28 dezembro, 2012

MAN OF THE YEAR 2012



(WO)MAN OF THE YEAR 2012:
 
ANGELA MERKEL 

ANGELA MERKEL

TEMPOS INTERESSANTES’ (WO)MAN OF THE YEAR 2012


Haverá muitos leitores surpreendidos com a escolha de Angela Merkel como (Wo)Man of the Year 2012 para o “Tempos Interessantes”, dado que ela foi alvo de duras críticas e de vários posts* negativos neste blog ao longo do ano.


Porém, esta selecção não se pauta necessariamente pela simpatia granjeada pelo nomeado, mas sim pelo seu destaque e pelo seu mérito no ano que finda. Assim sendo, mantenho que Angela Merkel tem um papel malfazejo sobre países como Portugal, Grécia, Irlanda, ou Espanha.


Não obstante, entendo que Angela Merkel promoveu e defendeu os interesses da Alemanha no teatro europeu, consolidando de forma significativa o seu poder e liderança no continente. Sendo ela Chanceler Federal da Alemanha e eleita para defender os interesses alemães, considero que foi bem sucedida.


Actualmente a Alemanha domina a maior parte da Europa a seu bel-prazer e as principais razões têm a ver com a vulnerabilidade económica e fragilidade política da Europa Meridional e também de parte da Europa Central; com a crise financeira que se arrasta há 4 anos; e com a política desenvolvida por Angela Merkel.


O mais recente relatório de actividades da Alemanha é deveras impressionante:


·         Conseguiu impor o pacto fiscal.

·         Conseguiu restringir o campo de acção do futuro regulador bancário europeu, deixando de fora a maioria dos bancos germânicos.

·         Travou todos os esforços para mutualizar a dívida dos Estados Europeus.

·         Conseguiu colocar no poder em Roma e em Atenas chefes de governo do seu agrado, contornando o normal processo democrático.

·         Conseguiu colocar de cócoras, de chapéu na mão e ainda por cima atentos, veneradores e obrigados, os governos de Lisboa, Madrid e Atenas.

·         Conseguiu impor a sua receita fiscal e económica a grande parte da Europa.

·         Conseguiu impor haircuts aos privados com créditos sobre a Grécia, sem mexer nos créditos soberanos da Alemanha.

·         Conseguiu prescindir do Eixo Franco-Alemão em termos minimamente paritários, reduzindo Paris a pouco mais do que um ajudante de campo de Berlim.

·         Conseguiu que a Alemanha atravessasse a crise financeira mantendo o crescimento económico e a forte vertente exportadora, assim reforçando o papel de líder económico incontestado da Europa.

·         Conseguiu, em suma, afirmar a Alemanha como líder incontestada da Europa Continental, não só no plano económico, como no plano político.


67 anos volvidos da derrota esmagadora na II Guerra Mundial e correspondente destruição, seguidos de 45 anos de divisão forçada e perda substancial de soberania e apenas 22 anos após a Reunificação, a Alemanha afirma-se novamente como potência imperial na Europa.


Não se trata obviamente de uma reedição literal do III Reich, mas é um facto que a Alemanha domina o processo de decisão económico-financeiro e também o político na Europa. Há países que se tornaram dependentes e subservientes da Alemanha, cujos governantes se deslocam a Berlim em busca da bênção, do apoio, ou da orientação. Outros há, que esperam a tomada de posição da Alemanha para tomarem a sua, que é quase sempre a mesma. As tradicionais potências europeias, como a França e a Itália, foram decapitadas de autonomia e vontade própria, não conseguindo arregimentar a coragem e a determinação para enfrentar o gigante germânico.


Confesso que chego a pensar se a Guerra da Líbia em 2011 não terá sido, também, uma tentativa desesperada de Paris para demonstrar as fraquezas e vulnerabilidades da Alemanha. Se foi, conseguiu e…falhou. Conseguiu provar o que já se sabia: as limitações militares da Alemanha contemporânea comparadas com as capacidades da França e do Reino Unidos. Falhou, porque a Guerra na Líbia não era vital, nem sequer importante, para o Ocidente e, como tal, tudo ficou igual na Europa quando os combates cessaram. Não existiu na Europa a percepção tangível da importância próxima do poder militar, pelo que o poder de Berlim continuou a ser mais relevante do que o de Paris ou de Londres.


Após a tarefa ousada e hercúlea da Reunificação lançada por Helmut Kohl, podemos ver na recriação da Alemanha como a Mittel Europa (a Europa do Meio) a conclusão lógica do processo de reconstrução da potência continental historicamente dominante na Europa.

 

Angela Merkel: Kaiserin da Alemanha, líder da Europa.

in “The Economist”

Curiosamente, a renovada preponderância geopolítica da Alemanha é euro-cêntrica, isto é, não tem ainda uma dimensão global; resume-se à Europa. Há duas razões para tal: por lado, penso que a Alemanha não tem de momento esse tipo de ambição, preferindo consolidar a sua hegemonia na Europa; por outro lado, faltam-lhe argumentos para se impor numa escala mais alargada.


