17 fevereiro, 2014

Cascata Nuclear Asiática: Paquistão

CASCATA NUCLEAR ASIÁTICA:
PAQUISTÃO

Existem três potências nucleares na Ásia, Médio Oriente exclusive: China, Índia e Paquistão. Na base daquilo a que chamo a cascata nuclear asiática, está o Paquistão.

O Paquistão é o mais pequeno (800.000 km2), tem a menor população (193 milhões) e é o mais pobre. Em três palavras, é o elo mais fraco. Por isso dizemos que está no fundo da cascata.

Assumido como potência nuclear em 1998, quando realizou 5 testes nucleares em resposta a 3 testes levados a cabo pelo Índia, o Paquistão tem como referência, motivação e raison d’être do seu programa nuclear, a Índia.

Olhando para a história, para a Geografia e até para a Política e a Religião, não é difícil perceber a fixação indiana do Paquistão:

* Combateu 3 dolorosas guerras (1948, 1965 e 1971) e múltiplas escaramuças, dentre as quais destaco a de Kargil em 1999.

            * Tem dimensões e potencial inferiores.

            * Une-os (e separa-os) 2900 km de fromteira.

            * Separa-os, desde a génese, a religião – Islamismo v Hinduísmo.

* Separa-os, também, a economia – PIB de 223 biliões de US$ versus 1.8 triliões de US$ da Índia.


Dada a décalage de poder e o histórico das relações, o Paquistão sofre do complexo e dos receios característicos de muitos Estados vizinhos de outros mais poderosos e, frequentemente, com um padrão comportamental imperial ou hegemónico.

Assim sendo, o arsenal nuclear é visto por Islamabad (e por Rawalpindi - sede do poder militar) como uma apólice de seguro de vida contra o risco indiano. Significativamente, tendo umas forças armadas numerosas e razoavelmente bem equipadas, é nos meios assimétricos que o Paquistão assenta as suas estratégias de defesa e ataque em relação à Índia:

* Num plano sub-convencional, os grupos terroristas (como o Lashkar-e-Taiba - LeT) que contribuem para um conflito de baixa intensidade em Caxemira e desencadeiam ataques em território indiano, como o ataque ao parlamento de New Delhi em 2001 e os múltiplos ataques em Bombaim em 2008.

* Na extremidade oposta do espectro, está o nuclear que funciona como dissuasão a um ataque convencional indiano e como arma retaliatória caso esse ataque se materialize.

Naturalmente, o programa nuclear paquistanês foi criado e desenvolvido em função da Índia. A primeira preocupação foi a de construir um arsenal suficientemente vasto para maximizar as possibilidades de sobrevivência a um first strike indiano. Tal impeliu o Paquistão para um tremendo esforço de construção e emprego de mísseis e ogivas que lhe permitiram, de acordo com as estimativas mais informadas, ultrapassar New Delhi no número de armas nucleares. DE acordo com a Arms Control, Association, o Paquistão possui 90 a 110 ogivas nucleares e a Índia tem menos de 100.

A segunda preocupação de Islamabad é a de fazer face à superioridade convencional da Índia, especialmente desde que foi divulgada (e nunca oficialmente assumida) a estratégia indiana designada de Cold Start. Cold Start será a retaliação da Índia a incursões e ataques terroristas graves e consiste em incursões localizadas, rápidas e demolidoras em território paquistanês, executadas por forças mecanizadas, para punir o Paquistão por realizar aqueles ataques, ou por albergar, tolerar ou apoiar os grupos responsáveis por esses ataques em solo indiano.

E a forma que o Paquistão escolheu para travar um eventual assalto convencional indiano é recorrendo a armas nucleares de teatro (battlefield nuclear weapons), ou Short Range Nuclear Weapons (SRBM) de que é exemplo o Haft 9 (ou Nasr), um míssil ainda em desenvolvimento, modificado de um original da China, com um alcance de 60 km e que foi testado pela primeira vez em 2011. Ou seja, um ataque convencional indiano colherá uma devastadora, embora limitada, resposta nuclear.

O aspecto mais dramático deste cenário é a sequência: este recurso limitado a armas nucleares desencadeará necessariamente uma retaliação nuclear de New Delhi. Esta pode ser igualmente limitada no poder e no escopo, mas é provável que a resposta da Índia seja um ataque nuclear maciço. Este, por sua vez, despoletaria uma contra-retaliação de Islamabad com o arsenal restante. Numa região que alberga 1.5 biliões de pessoas, estaríamos a contemplar um inferno nuclear com muitos milhões de mortos. Uma estimativa publicada pelo International Herald Tribune em 2002, previa que as vítimas mortais de uma guerra nuclear indo-paquistanesa poderia ascender a 12 milhões.

Country
System[1]
Status
Range[2]
Propellant
Pakistan
Hatf-1
Operational
80-100 km
Solid
Hatf-2 (Abdali)
Tested/Development
190 km
Solid
Hatf-3 (Ghaznavi)
Operational
300 km
Solid
Shaheen-1 (Hatf-4)
Operational
750 km
Solid
Ghauri-1  (Hatf-5)
Operational
1,300 km
Liquid
Ghauri-2  (Hatf-5a)
Tested/Development
2,300 km
Liquid
Shaheen-2 (Hatf-6)
Tested/Development
2,500 km
Solid
Ghauri-3
Development
3,000 km
Liquid
in Arms Control Association em https://www.armscontrol.org/factsheets/missiles

A tipologia dos mísseis paquistaneses (ver quadro supra) encaixa, naturalmente, nos objectivos e estratégia do país: o alcance da maioria das categorias de mísseis operacionais são de curto alcance, principalmente concebidos para destruir alvos específicos, com grandes concentrações militares. Mesmo os de maior alcance, são o suficiente para cobrir o território indiano e não mais do que isso.

Por isso, posicionamos o Paquistão no fundo da cascata: um único inimigo, um só alvo, apenas uma razão para o arsenal nuclear, sendo que esse inimigo/alvo/razão está num plano de poder superior.

Os grandes riscos associados ao arsenal nuclear do Paquistão são dois. Um associado à segurança interna e que consideramos remoto, reporta-se ao poder da insurgência islamista radical, da qual se destaca o Tehrik-i-Taliban Pakista (TTP), que aflige o Paquistão. Teme-se que, num cenário de agravamento da violência e de erosão da ordem pública possa proporcionar a um destes grupos apossar-se de alguns engenhos nucleares.

O outro relaciona-se com a estratégia nuclear de Islamabad que, sendo compreensível face ao diferencial de poder militar com a Índia, pode fazer degenerar uma conflagração militar convencional, mesmo que restrita, num conflito nuclear de alcance e consequências imprevisíveis.

Estes factores, somados à perene conflitualidade entre os dois países, fazem com que a Ásia do Sul seja o palco nuclear mais instável e perigoso do planeta. O Paquistão é frequentemente apontado como O responsável por esta situação, mas é importante compreender a Geopolítica, a História, enfim, os constrangimentos internos e externos que enfrenta, bem como as acções de adversários e aliados. O xadrez nuclear asiático tem vários players, cada um deles com objectivos e interesses a prosseguir. O Paquistão é apenas um deles.


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