28 fevereiro, 2014

O Senhor Coluna

O SENHOR COLUNA


Apesar de hoje se comemorar o 110º aniversário do Sport Lisboa e Benfica, não é um motivo alegre o que motiva este post. Trata-se da partida de Mário Coluna.

Mário Coluna
in “Público” em www.publico.pt

Ao contrário do que sucedeu com Eusébio a quem ainda consegui ver jogar, nunca vi Mário Coluna jogar. “Conheci-o” pelo meu Pai que era um grande apreciador do Coluna. Não sendo ele Benfiquista (era Vitoriano, de Guimarães), era um admirador do grandioso Benfica da década de 60.

E dizia-me que o Eusébio era ímpar, o Germano era o baluarte da defesa, José Augusto e Simões as gazuas que abriam as defesas e Coluna, bem, Coluna era a trave mestra da equipa que girava à volta dele, quer no ataque, quer na manobra defensiva.

Essas histórias impressionavam-me e eu pensava como o nome Coluna era adequado a quem tinha função tão importante na equipa do Benfica e fui aprendendo a admirar o Coluna. Admiração que cresceu quando vi imagens de Coluna a marcar dois grandes golos em finais da Taça dos Campeões Europeus frente a Barcelona e Real Madrid e outras a capitanear a nossa fantástica selecção no Mundial de Inglaterra.

Mais tarde aprendi outras coisas. Aprendi que os jogadores mais novos o tratavam por Senhor Coluna, porque era mais velho e, mais importante, porque era mesmo um senhor, para além de ser um senhor jogador.

É triste perder duas referências basilares do Benfica e do desporto nacional. Duas coisas me confortam: se perdemos referências, é porque as tínhamos e nem toda a gente tem essa sorte; e, por outro lado, nunca as perdemos verdadeiramente, porque enquanto houver Benfica e futebol, Coluna nunca desaparecerá. E nesta altura estará lá em cima a dar uns toques na bola com o seu afilhado Eusébio.

Até sempre Senhor Coluna!




Cartaz de divulgação do jogo de homenagem a Coluna promovido pelo Benfica em 1970
in “MaisFutebol” em www.maisfutebol.iol.pt

26 fevereiro, 2014

A Estupidez do "Bom Aluno"

A ESTUPIDEZ DO “BOM ALUNO”

Desde que Cavaco Silva, então Primeiro-Ministro, cunhou a expressão “bom aluno europeu”, que eu a achei extremamente infeliz.

Nada tenho, obviamente, contra os bons alunos. Pelo contrário, na qualidade de professor (sim, considerar-me-ei sempre um professor) tenho a maior estima e respeito pelos bons alunos, especialmente pelos meus bons alunos.

Os meus bons alunos (vários muito bons mesmo) são pessoas inteligentes, empenhadas, vivazes, diligentes argutas, cultas, interessadas e interessantes. Os bons alunos são-no em resultado das suas qualidades e do bom uso que delas fazem. Entre elas, está a capacidade de discernir o que é certo do que é errado, terem sentido crítico e de tomarem decisões com base no seu juízo de qual é a melhor opção.

Infelizmente, o “bom aluno europeu” de Cavaco, agora recuperado por Passos Coelho, é a antítese do verdadeiro bom aluno. Não pensa pela sua cabeça, recebe e cumpre sem indagar, questionar ou reflectir as directrizes dos pseudo-professores que o manipulam a seu bel-prazer. Não tem curiosidade intelectual nem criatividade, não consegue discernir o correcto do incorrecto, o interesse próprio do de outrem, o bem do mal.

O objectivo do “bom aluno europeu” mão é aprender nem evoluir; o objectivo é agradar cegamente ao pseudo-professor, bajulando-o e humilhando-se. O “bom aluno europeu” de Cavaco e de Coelho é um ser amoral, estúpido e acéfalo, representativo de uma atitude de inferioridade, rebaixamento, indigna de um governante, de um aluno, de uma pessoa.

