05 abril, 2014

O Circo Chegou, o Circo Partiu


O CIRCO CHEGOU,
O CIRCO PARTIU


BBC Breaking News!!!!

in BBC News at http://www.bbc.com/news/

 Os ciclos noticiosos internacionais são normalmente muito intensos e relativamente curtos. Fazendo um exercício empírico e simplificativo, podemos dizer que se processam assim:


1- Detecção do evento/crise, por vezes quando ele já decorre há algum tempo.


2- Notícias exploratórias, que vão suscitando o interesse a curiosidade do público.


3- Escalada. Corresponde à escalada da própria crise/conflito e ao despacho de “enviados especiais”. É o sinal claro que os media concluíram que a “coisa” é grave e que o seu impacto (e audiência) justifica a despesa. O circo chega à cidade.


4- Efeito multiplicador. Conforme os casos, a invasão dos media ocidentais pode motivar os actores locais a intensificarem as suas acções, cientes do impacto global que passaram a deter. É também a fase em que as potências estrangeiras aumentam a sua pressão e ingerência para obterem um desenlace da crise que lhes seja favorável.


5- Clímax. É a altura em que a crise atinge o apogeu, o drama está no máximo.


6- Conclusão. Do clímax deverá resultar uma conclusão. Os media fecham a história, fazem as malas e partem para o próximo hotspot, ou para casa. O circo parte da cidade.


7- Follow-up. A “conclusão” muitas vezes não encerra o conflito e este continua em versão low-profile, longe dos holofotes mediáticos. Pouca interessa. Não aparece na TV, logo, para a generalidade das pessoas acabou. Não existe.


8- Retorno. Há sempre a possibilidade de haver alguma evolução dramática do conflito que, aliada à eventual ausência de alternativas mais apetecíveis, podem fazer regressar o circo mediático à cidade. Imagino que muitos cidadãos descubram então, com perplexidade, que aquilo que julgavam resolvido e encerrado, afinal prosseguia ininterruptamente há meses, ou mesmo anos.


Vem tudo isto a propósito dos acontecimentos na Europa Oriental, mais concretamente na Ucrânia e na Crimeia, que ocuparam os noticiários desde o final de Novembro, com uma interrupção de algumas semanas na quadra natalícia, até ao fim do Inverno e que tiveram, entre outros, o condão de eliminarem a Síria do ciclo noticioso.


Surgem agora algumas notícias avulsas referindo o 3º aniversário do conflito sírio, o número de mortes, a multidão de refugiados, os desentendimentos entre os rebeldes. No luck. A “coisa” dura há muito tempo, o conflito não parece sair do sítio, apesar dos esforços dos media, não parece haver bons da fita. Um conflito distante, que se arrasta sem fim à vista e em que são quase todos feios, porcos e maus é, como direi,….boooring.


A realidade é que, embora os media marquem os ciclos noticiosos que não podem, regra geral, ser muito longos, a attention span do público é muito curta. As pessoas querem acção, drama e, se possível, um happy end. Mas acima de tudo, querem um end! Se não houver conclusão, as pessoas desligam.


Por isso, já pouca gente presta atenção ao ping-pong entre Moscovo e Washington no qual Kiev e a Crimeia são as bolas.


Por isso, ninguém liga à Síria.


Por isso, as pessoas já desistiram do MH370.


E por isso, já quase toda a gente há anos que muda de canal quando se fala do processo de paz Israelo-Palestiniano.


Em suma, a Guerra dos Cem Anos, no século XXI, seria um desastre mediático.



P.S. Não obstante, para a semana publicarei um post sobre a Síria. Se entretanto não rebentar uma guerra noutro sítio qualquer, é claro.




7 comentários:

Penso disse...

Well said.

Estella disse...

Esta análise é o que eu chamo de "Gramática da Comunicação Política".
Só podia ser de um Professor!

Luis disse...

Prof. Rui sempre brilhante no comentário e na analise!!!

Anónimo disse...

Muito bom! Na mouche, Rui Miguel. Este mundo é mesmo cão rafeiro ( com respeito por esses animais...)

Abraço,

Ana Paula

Rui Miguel Ribeiro disse...

Thank you Penso!

Rui Miguel Ribeiro disse...

Thank you too Estella!

Rui Miguel Ribeiro disse...

Obrigado Ana Paula!

Que leitores gentis :-)