seu carácter errático e extrvagante, Muammar Kadhafi é um líder calculista, que tem sabido avançar e recuar, que não mantém o poder absoluto há 42 anos por acaso e que sabe que não tem nada a perder em resistir e, provavelmente, nada ganha e tudo perde se se entregar. Para além disso, rodeou-se de uma guarda pretoriana constituída por mercenários estrangeiros que lhe devem total lealdade (enquanto houver dinheiro para lhes pagar) e que, ao contrário dos exércitos tunisino e egípcio, não têm quaisquer escrúpulos em disparar sobre civis líbios, com os quais não têm qualquer afinidade nacional ou étnica.



4- A oposição pensou que o regime de Kadhafi caíria como uma maçã podre como os dos seus vizinhos a leste e a oeste. Como se viu, tal não aconteceu, pelos motivos atrás aduzidos. Esse excesso de confiança levou os rebeldes a cometerem imprudências, na ânsia de tomar Tripoli, que lhes saíram caro em homens, material e ânimo. Finalmente, a oposição carece de alguma credibilidade: sendo liderada por um conselho nacional, mas tendo diferentes porta-vozes que veiculam pretensões diversas, nomeadamente quanto à bondade e tipologia de uma eventual intervenção estrangeira. O caso mais flagrante dessa duvidosa credibilidade é a figura de Abdel Jalil, líder do auto-proclamado governo provisório em Benghazi, que se demitiu no mês passado (!!!) de Ministro da Justiça de Kadhafi, cargo que exerceu entre 2007 e 2011. A este junta-se Abdel Younis, também ele ex-Ministro (do Interior) de Kadhafi. Estas conversões súbitas e oportunistas levantam-me sempre as maiores desconfianças.



A guerra civil na Libia. de 10 de março. Desde entao, as forças leais a Kadhafi ja reconquistaram, Zawiya, a oeste, Misrata e Ras Lanuf, na zona central da costa mediterranica da Libia. Brega, mais a leste, tem sido o mais recente palco de confrontos.
in "The Economist"
Não obstante o que foi referido, parece-me claro que o Coronel Muammar Kadhafi está a chegar ao fim da linha. O seu isolamento internacional chega a ser surpreendente (ao contrário do que sucedeu com Mubarak e Ben Ali) e as sanções económicas somadas ao êxodo de estrangeiros (especialmente os quadros técnicos que trabalhavam na indústria do petróleo) que trabalhavam na Líbia, não auguram um grande futuro a Kadhafi.



A grande dúvida que permanece é saber durante quanto mais tempo Kadhafi resistirá. Tendo em conta que neste momento usufrui de superioridade no campo de batalha e que não tem nada a perder, arriscaria dizer que ainda vai durar algum tempo e que resistirá até ao limite, quiçá, até ao (seu) fim.



Post Scriptum: O ex-Ministro do Interior Ahmed Younis (1000 soldados), o General desertor, Suleiman Mahmoud (3000 soldados em Tobruk) e o MajorA hmed Qetrani (2000 tropas), comandam os 6000 militares (de um total de 50.000) que desertaram o regime de Kadhafi mantém-se hesitantes/relutantes em envolver as suas tropas nos combates aolado dos rebeldes. Não será difícil perceber porquê…

5 comentários:

Defreitas disse...

As potências ocidentais,( com a excepção da França, que depois de ter oferecido a Kadafi o carpete vermelho do Eliseu, virou de bordo, e ainda bem, ) preparam-se a cometer um crime contra a moral e a ética internacional, ao esperar por uma decisão do Conselho de Segurança da ONU para deter os mercenários de Kadafi às portas de Bengazi. Um milhão de pessoas à mercê do ditador assassino.

Como se a acção no Kosovo tivesse recebido o acordo do CS da ONU, ou as duvidosas intervenções na África o tivessem sido também.

Aparentemente, o tema da democracia e da liberdade dos povos interessa-lhes pouco, em comparação à sede de petróleo e de negócios que Kadafi pode oferecer. E os Europeus não deixam, de certeza, de considerar, que Kadafi era um dique contra a imigração e uma barreira contra Al Qaïda. Quanto à China e à Rússia é, respectivamente, o grande fornecedor e cliente que lhes interessa!

Unanimes para gelar a fortuna do ditador no ocidente, condenar o massacre contra o seu povo, considerà-lo como não representativo do povo libio, condenado por todos incluindo a Liga Árabe, eis que Kadafi se apresenta finalmente sob uma luz mais aceitável para estas potências. Ignóbil, quando se pensa que todos incitaram o povo libio à revolta, como ontem o fizeram com os Chiitas do Iraque, que abandonaram depois à vingança sangrenta de Sadham Hussein.

