06 fevereiro, 2014

Battleground of Eastern Europe

BATTLEGROUND OF 
EASTERN EUROPE

Está na moda, neste século, proclamar-se que velhos conceitos da Geopolítica como Balance of Power (equilíbrio de poder) e áreas de influência estão obsoletos e que já não são aplicáveis nas Relações Internacionais do III Milénio. Uma pequena confidência: não é verdade. A Ucrânia é um exemplo vivo disso mesmo.

A Europa Oriental, entre a Alemanha e a Rússia.
in STRATFOR em http://www.stratfor.com/

A Ucrânia ocupa uma posição estratégica relevante na Europa Oriental. Ocupa a maioria da costa setentrional do Mar Negro, constitui a maior massa territorial a separar a Rússia da Europa Central, detém a população mais numerosa entre a Alemanha e a Rússia e detém significativos recursos naturais. Contudo, não é um país particularmente poderoso nem auto-suficiente. É política e militarmente vulnerável e economicamente frágil. Conjugando estes factores, a Ucrânia torna-se um fruto apetecido para países mais poderosos e ambiciosos. Numa palavra, a Ucrânia é o Battleground da Europa Oriental.

Olhando para o vasto espaço que medeia entre o Báltico e o Mar Negro, não é difícil descortinar as potências com os meios e a tradição de hegemonia na região: a Rússia e a Alemanha são os países que melhor podem disputar a influência sobre a Ucrânia.

A Ucrânia está dividida internamente em partidos diversos, alguns irreconciliáveis, mas está principalmente dividida entre uma parte ocidental historicamente e culturalmente próxima da Polónia e da Europa Central e uma parte oriental étnica, linguisticamente e historicamente próxima da Rússia.

Contudo, o conflito actual é potenciado e manipulado por Berlim e Moscovo que querem atrair e fixar Kiev nas respectivas áreas de influência.

Ambas, Alemanha e Rússia, usam um mix de persuasão e pressão para atrair a Ucrânia. A Alemanha manipula parte da oposição, a Rússia trabalha o governo. Aquela quer a Ucrânia atada à EU liderada por Berlim, enquanto esta quer ver a Ucrânia na União Aduaneira liderada por Moscovo.

Outros países têm interesses na evolução e posicionamento da Ucrânia, como a Polónia e a Lituânia, mas o seu poder e capacidade de influenciar e pressionar são limitados.

Assim sendo, o jogo do atrito, de avanços e recuos, vai-se fazendo entre Berlim e Moscovo. Embora no Ocidente se diabolize o papel da Rússia, a verdade é que a ingerência na Ucrânia é multilateral. A título de exemplo, a principal figura da oposição ucraniana, Vitali Klitschko, é uma espécie de avençado da Alemanha, onde viveu, e por quem é apoiado, doutrinado e financiado.

A principal diferença entre A Rússia e a Alemanha é a importância que a Ucrânia tem para cada uma. A Ucrânia é vital para a segurança e para o equilíbrio geoestratégico da Rússia. Sem a Ucrânia, a Rússia fica vulnerável a uma agressão externa e a sua área de influência perde substância. Também não podemos ignorar que Kiev é o berço da civilização russa e que muitos são os russófonos e os russófilos que aí vivem. Do ponto de vista estratégico, a Ucrânia é, porventura, o país mais importante para a Rússia e por isso não surpreende que Moscovo se esforce por manter Kiev na sua esfera de influência.

Para a Alemanha a Ucrânia também é importante (foi um dos seus principais alvos em 1941), mas não é vital. Na última década do século XX e na primeira do século XXI, a Alemanha já estendeu muito a sua influência para Leste, especialmente no Báltico e na Europa Central. Fê-lo, fundamentalmente, numa fase em que a Rússia atravessava uma crise profunda. Agora, quando a Alemanha (e em menor grau, a Polónia, a Suécia e a Lituânia) tenta penetrar de forma assertiva na Europa Oriental (Bielorússia, Ucrânia, Moldova) e no Cáucaso, depara-se com uma Rússia renascida, mais forte e com uma liderança determinada, o que acaba por degenerar nos actuais confrontos.

Neste Great Game da Europa Oriental, a Ucrânia é o Battleground privilegiado e Russos e Alemães vão movendo os seus peões, bispos e torres e jogando os seus trunfos. O que se decidia com tanques em 1941/44, decide-se hoje de forma mais subtil, mas encarniçada. Ao contrário do que sucedeu há 70 anos atrás, hoje o jogo pode não ter um desenlace claro, talvez aquele que mais favoreça o tabuleiro do jogo, a própria Ucrânia, que não pode cortar os fortes laços que a ligam à Rússia, mas que também não pode prescindir das ligações à Alemanha e à Europa Ocidental.

A última ironia desta crise é que aqueles que, dos dois lados da barricada, afirmam lutar pela liberdade e autonomia da Ucrânia, estão na verdade a pugnar por uma escolha entre duas áreas de influência tuteladas pela Rússia e pela Alemanha.



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