Haverá quem se regozije por o Reich 4.0 ser eminentemente pacífico, porém, o cariz imperial e dominador está presente. O esmagamento das soberanias e da autonomia de cada um também. O recentramento da Europa em Berlim já acontece. A ausência de Panzer, SS e campos de concentração não equivale a um sentimento de regozijo. Não é preciso estar no epicentro do inferno para se estar insatisfeito. Este é o grande risco que corre este Reich soft. O ressentimento e a ocasional revolta existem. Se a crise se prolongar, vão aumentar os protestos e os castigos eleitorais contra os comissários políticos e a demonização da Alemanha.


Como já aqui escrevi, a crescente associação da Alemanha ao III Reich é uma ameaça para Berlim porque pode levar outros estados europeus a rejeitarem a Alemanha. E a Alemanha precisa dos outros como mercados e ainda não tem os Panzer (hoje os Leopard) para esmagar as revoltas. A convicção alemã de que o seu poder actual é totalmente benigno é falsa, porque as pessoas sentem opressão, mesmo sem serem fisicamente agredidas.


Por agora, contudo, o tempo é de sucesso e de abrir garrafas de champagne no Reichtag. O domínio da Europa pela Alemanha vai crescendo e se acentuando. A resistência britânica e mais uns pequenos focos, não põem em causa o controle sobre o continente.


Foi um grande ano para Angela Merkel e os Alemães concordam, conferindo-lhe uns impressionantes 68% de popularidade. A estratégia de afirmação da Alemanha, tirando partido das forças próprias e das fraquezas alheias num contexto de grande crise económica foi executada com sucesso quase total. Aí temos o IV Reich e a Kaiserina Merkel: Woman of the Year 2012!!!

 

* Posts anteriores com referências relevantes a Angela Merkel:


“SIE SIND NICHT WILLKOMMEN KAISERIN” em



“ANGIE” em



“DISLATE OU PROVOCAÇÃO” em



“HERR KOMMISSAR” em



“O LUGAR-TENENTE” em



“DEUTSCHLAND UBER ALLES” em



“PROJECTO EUROPEU (?)” em



“ATENTO, VENERADOR E OBRIGADO” em



“O EIXO” em



“DIKTAT” em

10 comentários:

claudia disse...

Do p de v imediato da Alemanha, ela faz de facto bom trabalho. Do p de v europeu, há mts duvidas em aberto... a germanizaçao da Europa parece me um fraco projecto porque a Europa nao é a Alemanha! Por "exemplar" que a Alemanha possa ser! Agora que a senhora tem encontrado poucos (ou nenhuns) homens pela frente.... lá isso é! :)9

PVM disse...

Estás muito apocalíptico...
Vou só lembrar um importante acontecimento que é um grão na engrenagem do teu argumentário: o BCE vai assumir um papel importante na recompra de dívida pública dos países aflitos (uma espécie de mutualização indireta da dívida pública). Contra a vontade da "Sra." Merkel (ou do governo alemão, não sei bem se são sinónimo um do outro...)

Sérgio Lira disse...

yehaaaa, Rui, she's the man!...

Estella disse...

Alguém tem a certeza que Hitler não deixou descendência?
Com ou sem ela, deve dar voltas de regozijo na tumba! É que não sendo judeus, vamos todos no "Comboio da Morte". Lento, mas vamos...

Rui Miguel Ribeiro disse...

Cláudia!
É verdade que tem estado enm à frente da Alemanha, defendendo os interesses alemães. Quanto ao projecto europeu, para mim, estaria no tempo de fazer um "pause" em vez de andar desconchavadamente sempre para a frente. Quanto à ausência de "homens" pela frente, será porventura a maior verdade.

Rui Miguel Ribeiro disse...

Paulo,
Não quis dar nenhum cunho apocalíptico ao post. Esse facto poderá ser um grão de areia, mas não muda a general picture.
Também é verdade que o Sr. Draghi tem andado a fazer umas "batotices", mas isso, lá como cá, já vem sendo habitual.

Rui Miguel Ribeiro disse...

Sérgio,
Suspeitei que alguém iria dizer algo do género, mas tu dosseste-o de forma impagável e demolidora!!!

Rui Miguel Ribeiro disse...

Estella,
Espero bem que não. Quanto ao comboio, é verdade. É menos sinistro do que o outro, mas não deixa de ser mau.

Anónimo disse...

Tenho vindo a descobrir que as minhas capacidades mentais são mais frutíferas de madrugada. Se não fosse pelo trabalho, fazia "directas". É estranho, mas gosto muito mais de estudar quando todos dormem. Ando com os "sonos trocados"!
Quanto ao momento político, há algumas analogias curiosas. Pelo menos, "it seems to me":
o livro de Christian Bernadac "Comboio da Morte" relata a viagem pacífica dos judeus que calma e confiadamente neles entravam pensando ser uma solução temporária, pensada e decidida por alguém que sabia ser o melhor para eles (também temos confiado em quem tem decidido por nós, mesmo que a solução não nos agrade e embarcamos todos no "comboio"); chegados aos campos de concentração, liam "arbeit macht frei" (nós seguimos e teoria Keynesiana segundo a qual o desemprego é voluntário. Ofereça-se para trabalhar de borla e verá se não tem emprego! logo, se está desempregado, culpa sua!); a sra. kaiser destronou Adam Smith e a sua "mão invisível", já que corajosamente mostra a mão e a m... que nos tem feito para engrandecer o império!
Ora diga-me lá se não há uns "laivosinhos" análogos...

EStella

Rui Miguel Ribeiro disse...

EStella,

Descobriram que há várias maneiras de apanhar moscas... :-(