Comigo, este “bom aluno europeu” tinha um rotundo chumbo. Sem apelo nem agravo.


P.S. Diga-se que os pseudo-professores deste aluno não são muito melhores do que ele: arrogantes, intolerantes e genericamente incompetentes. Não teriam sorte nenhuma com os meus bons alunos.


23 fevereiro, 2014

Cascata Nuclear Asiática: Índia

CASCATA NUCLEAR ASIÁTICA:
ÍNDIA

Existem três potências nucleares na Ásia, Médio Oriente exclusive: China, Índia e Paquistão. A meio daquilo a que chamo a cascata nuclear asiática, está a Índia.

A Índia detonou o seu primeiro engenho nuclear em 1974, mas só em 1998 se tornou oficialmente uma potência nuclear. O arsenal nuclear indiano serve três propósitos:

1- A afirmação como potência nuclear é uma questão de status e prestígio e de afirmação como potência regional hegemónica ou predominante (um pouco como o Irão).

2- Em segundo lugar, serve para enfrentar o Paquistão: para o pressionar, para o dissuadir e para retaliar.

3- Menos publicitada é a 3ª função que é a de fazer frente à República Popular da China, prioritariamente com uma função dissuasora e secundariamente novamente como afirmação de poder no que considera ser a sua área de influência: Ásia e Índico, do Mar Arábico até ao Estreito de Malaca.

O Paquistão, inimigo histórico da Índia, era em termos operacionais o primeiro, quiçá o único, alvo do programa nuclear indiano. Embora superior no plano militar, a Índia viu vantagens em ter um instrumento dissuasor mais temível e, também, prevenir um eventual nuclear breakout paquistanês. Contudo, quando a Índia se tornou oficialmente nuclear em 1998 e Islamabad ripostou na mesma moeda, a situação da Índia degradou-se na medida em que as armas nucleares do Paquistão mitigaram a sua inferioridade convencional.

O confronto nuclear entre a Índia e o Paquistão está, de certa forma, resolvido. Os dois países têm uma aproximada paridade nuclear, em princípio ambos têm capacidade de responder a um first strike e ambos estão cientes de que as suas decisões militares no plano convencional estão condicionadas pelo arsenal nuclear do vizinho.

É então a terceira vertente que é, no presente e para o futuro, mais interessante e importante. Embora tal surpreenda muita gente, o principal investimento e desenvolvimento do programa nuclear da Índia nos últimos anos e nos próximos, tem em vista a China, como os leitores de Tempos Interessantes saberão (“Índia: China na Mira” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/04/india-china-na-mira-lancamentodo-agni-v.html .



A Índia sempre se considerou a potência hegemónica da Ásia do Sul. A partir do fim da Guerra Fria as ambições da Índia aumentaram e o vertiginoso crescimento económico deste século proporcionaram a New Delhi a oportunidade e os meios para se afirmar como a potência dominante de uma vasta região que se estende, em terra, da fronteira do Irão a Ocidente até à Indochina a Oriente e no mar por grande parte do Índico, usando as referências ainda actuais de Afonso de Albuquerque, de Ormuz a Malaca.

Estas ambições já vão muito além do Paquistão e esbarram nas da China que, sendo um Estado ribeirinho do Pacífico, depende do Índico para grande parte das suas rotas comerciais. Embora seja um facto pouco mencionado, tal como com o Paquistão, a Índia também partilha uma longa (cerca de 3500 km) e contenciosa fronteira com a China, onde os dois exércitos se postam frente a frente e que inclui o Tibete que é, em si próprio, um assunto sensível e contencioso.

A inferioridade nuclear (e não só) indiana relativamente à China é muito grande, de tal modo que, em caso de um conflito sino-indiano, a Índia correria o risco de ficar refém de um blackmail nuclear chinês. Ora essa é uma situação de vulnerabilidade que não conjuga bem com o estatuto de grande potência que New Delhi quer ostentar.

