O
CIRCO CHEGOU,
O
CIRCO PARTIU
in BBC News at http://www.bbc.com/news/
Os ciclos noticiosos internacionais são normalmente
muito intensos e relativamente curtos. Fazendo um exercício empírico e
simplificativo, podemos dizer que se processam assim:
1- Detecção do
evento/crise, por vezes quando ele já decorre há algum tempo.
2- Notícias exploratórias, que vão suscitando o
interesse a curiosidade do público.
3- Escalada.
Corresponde à escalada da própria crise/conflito e ao despacho de “enviados
especiais”. É o sinal claro que os media concluíram que a “coisa” é grave e que
o seu impacto (e audiência) justifica a despesa. O circo chega à cidade.
4- Efeito
multiplicador. Conforme os casos, a invasão
dos media ocidentais pode motivar os actores locais a intensificarem as suas
acções, cientes do impacto global que passaram a deter. É também a fase em que
as potências estrangeiras aumentam a sua pressão e ingerência para obterem um
desenlace da crise que lhes seja favorável.
5- Clímax. É a
altura em que a crise atinge o apogeu, o drama está no máximo.
6- Conclusão.
Do clímax deverá resultar uma conclusão. Os media fecham a história, fazem as
malas e partem para o próximo hotspot, ou para casa. O circo parte da cidade.
7- Follow-up. A
“conclusão” muitas vezes não encerra o conflito e este continua em versão
low-profile, longe dos holofotes mediáticos. Pouca interessa. Não aparece na
TV, logo, para a generalidade das pessoas acabou. Não existe.
8- Retorno. Há
sempre a possibilidade de haver alguma evolução dramática do conflito que,
aliada à eventual ausência de alternativas mais apetecíveis, podem fazer
regressar o circo mediático à cidade. Imagino que muitos cidadãos descubram então,
com perplexidade, que aquilo que julgavam resolvido e encerrado, afinal
prosseguia ininterruptamente há meses, ou mesmo anos.
Vem tudo isto a propósito dos acontecimentos na Europa
Oriental, mais concretamente na Ucrânia e na Crimeia, que ocuparam os
noticiários desde o final de Novembro, com uma interrupção de algumas semanas
na quadra natalícia, até ao fim do Inverno e que tiveram, entre outros, o
condão de eliminarem a Síria do ciclo noticioso.
Surgem agora algumas notícias avulsas referindo o 3º
aniversário do conflito sírio, o número de mortes, a multidão de refugiados, os
desentendimentos entre os rebeldes. No luck. A “coisa” dura há muito tempo, o
conflito não parece sair do sítio, apesar dos esforços dos media, não parece
haver bons da fita. Um conflito
distante, que se arrasta sem fim à vista e em que são quase todos feios, porcos
e maus é, como direi,….boooring.
A realidade é que, embora os media marquem os ciclos
noticiosos que não podem, regra geral, ser muito longos, a attention span do público é
muito curta. As pessoas querem acção, drama e, se possível, um happy end. Mas
acima de tudo, querem um end! Se
não houver conclusão, as pessoas desligam.
Por isso, já pouca gente presta atenção ao ping-pong
entre Moscovo e Washington no qual Kiev e a Crimeia são as bolas.
Por isso, ninguém liga à Síria.
Por isso, as pessoas já desistiram do MH370.
E por isso, já quase toda a gente há anos que muda de
canal quando se fala do processo de paz Israelo-Palestiniano.
Em suma, a Guerra dos Cem Anos, no século XXI, seria um
desastre mediático.
P.S. Não obstante, para a semana publicarei um post sobre a
Síria. Se entretanto não rebentar uma guerra noutro sítio qualquer, é claro.
7 comentários:
Well said.
Esta análise é o que eu chamo de "Gramática da Comunicação Política".
Só podia ser de um Professor!
Prof. Rui sempre brilhante no comentário e na analise!!!
Muito bom! Na mouche, Rui Miguel. Este mundo é mesmo cão rafeiro ( com respeito por esses animais...)
Abraço,
Ana Paula
Thank you Penso!
Thank you too Estella!
Obrigado Ana Paula!
Que leitores gentis :-)
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