POSTAS
DE PESCADA
Mandar postas de
pescada, para não recorrer a outros verbos também utilizados, não é a mais elegante das expressões, mas
por vezes coaduna-se com certas declarações. Surpreendentemente, ou talvez
não, os sujeitos que têm metaforicamente arremessado os filetes do dito peixe,
têm uma posição e status sócio-económico que faria supor intervenções mais
temperadas.
As verdadeiras postas de pescada. Mas também há muitas das
outras.
Vejamos então:
"Faz-me impressão que
15 pessoas tenham o poder de condicionar a vida de milhões de pessoas.”
Fernando Ulrich, Presidente
do BPI
in RTP 1 em
http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=690011&tm=9&layout=122&visual=61
Fui
alertado para esta declaração pela Sandra Catarina que colocou o link no
FaceBook. Nesse post (não confundir com a posta) ela também esclarecia o lançador
de postas que o Conselho de Ministro era composto por 15 pessoas que afectam a
vida de milhões de Portugueses, que não a dele. O Tribunal Constitucional, que
era quem a destemperada criatura tinha em mente, tem 13 (treze juízes).
Obrigado Sandra Catarina.
Ulrich é ignorante
ou pensa que somos todos parvos. Não são os juízes do Tribunal Constitucional
que condicionam a vida de milhões de pessoas. É a Constituição da República
Portuguesa que traça um enquadramento legal dentro do qual os Portugueses,
incluindo os membros dos órgãos de soberania podem actuar. Eu imagino que
tal seja uma maçada para quem tem tiques autoritários e se julga acima da lei,
mas é assim que o Estado de direito que (ainda) vamos tendo funciona. Por muito
que lhe custe. Como diria o próprio,
aguenta a Constituição. Aguenta.
“Portugal irá
conseguir acesso aos mercados. Mas, para isso, é decisivo que não se passem
algumas decisões, como houve, do Tribunal Constitucional. Acho que foram
decisões complicadas que, no fundo, não têm em consideração o contexto. Os
direitos devem ser olhados em função da capacidade da economia se financiar.”
António Mexia,
Presidente da EDP
in “Público”
em
http://www.publico.pt/politica/noticia/antonio-mexia-acredita-que-tribunal-constitucional-pode-forcar-segundo-resgate-1606588
Esta posta foi arremessada por um desgraçado que auferiu 3.1
MILHÕES de euros em 2012. À luz dos seus
rendimentos percebe-se melhor a sua teoria sobre a relatividade dos direitos.
Percebe-se, mas não se aceita. Porém, se a realidade financeira do país levar a
que o Estado a cobrar em sede de IRS os rendimentos superiores a meio milhão de
euros anuais com uma taxa, digamos, de 90%, talvez Mexia compreendesse melhor o
alcance da relatividade e em vez de pescada (ou salmão fumado) passasse a
consumir carapau.
Se isto viesse a acontecer e Mexia passasse a mexilhão, então gostava de ouvir de novo a sua opinião
sobre os direitos e o TC.
“Acho que tem de
haver ao nível dos órgãos de soberania do país, incluindo o Tribunal
Constitucional, algum pré-acordo, algum trabalho de casa, para saber como é que
se reduz a despesa do Estado que é essencial.”
António Vítor
Monteiro, Presidente do BCP
in RTP 1 em
http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=690011&tm=9&layout=122&visual=61
Os banqueiros estão imparáveis. Este também lança o
peixe na direcção do Tribunal Constitucional. Mas não é que o homem não faz ideia do que é a separação de poderes,
pedra angular de um regime democrático e quer que o TC participe na formulação
de um acordo sobre política orçamental? Santa ignorância.
Monteiro e Ulrich até parecem combinados: um atira-se
ao TC e o outro adopta uma abordagem mais suave tentando envolver o Tribunal na
governação. E ambos no afã de prosseguirem a sua agenda muito clara, proferem
disparates convencidos da sua genialidade.
“O Bloco de Esquerda
está a fazer um aproveitamento político de uma questão [os cortes nas pensões
de sobrevivência] que é técnica e de difícil compreensão para a generalidade
dos Portugueses.”