Daí que New Delhi tenha embarcado num programa que visa dar mais alcance, mais potência, mais punch, mais diversidade e menos vulnerabilidade ao seu arsenal nuclear, Tal passa por três vectores essenciais:

            * Desenvolvimento de mísseis capazes de atingir o heartland chinês.

* Desenvolvimento de tecnologia MIRV (multiple independently targetable reentry vehicle) que permite que um míssil transporte múltiplas ogivas nucleares que se separam e se dirigem para diferentes alvos, multiplicando o efeito destruidor de um único vector.

* Desenvolvimento de uma capacidade nuclear submarina que confira um maior grau de invulnerabilidade a um ataque surpresa, chinês ou qualquer outro.

INDIA
Prithvi-1
Operational
150 km
Liquid
Prithvi-2
Operational
250 km
Liquid
Prithvi-3
Development
350 km
Solid
Dhanush
Operational
400
Liquid
Sagarika/K-15 (SLBM)
Tested
750
Solid
Agni-1
Operational
700 km
Solid
Agni-2
Operational
2,000 km
Solid
Agni-3
Operational
3,000 km
Solid
Agni-4
Tested
3,500 km
Solid
Agni-5
Development
5,000 km
Solid
 in Arms Control Association em https://www.armscontrol.org/factsheets/missiles

 Todos estes vectores estão em movimento:

O Agni-5, com um alcance de 5000 km (Pequim dista 3200 km de New Delhi) poderá atingir Xangai e Pequim; já foi testado e deve estar operacional em 2015.

A tecnologia MIRV encontra-se em fase de desenvolvimento e o seu vector, o Agni-6, deve entrar em pleno desenvolvimento a partir do próximo ano quando terminar o ciclo de desenvolvimento do Agni-5. O Agni-6, que oficialmente não existe e cujas configurações são em boa parte classificadas, deverá ter um alcance de mais de 6000 km, o que o coloca na categoria de ICBM (Intercontinental Ballistic Missile), cobriria a totalidade do território chinês. Estima-se que transporte 4 a 6 ogivas nucleares.

Ainda mais adiantada está a componente submarina da tríade nuclear. A aquisição do submarino nuclear INS Chakra à Rússia e a construção do INS Arihant (que já faz testes de mar) estão a conferir à marinha de guerra indiana proficiência na utilização de submarinos nucleares. O próximo passo será artilhar o Arihant com mísseis nucleares. O K-15 com um alcance de 700 km e que poderá ser usado contra o Paquistão já completou os testes preliminares. Já o K-4, que tem um alcance de 3500 km, deverá ser the weapon of choice destes submarinos, ainda está em fase de testes.

Não é difícil perceber que o dossier Paquistão está por agora encerrado e que todo o programa nuclear indiano está direccionado para outras latitudes. Como ninguém investe biliões de Dólares para desenvolver mísseis com um alcance de 5000/6000 km para atingir alvos a 500/1000 km, é óbvio que o alvo da Índia é a República Popular da China.

Este gráfico permite perceber o redireccionamento do programa nuclear e de mísseis da Índia, com os testes de mísseis de maior alcance a suplantarem os de curto alcance.


In January, a report by the Ministry of Defence Integrated Headquarters expressed fears that the People’s Liberation Army Navy (PLAN) is building “expeditionary maritime capabilities” and could use nuclear-powered submarines and area denial weapons to threaten warships in the region.
in “The Tribune” (India) em http://www.tribuneindia.com/

As motivações são várias, mas eu destacaria a emergente competição geopolítica entre os dois gigantes demográficos. Essa rivalidade irá muito além da disputa pelas demarcações fronteiriças e abrange as rotas marítimas do Índico e as suas ligações ao Pacífico, ao Médio Oriente e ao Mediterrâneo, as áreas de influência em países estrategicamente relevantes, como a Birmânia, o acesso privilegiado a recursos minerais e energéticos.

