GAJO SEM PRINCÍPIOS
Assisadamente, Portugal foi um dos (muitos) países a nível mundial que não reconheceu a independência do Kosovo em Fevereiro passado.
Logo então se percebeu algum desconforto do Governo com a (in)decisão, aparentemente mais resultado das fortes reservas do Presidente da República Cavaco Silva do que de alguma convicção formada.
Pouco mais de meio ano depois, eis que o Governo vira o bico ao prego e, após um simulacro de consultas, reconhece a independência do pequeno protectorado balcânico.
As justificações (?) foram lamentáveis, reduzindo-se a um pífio sentimento de solidão, dado a maioria dos Estados membros da NATO e da EU já terem feito o referido reconhecimento. Esse desesperado sentimento foi ilustrado pelo MNE Português Luís Amado com o desabafo “Os nossos aliados olham para nós e pensam: Mas afinal o que é que estes gajos estão a fazer?”*, supostamente ilustrando a perplexidade dos nossos parceiros nessas organizações perante o nosso não-reconhecimento. Não contente, voltou à carga: “Porque é que estes gajos não tomam uma decisão?”* Na verdade já tínhamos tomado: não reconhecer a independência do pequeno protectorado. Devo acrescentar que só estas frases do MNE me levou a colocar um título que noutras circunstâncias não escolheria.
Esta viragem vergonhosa do Governo (apoiado pelo PSD) não tem justificação. Em primeiro lugar, o que Lisboa decide em ralação a Pristina não preocupa Washington, Berlim, Londres, Paris ou Roma. A decisão destes países em reconhecer o Kosovo foi decisiva. A partir daí, poucos reconhecimentos seriam relevantes e o nosso não se enquadra nessa categoria.
Em segundo lugar, o timing do reconhecimento português é dos mais infelizes, dois meses após a Guerra na Geórgia e do reconhecimento da independência da Abkhazia e da Ossétia do Sul pela Rússia. Na verdade, os acontecimentos do Cáucaso sublinham uma das mais fortes contra-indicações ao reconhecimento do Kosovo, pois, por muitos malabarismos que se façam, a diferença entre um caso e os outros é muito pequena, se é que existe.
Será talvez de esperar, que daqui a uns meses Portugal reconheça a independência da Abkhazia e da Ossétia do Sul, não vão os gajos na Rússia interrogar-se com impaciência de que é os gajos em Portugal estarão à espera.
Portugal demonstra não ter princípios e, por outro lado, parece ter uma confrangedora incapacidade de não ter de seguir sempre as pequenas e as grandes opções das grandes potências, mesmo quando daí não resulta nenhum prejuízo. Popularmente falando, não temos espinha.
* in Diário de Notícias, 11 de Outubro 2008, p. 15
Logo então se percebeu algum desconforto do Governo com a (in)decisão, aparentemente mais resultado das fortes reservas do Presidente da República Cavaco Silva do que de alguma convicção formada.
Pouco mais de meio ano depois, eis que o Governo vira o bico ao prego e, após um simulacro de consultas, reconhece a independência do pequeno protectorado balcânico.
As justificações (?) foram lamentáveis, reduzindo-se a um pífio sentimento de solidão, dado a maioria dos Estados membros da NATO e da EU já terem feito o referido reconhecimento. Esse desesperado sentimento foi ilustrado pelo MNE Português Luís Amado com o desabafo “Os nossos aliados olham para nós e pensam: Mas afinal o que é que estes gajos estão a fazer?”*, supostamente ilustrando a perplexidade dos nossos parceiros nessas organizações perante o nosso não-reconhecimento. Não contente, voltou à carga: “Porque é que estes gajos não tomam uma decisão?”* Na verdade já tínhamos tomado: não reconhecer a independência do pequeno protectorado. Devo acrescentar que só estas frases do MNE me levou a colocar um título que noutras circunstâncias não escolheria.
Esta viragem vergonhosa do Governo (apoiado pelo PSD) não tem justificação. Em primeiro lugar, o que Lisboa decide em ralação a Pristina não preocupa Washington, Berlim, Londres, Paris ou Roma. A decisão destes países em reconhecer o Kosovo foi decisiva. A partir daí, poucos reconhecimentos seriam relevantes e o nosso não se enquadra nessa categoria.
Em segundo lugar, o timing do reconhecimento português é dos mais infelizes, dois meses após a Guerra na Geórgia e do reconhecimento da independência da Abkhazia e da Ossétia do Sul pela Rússia. Na verdade, os acontecimentos do Cáucaso sublinham uma das mais fortes contra-indicações ao reconhecimento do Kosovo, pois, por muitos malabarismos que se façam, a diferença entre um caso e os outros é muito pequena, se é que existe.
Será talvez de esperar, que daqui a uns meses Portugal reconheça a independência da Abkhazia e da Ossétia do Sul, não vão os gajos na Rússia interrogar-se com impaciência de que é os gajos em Portugal estarão à espera.
Portugal demonstra não ter princípios e, por outro lado, parece ter uma confrangedora incapacidade de não ter de seguir sempre as pequenas e as grandes opções das grandes potências, mesmo quando daí não resulta nenhum prejuízo. Popularmente falando, não temos espinha.
* in Diário de Notícias, 11 de Outubro 2008, p. 15