Hélder Rosalino,
Secretário de Estado da Administração Pública
in “Jornal i”
em
http://www.ionline.pt/artigos/portugal/helder-rosalino-oferece-se-dar-explicacoes-deputada-fazendo-desenho
Este governante, para além de perguntar à deputada
Mariana Aiveca se queria que lhe fizesse um desenho para ela perceber a
temática, revelando a sua natureza grosseira, lançou a posta que os Portugueses
são tão estúpidos que não percebem o que se vai passar com as pensões. É a arrogância de quem está convencido que
não deve explicações a ninguém. Nem ao Parlamento, nem aos Portugueses.
É claro que os Portugueses percebem muito bem o que vai
acontecer: vão ser roubados de mais uma percentagem significativa dos seus
legítimos rendimentos. É claro também que quem não percebe é o Senhor Rosalino.
Não percebe quem é, a quem deve prestar contas
e a quem deve servir. Na realidade é um enfatuado lançador de postas que existe
para subtrair dinheiro a pessoas honestas. Aliás, é o mesmo sujeito que teve
o desplante de afirmar que:
“O aumento do horário de
trabalho de 35 para 40 horas semanais atenua os efeitos da redução do número de
funcionários públicos e torna os serviços mais eficientes. Vimos vantagem nesta
evolução das 35 para as 40 horas.”
Hélder Rosalino,
Secretário de Estado da Administração Pública
in “Jornal de Notícias” em
http://www.jn.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=3256823
Eis que Rosalino assume a liderança com dois lançamentos de
postas de pescada em 4 meses. É um verdadeiro tratante. Despede funcionários públicos e depois aumenta o horário dos
que ficam para colmatar a redução de efectivos. Na linha de Álvaro Pereira,
este deve ter aprendido com os industrialistas do século XIX. Talvez um horário
de 48 horas semanais a partir pedra lhe fizesse bem. A bem da eficiência, é
claro.
Sim, eu sei que os leitores se lembrarão de muitos outros
exemplos, porventura com o odor a peixe podre ainda mais acentuado, mas estes
são dos mais recentes e são ilustrativos.
São ilustrativos de uma classe dirigente nos negócios, na banca
e na política que se caracterize por uma arrogância sem limites, por um desprezo completo pelas pessoas que labutam e sofrem
para sobreviver e prover às suas famílias, que ignoram ou fingem ignorar o
mundo real que é o nosso país devastado pela miséria de muitas centenas de milhares
de pessoas e se pronunciam sobre assuntos de grande gravidade com a indulgência
dos iluminados.
Infelizmente não são iluminados. São privilegiados que defendem
os seus privilégios e não sabem do que falam.
Em tempo de crise profunda, de muita dor e sofrimento, esoerar-se-ia que aqueles
que têm uma situação extremamente privilegiada pudessem ajudar. Mas não são
obrigados a isso. Porém, deviam ser
obrigados a manter um certo recato, a ter decoro, descrição e respeito. Pelos
outros; pelos concidadãos; pelas pessoas sérias.
Não têm. Não têm recato, nem decoro, nem dignidade. Preferem as postas
de pescada. Têm dinheiro, status e poder, mas cheiram a peixe podre. Peixe
podre é repugnante. Não presta. Eles também não.
9 comentários:
Apoiado.
O pivete que se desprende das citações que fazes recorda-me o colorido da aldeia gaulesa, em que por causa de peixe menos fresco alguém acaba sempre por levar nas trombas... talvez seja isso que lhes falta: levar no trombil, forte e feio, para ver se perdem aquele ar enfatuado que lhes não dá o polimento - que definitivamente lhes não lhes - mas os milhões vilmente roubados. Arrotam postas de pescada mas cheiram horrivelmente a sargeta.
Nauseabundo. Ácido. Certeiro! (…pena a pescada não ter culpa, mas quem a deixa apodrecer…).
Abraço,
Ana Paula
O problema é que é mesmo uma peixeirada! A deles!!
obrigada pelo link
beijinhos!
Cláudia
Obrigado Penso!
Sérgio,
É mesmo isso que falta. Com peixe podre de preferência.
Ah, as peixeiradas da aldeia gaulesa tinham piada; estas postas de pescada causam repugnância.
Exactamente Ana Paula! Obrigado.
Pois é Cláudia, mas quem sofre as consequências somos nós.
Bjs
Calhou passar por aqui... partilho os meus blogs.
Mto obrigada e parabéns pelo seu. Gostei!
www.meditacaoparaasaude.blogspot.com
www.leiturasparaavida.blogspot.com
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