Não é previsível que esta rivalidade resvale para um conflito militar a médio prazo, mas a fraqueza militar de um, poderá pôr em cheque as suas ambições. Nesse âmbito, o nuclear, tal como a capacidade de projecção de poder, assume um papel de relevo: não tanto para usar, mas para prevenir o seu uso por terceiros. Assim, a Índia não procura superioridade e nem sequer a paridade nuclear com a China, mas apenas uma capacidade retaliatória credível que sirva de dissuasão efectiva.

Os Agni, os submarinos nucleares e os MIRV darão exactamente isso à Índia, uma apólice contra a maioria dos riscos…


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“CASCATA NUCLEAR ASIÁTICA: PAQUISTÃO”, 17/02/2014 em

“ÍNDIA: CHINA NA MIRA”, 19/04/2012 em


21 fevereiro, 2014

Kiev a Ferro e Fogo

KIEV A FERRO E FOGO

Kiev está a ferro e fogo desde o dia 18 de Fevereiro. A luta pelo poder na Ucrânia agudiza-se, as posições extremaram-se, a violência ameaça generalizar-se.


Cenário dantesco no centro de Kiev.

1- Tal como já foi referido em Tempos Interessantes (“Sem Futuro” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2014/01/sem-futuro.html) , o Presidente Yanukovich foi fraco na avaliação, controle e resolução dos protestos. Falhou em toda a linha e agora está encostado à parede.

2- A oposição já há muito que não disfarça que está a efectuar um assalto ao poder. Goste-se ou não do poder instituído, ele decorre de eleições, mas para a oposição ucraniana vale tudo para capturar o poder com urgência.

3- Alguém acredita que meses de manifestações, ocupações e violência se devem à não assinatura de um acordo comercial?

4- Há países e governantes que já estão a fazer o papel de virgens ofendidas novamente, com destaque para a Polónia e o seu Primeiro-Ministro, como se fosse viável para qualquer país a situação que se tem vivido em Kiev.

Deixo algumas perguntas para reflexão:

Que país toleraria a ocupação de uma praça importante no centro da capital durante meses?
Que país toleraria a ocupação, saque e destruição de edifícios públicos?
Que país toleraria ataques à polícia com bombas incendiárias e outras armas do combate urbano?
Que país toleraria que a oposição e manifestantes sitiassem as sedes do poder instituído?
Que país toleraria rendições de forças policiais e saques de depósitos de armas?
Que país toleraria tudo o que tem passado na Ucrânia desde Novembro sem recorrer à força policial?

Talvez….a Líbia? A Ucrânia???


A Ucrânia em crise.
in STRATFOR em http://www.stratfor.com/

Posto isto, neste momento o poder parece estar perto da dissolução. As sucessivas aberturas à oposição têm sido rejeitadas. As tentativas de solução do problema via repressão das manifestações têm sido inconsequentes e como tal falham e encorajam ainda mais os manifestantes. O Presidente vacila perante as pressões externas e aceita como mediadores 3 potências estrangeiras que lhe são hostis: Alemanha, Polónia e França.

Perante uma realidade em fluxo permanente e uma torrente de informações, desinformações e rumores difíceis de filtrar e destrinçar, é particularmente difícil prognosticar o curso futuro da Ucrânia. Mesmo assim, do meu ponto de vista, as tendências que se desenham são:

            * A desagregação do poder estabelecido a curto prazo.

            * O protagonismo das forças radicais, a maioria das quais violenta.

* Fracturas, até agora incipientes, dentro do próprio país entre regiões com projectos e preferências diferentes.

* Um incremento da influência de países como a Alemanha e a Polónia no país.

* O aumento das probabilidades de retaliações por parte da Rússia.

