“ATTACK
OF THE KILLER TOMATOES”
E A RÚSSIA NA SÍRIA
Ainda adolescente, fui a um clube de vídeo requisitar um filme e
resolvi levar um ao qual tinha sido atribuída a distinção (???) do pior filme de sempre: “Attack
of the Killer Tomatoes”.
Há poucos dias, passei por uma experiência similar de autoflagelação quando li um artigo desastroso (“Disengagement from the Syrian Civil War Won’t Come Cheap
for Russia” em https://www.geopoliticalmonitor.com/disengagement-from-the-syrian-civil-war-wont-come-cheap-for-russia/
) num site canadiano dedicado à
Geopolítica (“Geopolitical Monitor”).
O
objectivo do artigo é minimizar/ridicularizar a intervenção da Rússia na Síria. O
principal argumento é que a intervenção é financeiramente insustentável para
Moscovo. Para tal, o autor baseia-se nos custos das intervenções dos Estados
Unidos no Afeganistão (US$ 744 bn) e no Iraque (US$ 821 bn). Tal vem
acompanhado de gráficos que sustentam a argumentação. Infelizmente, também
ajuda a destruí-la. Senão, vejamos:
1- Os
EUA estiveram envolvidos em dois conflitos: A Rússia está apenas na Síria.
2- Os
EUA estão há 15 anos no Afeganistão: Os EUA estiveram 8 anos no Iraque e já
para lá voltaram. A Rússia está há 18
meses na Síria.
3- Os EUA tiveram mais de
100.000 tropas em CADA UM dos teatros no auge dos conflitos. A Rússia tem 4.000 soldados na Síria.
Como se tal não bastasse, o autor sublinha os custos que os EUA
suportaram “to establish a
functional democratic government”. Precisamente. A Rússia não
precisa de estabelecer um governo porque apoia o que já existe e governo
democrático não consta dos seus requisitos.
Contudo, o autor prefere inferir que, tendo por base os gastos dos EUA no primeiro ano das
Guerras do Afeganistão (US$ 23 bn) e do Iraque (US$ 51 bn) e comparando com o
custo dos primeiros 6 meses da Rússia na Síria (menos de US$ 0.5 bn), esta
terá de despender um montante exponencialmente superior. Não lhe passa pela
cabeça que a dimensão, tipologia, objectivo e estilo das intervenções são muito
diferentes e economicamente incomparáveis.
Imparável, continua dizendo que, ao contrário dos EUA no
Afeganistão e no Iraque, a Rússia está praticamente isolada na Síria,
“reduzida” ao apoio do Irão que, por sinal, tem sido o mais activo e eficaz
interveniente externo regional na Guerra da Síria. Ao Irão somam-se actores
estaduais e sub-estaduais provenientes do Líbano, Iraque, Afeganistão e do
antigo espaço soviético. Acrescenta que “Russia would also have to deal with tremendous
pushback from surrounding GCC countries, as well as Turkey and Israel see Assad
as a threat to their geopolitical interests in the region”. Ora, a influência dos Estados do Golfo no
teatro de guerra actual é muito limitada, a Turquia não quer, nem pode
hostilizar a Rússia novamente e não há nenhuma indicação de que Israel apoie
activamente a queda do regime de Al Assad. Aliás, Israel tem
tido muito empenho em coordenar acções militares e políticas com a Rússia, num
reconhecimento da relevância que esta tem actualmente na Síria, facto bem
demonstrados pelas 4 visitas que o Primeiro-Ministro Netanyahu fez a Moscovo
nos últimos tempos.
De absurdo em absurdo, refere que a Arábia Saudita trabalhará
para conter o preço do petróleo a um nível não superior a US$ 50 Dólares por
barril, quando os Sauditas têm trabalhado arduamente, também em articulação com
a Rússia, para reduzir o output e fazer subir o preço do crude.
No
derradeiro parágrafo, vem o ataque final deste Killer Tomato do século XXI: “Regional powers involved in Syria do
not take Russia’s interference seriously”. Por
isso é que as últimas negociações sobre a Guerra da Síria decorreram em Astana,
Cazaquistão, sob os auspícios da Rússia e coma participação da Turquia e do
Irão.
“Attack
of the Killer Tomatoes” e “Disengagement from the Syrian Civil War Won’t Come Cheap
for Russia” têm em comum serem muito maus e, por isso, tornam-se
simultaneamente ridículos, risíveis e lamentáveis.