NSA: O ESPIÃO GLUTÃO
Foi
amplamente noticiado que a Chanceler da Alemanha Angela Merkel telefonou ao
presidente dos Estados Unidos indagando se tinha o telefone sob escuta.
Imaginemos
o diálogo:
Merkel:
Queria saber se estou sob escuta.
Obama: Está sim, escuto-a perfeitamente.
O Tom Toles deve ter lido o meu blog e criou um cartoon para eu
colocar neste post: aqui temos mais um diálogo telefónico entre Angela Merkel e Barack
Obama.
in “The Washington Post, by Tom Toles at
Adiante.
As escutas da National Security Agency
(NSA) estão novamente na crista da onda. A sucessão de notícias, relatórios e
fugas de informação, transformaram a NSA numa espécie de hidrante espatifado:
jorra informações de forma quase incontrolada.
Nesta
altura parece evidente que a NSA recolhe
informações em demasia. A NSA é mesmo um espião glutão. São demasiadas porque
optou pelo método do arrastão (tudo o que vem à rede é peixe) e dessa forma incorreu em dois erros. O primeiro só a
ela diz respeito: tem muitíssima mais
informação do que aquilo que consegue digerir, tendo mesmo episódios em que
o sistema bloqueia, literalmente entupido com dados. O segundo diz respeito a muita
gente e são os dados indevidamente
recolhidos pela NSA o que é grave. É grave pela ilegalidade e pela infracção do
direito à privacidade e porventura outros direitos associados.
Convém
frisar, no entanto, que à luz da lei norte-americana estas actividades que têm sido
denunciadas só são ilegais quando os alvos são cidadãos dos Estados Unidos da América.
É evidente que isso oferece pouco conforto aos que não são, mas serve apenas
para dizer que só uma decisão política poderá impedir a sua continuidade ou a
redução do seu escopo e abrangência.
Sendo
certo que a NSA tem vindo a funcionar quase em roda livre será imperativo que
os mecanismos de controlo sejam mais actuantes e tenham mais poderes. O Foreign Intelligence
Surveillance Court (FISC) tem poder para travar actividades da
NSA, mas não tem poderes de investigação e controle, só podendo pronunciar-se
sobre o que a própria NSA apresenta e não tendo capacidade de verificar se as
suas sentenças são cumpridas. Por outro lado, o Congresso tem passado em larga
medida ao lado destas actividades, recebendo briefings de forma algo acrítica.
A julgar por declarações de congressistas de ambos os partidos, pelo menos a
componente de controlo parlamentar vai mudar.
Porém, quando falamos de espionagem de potências, estadistas,
organizações e cidadãos estrangeiros as coisas mudam de figura, pois como
referi, não são ilegais à luz da legislação norte-americana.
Devo, aliás, dizer que não deve haver nenhum país que considere ilegal
a espionagem de potências estrangeiras. Embora compreenda a irritação e até
alguma surpresa dos alvos, o choque e a indignação são eles mesmos
surpreendentes. Desde quando é que aliados não se espiam? A indignação seria
melhor dirigida para os serviços de contra-espionagem que, pelos vistos, foram
incapazes de detectar, contrariar e eliminar as actividades de espionagem.
Quem
lança a primeira pedra?
É sempre
embaraçoso ser-se apanhado a espiar. Admito que o embaraço aumenta quando o
espiado nos é mais próximo. É encarado como mais normal os EUA serem apanhados
a espiar o Presidente da China do que o da França. Espiar os amigos e
aliados é feio e semeia a discórdia
no nosso seio. Mas todos os que podem fazem-no. Jonathan Pollard, por
exemplo, foi sentenciado a prisão perpétua por espiar os EUA em favor de
Israel.
Quem nunca tiver
pecado, que lance a primeira pedra.
P.S. Nem de
propósito. Poucas horas depois de ter escrito este post, li que o General Keith
Alexander, Director da NSA, declarou na Câmara dos Representantes que milhões
de chamadas telefónicas interceptadas na Europa foram-no pelos serviços
secretos da França e da Espanha. Parece que a parábola bíblica da mulher
adúltera e dos pecadores tem mesmo total cabimento.