Não nos admiremos se um dia as massas árabes se recordarem do que se está a passar, frustadas duma vitoria que parecia estar ao alcance e estigmatizarem a nossa atitude : o petróleo primeiro, as liberdades do povo árabe depois. Se antes se dizia que o mundo não repousa na justiça mas no petróleo, hoje isso é mais verdade que nunca.


A “non fly zone » que parecia ser suficiente há alguns dias, talvez seja sem utilidade hoje. Mas sem duvida nenhuma , morrer por Bengazi será para o Ocidente uma vergonha imensa, que um dia se pagará.

Freitas Pereira

Anónimo disse...

It is too convenient to wash our hands of Gaddafi the “Mad man” and ignore the fact that this leader of 42 years is cunning and far from stupid. To be able to maintain such a strangle-hold for so long takes brains (as well as the advantage of a strong tribal connection). A mad man and a smart mad man at that! A dangerous combination indeed. I wonder how long it will take for the inevitable fall of this dictator? The Middle East is on rapidly shifting sands, I suspect the like of which has not been seen before and all played out on the world stage. As and when Gaddafi finally goes (in whatever way) I too will be deeply suspicious of the up and coming opposition who have for so long supported Gaddafi! Are there any alternatives on the scene?

Anónimo disse...

It is too convenient to wash our hands of Gaddafi the “Mad man” and ignore the fact that this leader of 42 years is cunning and far from stupid. To be able to maintain such a strangle-hold for so long takes brains (as well as the advantage of a strong tribal connection). A mad man and a smart mad man at that! A dangerous combination indeed. I wonder how long it will take for the inevitable fall of this dictator? The Middle East is on rapidly shifting sands, I suspect the like of which has not been seen before and all played out on the world stage. As and when Gaddafi finally goes (in whatever way) I too will be deeply suspicious of the up and coming opposition who have for so long supported Gaddafi! Are there any alternatives on the scene?

Elaine

Defreitas disse...

Gaddafi is probably clever and vicious, but he offered a gift to Sarkozy , and played too dangerously for his tribe. I don’t believe Gaddafi has the total support of all tribes.Anyway, he has left president Sarkozy standing alone. On Thursday, with his surprising announcement forcing the hands of his EU partners, Sarkozy became the first head of state to recognize the rebels of Libya National Council as the country’s legitimate government.
President Sarkozy also stroke a bellicose tone by proposing “targeted air strikes” in Libya as a way to end the violence. Now he acts in accordance! Sarkozy’s ability to act, usually for the worst but in this case for the better, can not be underestimated.
A unilateral decision from France to strike Gaddafi’s force was completely within reach of France’s military capability. Now he got some european leaders with him. And got the Security Council permission. If Sarkozy is not bluffing and just playing a posturing game, it could be a win-win situation for him politically both domestically and internationall
As the Arab revolution will eventually keep gaining ground across the Middle-East, France could regain its lost prestige and become a prime partner for a pan-Arabic federation in this brave new geopolitical landscape.
The Obama administration and Europe have been undecided and divided for three weeks over what to do about the situation in Libya It was time to act. I hope it’s not too late.
I agree with you about the futur result of this “war’. Particularly when we know thar some leaders in the West might be cynically hedging their bets and even hoping that Gaddafi will prevail in order to prevent the Arab movement to spread and blow the lid on the Kingdom of Saudi Arabia.

Freitas Pereira

Anónimo disse...

I wonder if Japan were a major oil exporting nation would the BBC see fit to provide more information about the many thousands of lives lost, millions without power, potential long-term problems with radiation, bodies that will never be recovered etc, etc, etc. But that wasn’t important to the BBC last night during almost 2 hours of news, with their increasing level of tabloid-style broadcasting. Also, no news on Bahrain, Syria, Saudi, Israel whilst the same footage of Libya was played and replayed to fill the time as if nothing else was happening in the world. Who’d have thought that in order to get information beyond the borders with Libya we would have had to switch over to Al Jazeera and Russia Today where the reports were curiously less biased either for or against the West. The once globally respected BBC can now pride itself on sensationally biased broadcasting. Democracy? Is not Gaddafi feeding his people what he wants them to hear. We call that propaganda but when it’s the powerful BBC we call it responsible broadcasting. The wealth of journalistic talent the BBC is fortunate enough to still have, deserves better.
Elaine