GUERRA E ELEITORALISMO
Depois de muita especulação (como é habitual), Barack Obama deu a conhecer o como e o quando do fim do surge – o aumento de 33.000 tropas dos EUA no Afeganistão que decidiu fazer em Dezembro de 2009.
Como se sabe, já nessa altura Obama anunciou que em Julho de 2011 começaria a retirar os reforços que então começava a enviar. Tal era uma péssima ideia como tive ocasião de referir na altura em “It’s 3 A.M. and the Red Phone Rings” ( http://tempos-interessantes.blogspot.com/2009_12_01_archive.html ) :
Francamente negativo foi o anúncio de um deadline de 18 meses para iniciar a retirada. Supostamente, para pressionar o governo afegão a arrepiar caminho e para dar tempo ao novel exército afegão para assumir o grosso da luta contra os Taliban. Na realidade, o factor principal foi a vontade que Obama tem de fugir a sete pés do Afeganistão e a necessidade de dar um rebuçado à ala pacifista maioritária no Partido Democrata, à qual pertence. Falta a Obama o fighting spirit e a consciência geopolítica de que o poder e a disponibilidade para o usar ainda são factores incontornáveis nas Relações Internacionais.
Dentro de 18 meses, o exército afegão ainda não terá a dimensão e a capacidade para arcar autonomamente com o esforço de guerra. Pior do que isso, é que os Taliban e a Al-Qaeda também vêem e lêem as notícias e sabem que lhes basta resistir durante 18 meses e esperar que o inimigo comece a fazer as malas. Então sim, o espírito de Saigão poderá voltar para assombrar a Casa Branca, poderá não haver margem para gastar mais uns meses a deliberar e a escolha poderá ser apenas entre a derrota total e o reforço maciço de tropas. Por outras palavras, um beco sem saída. É evidente que os 18 meses não são inocentes: para além de placar o Partido Democrata, em Julho de 2011 estar-se-á a 16 meses das eleições presidenciais norte-americanas e Obama quer retirar as tropas do Afeganistão a tempo de o Afeganistão sair da mente e da memória do eleitorado, ou seja, a prioridade é vencer em 2012; a guerra está em segundo plano.
Dito e feito. 10.000 soldados retiram até ao final deste ano e os restantes 23.000 deixam o Afeganistão até Setembro de 2012. De pouco serviu que as chefias militares solicitassem que o grosso dos 33.000 ficassem até ao final de 2012, permitindo que estivessem mais dois ciclos de guerra (Primavera-Outono) no terreno, consolidando os progressos obtidos até agora.
Aliás, já há meses que conselheiros civis do Presidente (leia-se assessores de campanha) que era impensável que estas tropas permanecessem no teatro de guerra até ao final de 2012. Como já era previsível há 18 meses atrás, o importante era ter as tropas nos Estados Unidos antes das eleições. Já se sabe, também, que para Obama a prioridade é “Me first!”. Longe vão os tempos em que o Afeganistão era a guerra que valia a pena combater e ganhar. Essa era a altura de angariar votos. A guerra é a mesma, a necessidade de angariar votos também, só mudou a estratégia eleitoral para os obter.
A morte de Osama Bin Laden tem sido apontada off the record como uma das motivações para acelerar a retirada do Afeganistão. É o conto do vigário. A eliminação de Bin Laden foi muito importante pelo carácter simbólico de que se revestiu:
… a morte de Bin Laden é uma grande vitória pelo valor simbólico que tem. No Ocidente, o alívio e alegria pelo desaparecimento do rosto da maligna organização, que na mente de muitos se confundia com a própria organização. Para os islamitas radicais é o oposto: desaparece o líder, a referência, o fundador, a figura reverencial e consensual. (in “A Morte da Besta” at
http://tempos-interessantes.blogspot.com/2011/05/morte-da-besta.html
No entanto, a sua relevância operacional era muito reduzida. Ou seja, a sua liquidação não altera no curto prazo a realidade no teatro de guerra afegão. Fazer o link entre a morte de Osama e a conclusão da Guerra no Afeganistão é demagogia grosseira.
Enquanto a condução de uma guerra for fluindo ao sabor dos interesses eleitorais conjunturais de um Presidente, é óbvio que os superiores interesses políticos e geoestratégicos dos Estados Unidos são relegados para segundo plano, seja no Afeganistão, no Médio Oriente ou na Europa. Com este Presidente, assim será.
Post Scriptum: A postura de Obama nas questões do Médio Oriente tem sido diferente, mas disso trataremos noutro post.