O PROFESSOR
Quando era finalista
de Relações Internacionais na Universidade do Minho e era chegada a altura de
ter as fitas assinadas, dirigi-me à Rua D. João I, em Guimarães, para estrear a
fita destinada aos professores. Fui a casa da Professora Maria Luísa, que fora
a minha professora ao longo de toda a escola primária. Fi-lo, não por ter sido
a minha primeira professora, mas porque sentia (e sinto) que era aquela a quem
mais devia. Fi-lo por gratidão, admiração e respeito.
Estes sentimentos
são extensíveis a muitos outros professores que foram vitais na minha formação
escolar/académica e no meu crescimento como pessoa. Mais importantes do que
eles, só a minha família. Recordo os melhores com gratidão e afecto.
Infelizmente,
actualmente, os professores deixaram de inspirar a gratidão, admiração e respeito que eu nutria pela Professora Maria
Luísa. Pelo contrário, os professores são hoje uma classe frequentemente
desrespeitada, achincalhada, maltratada, acossada. Na minha opinião, esse é a
maior maleita que afecta o sistema educativo em Portugal.
in Diário de Notícias
em http://www.dn.pt/
Em primeiro lugar,
os sucessivos governos e o próprio Ministério da Educação, têm desvalorizado os
professores: retiram-lhes
autoridade, desvalorizam o seu papel e importância, reduzem-lhes os salários,
sobrecarregam-nos com actividades não docentes e chegam a humilhá-los. Nesta
actividade de degradação do magistério, Maria de Lurdes Rodrigues e Nuno Crato
excederam-se.
É inacreditável que
os responsáveis pela educação não percebam (ou não se importem) que a
diminuição do estatuto, da autoridade e do prestígio do professor, está a minar
um elemento nuclear no sistema educativo e está a abrir-se o caminho para que o
desrespeito alastre a outros, como os alunos, os pais dos alunos e o público em
geral.
Em segundo lugar,
vem a desresponsabilização dos alunos. Hoje em dia é quase preciso um decreto para um aluno reprovar.
Reprovar duas vezes consecutivas, ou até duas vezes no mesmo ciclo de estudos é
uma impossibilidade. Mas há mais. Se o aluno tem uma negativa, a
responsabilidade é do professor; se os resultados pioram, a culpa é do professor,
se o aluno não estuda, não estuda, não quer aprender, o ónus é ainda e sempre
do professor.
No plano
disciplinar, a catástrofe é completa. Só os comportamentos de maior gravidade
têm consequências disciplinares, invariavelmente demasiado brandas. A falta de
educação, os comportamentos impróprios, a grosseria, são meras anomalias que
têm de ser aceites. É evidente que a erosão da autoridade do professor e a sua
crescente vulnerabilidade, somada à consciência que os alunos têm que a
reprovação é altamente improvável e completada com a grande tolerância perante
a indisciplina, faz com que os cretinos, os ignorantes, os mandriões e os
malcriados possam medrar impunes pelas escolas, para prejuízo de todos.
Em terceiro lugar,
também os pais dos alunos estão contagiados por este clima anti-professor. Daí a tornarem-se
mais frequentes os insultos, as ameaças e até as agressões, foi um pequeno
passo. Há pais que desautorizam os professores à frente dos filhos e outros que
se deixam os filhos desautorizá-los à frente dos professores; outros ainda
tentam aproveitar expedientes administrativos para extorquir melhores notas para os seus rebentos.
O que muitos
paizinhos (sim, aqui o diminutivo é depreciativo) se esquecem é de educar as
suas crianças em casa. A educação, os modos, o trato e o respeito deviam ser
ensinados e aplicados em casa pela família e o facto de não o serem é a causa
de muitas, se não mesmo da maioria das situações problemáticas nas escolas.
Quando esses paizinhos que só refilam
mas não fazem a sua parte meterem a mão na consciência e educarem os seus
filhos, o desempenho escolar destes será melhor e a escola também será melhor.
Finalmente, também o
público é influenciado por governantes e alguns opinion-makers de má-fé que se
dedicam a denegrir os professores, que
ganham muito, que fazem pouco, que têm férias longas e horários curtos e que
não querem trabalhar. Eis uma falácia miserável. A minha Mãe era professora
do secundário; a minha mulher é professora do 2º ciclo; eu fui professor
universitário muitos anos; os horários podem ser simpáticos (às vezes são
horríveis) e as férias são mais longas, mas gostava de saber quantas profissões
exigem TANTO trabalho fora do expediente, normalmente em casa. Como tudo tem
vantagens e desvantagens. Posso ir buscar os filhos à escola e ir passear com
eles. Mas PAGO com uma noitada até às 4.00h para fazer o meu trabalho.
Não consigo
compreender e ainda menos aceitar ministros da educação que se encarniçam
contra professores, ou ministros da saúde que atacam os médicos, ou ministros
da defesa que espezinham generais e almirantes. Uma coisa é atacar privilégios
inaceitáveis e coarctar abusos. Outra bem diferente é ofender a dignidade
profissional das pessoas, apoucar o seu trabalho, esforço e mérito, denegrir a
sua importância e valor.
Isso é baixo,
mesquinho e só pode resultar de mentes pequenas e de gente medíocre.
O professor enquanto
formador das novas gerações tem um papel de superior importância no futuro de
Portugal. A tentativa de menorizar e menosprezar o professor é um erro grave de
quem não tem lucidez, nem visão estratégica.
Infelizmente, a
degradação do professor leva à degradação da escola, que por sua vez acelera a
degradação do país. E a mediocridade vai triunfando…..