30 outubro, 2015

Rússia na Síria



RÚSSIA NA SÍRIA


Pela primeira vez desde a implosão da URSS em 1991, a Rússia está a executar uma campanha aérea no estrangeiro, concretamente na Síria.


Um Sukhoi SU-24M procede a um bombardeamento no Norte da Síria.
in STRATFOR em www.stratfor.com

Exactamente dois anos após o cheque da Rússia a uma iminente intervenção militar americana na Síria (ver “Cheque Russo” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2013/09/cheque-russo.html ), Vladimir Putin põe novamente em cheque os planos de Washington para a Síria.

A deslocação de um significativo contingente militar russo para a Síria, o envolvimento da Força Aérea da Rússia no conflito e a participação de conselheiros militares ao lado do Exército Sírio constituem, potencialmente, um game changer na Guerra da Síria.

A intervenção russa apanhou de surpresa a maioria dos intervenientes, nomeadamente os EUA e a Turquia.

Quais são os objectivos da Rússia?

1- A Rússia pretende ter um papel proeminente na Guerra da Síria e na respectiva resolução. Para tal, Moscovo vem desenvolvendo intensa actividade diplomática há mais de um ano. A presença militar no terreno, torna a participação russa importante e incontornável.

2- A Rússia quer manter influência na Síria pós-Guerra ou, no caso de o país se desintegrar, manter a presença na região costeira, nomeadamente em Tartus e em Latakia, onde estão presentes a Marinha e a Força Aérea da Rússia, respectivamente.

3- Um objectivo que é um meio: apoiar o Governo sírio, permitindo-lhe atingir um grau de consolidação territorial que aumente o poder negocial de Damasco e, consequentemente, de Moscovo e de Teerão. Esse apoio militar visa não só tornar o território sob controlo de Al Assad mais defensável e sustentável, como permitir uma base mais viável para a criação de um estado alawita num cenário pós-Síria.

4- A Rússia também visa atacar e enfraquecer grupos considerados terroristas que não apenas o Estado Islâmico. E, na realidade, tal definição abarca grupos que são directa ou indirectamente, apoiados pelos EUA, pela Turquia, pela Arábia Saudita e pelo Qatar.


Efeitos práticos:

Ainda é cedo para tirar conclusões, mas é certo que a Rússia e o Irão concertaram esforços para apoiar ofensivas do Exército Sírio que visam reverter perdas recentes e atingir os objectivos descritos no ponto 3 supra. Para tal, também foram mobilizados efectivos Libaneses (Hezbollah) e Iraquianos (várias milícias como o Kataib Hezbollah).

Certo é, também, que os Estados Unidos se viram confrontados com uma situação inesperada que lhes tolhe os movimentos militares e, especialmente, políticos. Os Norte-Americanos vêem os Russos fazer aquilo que só eles estão habituados a fazer: intervir militarmente num país distante sob a égide de ninguém. Com um twist perverso – os Russos estão na Síria a pedido do Governo da Síria; os Norte-Americanos estão lá porque o decidiram ao arrepio da vontade do Governo Sírio. Sim, goste-se ou deteste-se, o Governo de Bashar Al Assad ainda é o governo reconhecido da República Árabe da Síria, como Putin fez questão de sublinhar nas Nações Unidas.


Nestes mapas pode-se constatar a grande diferença do ritmo de sortidas e ataques aéreos das Forças Aéreas da Rússia e dos Estados Unidos no início de Outubro.
in STRATFOR em www.stratfor.com

Finalmente, é certo que a Turquia foi o país que mais ficou a perder com estes desenvolvimentos: vê o regime que abomina reforçado e resguardado de uma derrota militar; vê o seu projecto de estabelecer uma safe zone e no-fly zone na Síria setentrional, sobre a qual exerceria controlo, praticamente inviabilizado; e vê a milícia curda síria YPD reforçada e apoiada por Moscovo e Washington. O sonho otomano de Erdogan está cada vez mais longínquo.

Com uma jogada político-militar rápida, surpreendente e eficaz, Putin baralhou ainda mais o tabuleiro da Guerra da Síria (e colateralmente a do Iraque) e acumulou alguns trunfos para o day after da Guerra.

Os resultados aferir-se-ão mais tarde, mas o primeiro movimento de Putin defendeu o rei (Assad) e lançou a desordem nos adversários.

Sem comentários: