O VERÃO EGÍPCIO
A bandeira do Egipto empunhada por um
manifestante
in Carnegie
Endowment em http://carnegieendowment.org/
A “Primavera Árabe” já está distante. Particularmente no
caso do Egipto, as ilusões primaveris foram amarfanhadas nas eleições de
Outono-Inverno. O Verão, muito provavelmente, vai esmagá-las. Depois de muitas
vicissitudes, tudo indica que que vai ser no Verão que se vai definir o futuro
político do Egipto no curto-médio prazo. E começa já este fim-de-semana.
Nos dias 16 e 17 de Junho, os
Egípcios vão a votos pela 7ª vez desde Outubro de 2011 (3 voltas para elegerem
o Parlamento, mais 2 para escolherem a Shura e outras 2 para eleger um Presidente.
Mas vamos voltar um pouco atrás…
Em Fevereiro de 2011, multidões de Egípcios (as estimativas apontam para números da
ordem dos 750.000 a 1.000.000) manifestaram-se na Praça Tahrir, no Cairo,
durante 18 dias até à abdicação do Presidente Hosni Mubarak.
Os media ocidentais e a maioria dos
analistas estavam eufóricos com aquilo que definiam como uma reprise da
libertação da Europa Central e Oriental em 1989. Os manifestantes eram
maioritariamente jovens, profissionais liberais e estudantes, instruídos,
ocidentalizados e secularistas. O Egipto caminhava inexoravelmente para se
transformar numa democracia liberal.
Em Outubro de 2011, os EgÍpcios começaram a sua maratona eleitoral. E estilhaçaram
os sonhos de Primavera: dois partidos islamitas tiveram as maiores votações
(Irmandade Muçulmana com 41% dos votos e o Al-Nur, Salafista, com 24%. O maior
partido secularista ficou em 3º lugar com 9% dos votos.
Entretanto, o SCAF (Supreme Command
of the Armed Forces), que tutela o Egipto desde a queda de Mubarak, ia
manobrando para deter as alavancas de poder que lhe interessam (manter as
Forças Armadas, o seu orçamento e os seus interesses económicos fora do
controlo de qualquer poder legislativo ou executivo).
Em Maio de 2012, os Egípcios votam nas eleições
presidenciais. Os vencedores são Mohamed
Morsi, candidato da Irmandade Muçulmana com 26% dos votos e Ahmed Shafiq, o
último Primeiro Ministro de Mubarak e antigo Comandante da Força Aérea, com
25%.
O candidato
islamita tido por mais liberal, Abdel Foutouh, teve 18% e Amr Moussa,
ex-Secretário-Geral da Liga Árabe e ex-MNE, encarado como sendo o mais próximo
dos secularistas, teve 10%.
Regressando ao presente, que conclusões
se podem tirar?
Foi-nos apresentado o que poderia ser: os media ocidentais deixaram-se levar
pelo wishful thinking, vendo aquilo que desejavam, indo além da realidade;
iludiram-se coma Praça Tahrir, onde
esteve, no máximo, 1% da população do Egipto e que, claramente, não eram
representativos do todo. Em literatura é uma sinédoque; em jornalismo é um erro
crasso.
E o que realmente foi: existem dois pólos de poder político e
fáctico no Egipto, os militares com o lastro do regime anterior e os islamitas,
congregado em torno da Irmandade Muçulmana e, em menor grau, dos Salafistas. O
que se disser sobre outras forças e influências, é mero entretenimento.
Em suma, na 2ª volta das eleições,
estão em compita o candidato do principal partido islamita e o mais próximo dos
militares e do regime de Mubarak (e de Nasser e de Anwar Sadat). O que se joga
nas eleições é mais um round neste confronto que inclui, também, a elaboração
da nova constituição. Destes dois momentos, emergerá um vencedor, ou uma
partilha de despojos entre militares e islamitas. A resposta começa a se dado
no fim-de-semana.
2 comentários:
Como direi: o Islão também tem o seu direito de 'cidade'. A ideia, ingénua ou normativa, de que 'normalizamos' ocidentalizando ou democratizando (a mesma coisa?) é uma visão etnocêntrica das coisas. Aliás, em matéria de democracia, o Ocidente anda a precisar de 'arrumar a casa', tantas as fragilidades quenos vêm ao de cima,mal se mexe nos 'pés de barro' da subsistência (todas as economias são de subsistência, afinal!).
Concordo contigo Cláudia. Já pensei de forma diferente, mas actualmente acho que se pode tentar induzir ou incentivar a implementação da democracia liberal, mas se devia desistir da insistência petulante, sempre a imiscuir-se nos assuntos internos de outros países.
Muito países realmente fariam melhor em tratar de resolver os seus próprios problemas em vez de dar bitaites sobre os problemas dos vizinhos.
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