Todas estas tendências incorporam riscos enormes para o futuro da Ucrânia. Estão em jogo a sua coesão geográfica e política; está em risco o funcionamento do seu sistema político; e está em grave risco a situação económica e financeira ucraniana, que já era grave antes da crise.

Yanukovich está no estado do boxeur que cambaleia no ring atordoado na iminência do KO. O que acontecerá quando tombar de vez e não sobreviver à contagem, é a grande questão que a Ucrânia enfrenta. Entretanto, Kiev continua a ferro e fogo.


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“BATTLEGROUND OF EASTERN EUROPE”, 06/02/2014 em

“SEM FUTURO”, 31/01/2014 em


17 fevereiro, 2014

Cascata Nuclear Asiática: Paquistão

CASCATA NUCLEAR ASIÁTICA:
PAQUISTÃO

Existem três potências nucleares na Ásia, Médio Oriente exclusive: China, Índia e Paquistão. Na base daquilo a que chamo a cascata nuclear asiática, está o Paquistão.

O Paquistão é o mais pequeno (800.000 km2), tem a menor população (193 milhões) e é o mais pobre. Em três palavras, é o elo mais fraco. Por isso dizemos que está no fundo da cascata.

Assumido como potência nuclear em 1998, quando realizou 5 testes nucleares em resposta a 3 testes levados a cabo pelo Índia, o Paquistão tem como referência, motivação e raison d’être do seu programa nuclear, a Índia.

Olhando para a história, para a Geografia e até para a Política e a Religião, não é difícil perceber a fixação indiana do Paquistão:

* Combateu 3 dolorosas guerras (1948, 1965 e 1971) e múltiplas escaramuças, dentre as quais destaco a de Kargil em 1999.

            * Tem dimensões e potencial inferiores.

            * Une-os (e separa-os) 2900 km de fromteira.

            * Separa-os, desde a génese, a religião – Islamismo v Hinduísmo.

* Separa-os, também, a economia – PIB de 223 biliões de US$ versus 1.8 triliões de US$ da Índia.


Dada a décalage de poder e o histórico das relações, o Paquistão sofre do complexo e dos receios característicos de muitos Estados vizinhos de outros mais poderosos e, frequentemente, com um padrão comportamental imperial ou hegemónico.

Assim sendo, o arsenal nuclear é visto por Islamabad (e por Rawalpindi - sede do poder militar) como uma apólice de seguro de vida contra o risco indiano. Significativamente, tendo umas forças armadas numerosas e razoavelmente bem equipadas, é nos meios assimétricos que o Paquistão assenta as suas estratégias de defesa e ataque em relação à Índia:

* Num plano sub-convencional, os grupos terroristas (como o Lashkar-e-Taiba - LeT) que contribuem para um conflito de baixa intensidade em Caxemira e desencadeiam ataques em território indiano, como o ataque ao parlamento de New Delhi em 2001 e os múltiplos ataques em Bombaim em 2008.

* Na extremidade oposta do espectro, está o nuclear que funciona como dissuasão a um ataque convencional indiano e como arma retaliatória caso esse ataque se materialize.

Naturalmente, o programa nuclear paquistanês foi criado e desenvolvido em função da Índia. A primeira preocupação foi a de construir um arsenal suficientemente vasto para maximizar as possibilidades de sobrevivência a um first strike indiano. Tal impeliu o Paquistão para um tremendo esforço de construção e emprego de mísseis e ogivas que lhe permitiram, de acordo com as estimativas mais informadas, ultrapassar New Delhi no número de armas nucleares. DE acordo com a Arms Control, Association, o Paquistão possui 90 a 110 ogivas nucleares e a Índia tem menos de 100.

A segunda preocupação de Islamabad é a de fazer face à superioridade convencional da Índia, especialmente desde que foi divulgada (e nunca oficialmente assumida) a estratégia indiana designada de Cold Start. Cold Start será a retaliação da Índia a incursões e ataques terroristas graves e consiste em incursões localizadas, rápidas e demolidoras em território paquistanês, executadas por forças mecanizadas, para punir o Paquistão por realizar aqueles ataques, ou por albergar, tolerar ou apoiar os grupos responsáveis por esses ataques em solo indiano.

E a forma que o Paquistão escolheu para travar um eventual assalto convencional indiano é recorrendo a armas nucleares de teatro (battlefield nuclear weapons), ou Short Range Nuclear Weapons (SRBM) de que é exemplo o Haft 9 (ou Nasr), um míssil ainda em desenvolvimento, modificado de um original da China, com um alcance de 60 km e que foi testado pela primeira vez em 2011. Ou seja, um ataque convencional indiano colherá uma devastadora, embora limitada, resposta nuclear.

O aspecto mais dramático deste cenário é a sequência: este recurso limitado a armas nucleares desencadeará necessariamente uma retaliação nuclear de New Delhi. Esta pode ser igualmente limitada no poder e no escopo, mas é provável que a resposta da Índia seja um ataque nuclear maciço. Este, por sua vez, despoletaria uma contra-retaliação de Islamabad com o arsenal restante. Numa região que alberga 1.5 biliões de pessoas, estaríamos a contemplar um inferno nuclear com muitos milhões de mortos. Uma estimativa publicada pelo International Herald Tribune em 2002, previa que as vítimas mortais de uma guerra nuclear indo-paquistanesa poderia ascender a 12 milhões.

Country
System[1]
Status
Range[2]
Propellant
Pakistan
Hatf-1
Operational
80-100 km
Solid
Hatf-2 (Abdali)
Tested/Development
190 km
Solid
Hatf-3 (Ghaznavi)
Operational
300 km
Solid
Shaheen-1 (Hatf-4)
Operational
750 km
Solid
Ghauri-1  (Hatf-5)
Operational
1,300 km
Liquid
Ghauri-2  (Hatf-5a)
Tested/Development
2,300 km
Liquid
Shaheen-2 (Hatf-6)
Tested/Development
2,500 km
Solid
Ghauri-3
Development
3,000 km
Liquid
in Arms Control Association em https://www.armscontrol.org/factsheets/missiles

A tipologia dos mísseis paquistaneses (ver quadro supra) encaixa, naturalmente, nos objectivos e estratégia do país: o alcance da maioria das categorias de mísseis operacionais são de curto alcance, principalmente concebidos para destruir alvos específicos, com grandes concentrações militares. Mesmo os de maior alcance, são o suficiente para cobrir o território indiano e não mais do que isso.

Por isso, posicionamos o Paquistão no fundo da cascata: um único inimigo, um só alvo, apenas uma razão para o arsenal nuclear, sendo que esse inimigo/alvo/razão está num plano de poder superior.

Os grandes riscos associados ao arsenal nuclear do Paquistão são dois. Um associado à segurança interna e que consideramos remoto, reporta-se ao poder da insurgência islamista radical, da qual se destaca o Tehrik-i-Taliban Pakista (TTP), que aflige o Paquistão. Teme-se que, num cenário de agravamento da violência e de erosão da ordem pública possa proporcionar a um destes grupos apossar-se de alguns engenhos nucleares.

O outro relaciona-se com a estratégia nuclear de Islamabad que, sendo compreensível face ao diferencial de poder militar com a Índia, pode fazer degenerar uma conflagração militar convencional, mesmo que restrita, num conflito nuclear de alcance e consequências imprevisíveis.

Estes factores, somados à perene conflitualidade entre os dois países, fazem com que a Ásia do Sul seja o palco nuclear mais instável e perigoso do planeta. O Paquistão é frequentemente apontado como O responsável por esta situação, mas é importante compreender a Geopolítica, a História, enfim, os constrangimentos internos e externos que enfrenta, bem como as acções de adversários e aliados. O xadrez nuclear asiático tem vários players, cada um deles com objectivos e interesses a prosseguir. O Paquistão é apenas um deles.