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16 setembro, 2020

Acordo de Abraão e o Inimigo Comum

 ACORDO DE ABRAÃO E O INIMIGO COMUM

 

As bandeiras dos 4 países envolvidos, projectadas na muralha de Jerusalém.

 in “BBC News” em https://www.bbc.com/news/world-middle-east-54168120  

Israel foi fundado em 1948. Após muito antagonismo, hostilidade três guerras, o Egipto tornou-se, em 1979, o primeiro Estado Árabe a estabelecer relações diplomáticas com Israel. Volvidos 15 anos, em 1994, a Jordânia seguiu o mesmo caminho.*

Ontem, volvidos 72 desde a fundação de Israel, 41 anos após o Cairo e 26 anos após Amman, mais dois Estados Árabes, os Emiratos Árabes Unidos (EAU) e o Bahrain, juntaram-se a Benjamin Netanyahu e Donald Trump na Casa Branca para formalizar as relações entre Jerusalém, Abu Dhabi e Manama, o Acordo de Abraão.

O Presidente Trump proclamou que se virara uma página relevante na política e na Geopolítica do Médio Oriente: the dawn of a new Middle East". E assim é. O estabelecimento de relações diplomáticas do Egipto e da Jordânia com Israel foram feitas entre vizinhos que se haviam guerreado e que almejavam pôr uma pedra sobre o assunto e ter um relacionamento pacífico quanto possível.

 

Os 4 protagonistas: Abdullatif bin Rashid AlZayani (Bahrain), Benjamin Netanyahu (Israel), Donald Trump (EUA) e  Sheikh Abdullah bin Zayed (EAU).

 in “BBC News” em https://www.bbc.com/news/world-middle-east-54168120

Malgrado a oposição dos palestinianos, a suspensão de novas anexações israelitas na margem Ocidental do Jordão foram um dos ganhos do Acordo de Abraão e que, teoricamente, poderão relançar o processo negocial israelo-palestiniano. Por outro lado, Donald Trump e outras fontes aventaram a probabilidade de 5 novos países aderirem ao Acordo de Abraão, nomeadamente, Oman, Marrocos, Sudão e Arábia Saudita, o que representaria uma ruptura com o passado e poderia consolidar uma vasta zona de cooperação e uma frente robusta vis-à-vis o Irão.

Já os EAU e o Bahrain são membros do Gulf Cooperation Council (GCC) e, durante décadas, integravam um grupo de países fortemente opostos a Israel. Verdade seja dita, que ao longo da década passada a postura dos Estados do GCC para com Israel foi-se moderando, levando a alguma cooperação informal, inclusive com a Arábia Saudita.

Esta nova realidade beneficia os três Estados do ponto de vista económico e comercial, da cooperação tecnológica, militar e de segurança e fomenta um ambiente de paz, escasso no Médio Oriente. Não obstante estes ganhos potenciais, convém frisar que a evolução positiva das relações no passado recente e uma das principais motivações dos Estados envolvidos para chegar a este momento é um clássico da geopolítica: a união para enfrentar o inimigo comum, neste caso o Irão.

 

* A Mauritânia também estabeleceu relações diplomáticas com Israel, mas rompeu-as em 2010.


21 novembro, 2015

Questões Sobre Paris, o Sinai e Dabiq




QUESTÕES SOBRE PARIS, O SINAI E DABIQ

 

Destroços do Airbus A321 da companhia russa Metrojet, alvo de atentado quando sobrevoava a Península do Sinai.

Quando ocorre um ataque terrorista bem sucedido e de grande impacto, acometem-nos muitas questões e inquietações. Porquê? Quem? Como? O que correu mal?

Não há respostas únicas, infalíveis, ou que abranjam todas as situações, mas vamos tentar responder focando-nos nos atentados de 13 de Novembro em Paris e, também, no atentado contra o avião russo sobre o Sinai.

PORQUÊ?
Desconhecemos as motivações específicas e o processo decisório da liderança do Estado Islâmico (IS), mas há 3 justificações prováveis, que podem ser cumulativas.

1- Retaliar contra os ataques realizados pela Rússia e pela França contra os muçulmanos em geral e contra o Estado Islâmico em particular.
2- Demonstrar a capacidade de atacar interesses relevantes dos Cruzados (um avião de passageiros), bem como, no caso da França, atingi-la letalmente na sua capital.
3- Provocar os Estados atacados para que estes destaquem tropas para combater na Síria/Iraque e assim materializar as profecias apocalípticas de um confronto final entre o Islão e os Cruzados em Dabiq, no Norte da Síria.

QUEM?
A propaganda, a doutrinação, o exemplo e o sucesso são as armas do IS para cativar e mobilizar meios humanos. O recrutamento é feito no terreno (Iraque e Síria primordialmente) e no estrangeiro onde coexistam comunidades islâmicas, ressentimento e frustração, principalmente na Europa, Norte de África e na antiga URSS. Para este efeito, o uso inteligente da Internet, particularmente das redes sociais, tem-se revelado frutífero para o IS e mortífero para os sues inimigos. Uma vez mobilizados, os efectivos são treinados em missões de combate e (alguns) na montagem de engenhos explosivos eficazes e fiáveis (todos os que foram activados em Paris detonaram) e está montada a estrutura humana e técnica no terreno.

COMO?
Além do treino, da mentalização e dos meios, é preciso traçar objectivos e delinear um plano para os atingir. Tal requer tempo, organização e disciplina para seleccionar e estudar os alvos, analisar os riscos e as metodologias e garantir a coordenação quando, como foi o caso em Paris, se trate de múltiplos ataques desencadeados simultaneamente. Concomitantemente, tem de haver instalações para alojar os terroristas e preparar as operações, veículos para o transporte, aquisição de documentos, armas e explosivos. É, pois, uma operação morosa e elaborada e durante a qual existem diversos momentos vulneráveis à detecção.
 
Ataques em simultâneo e/ou em rápida sucessão exigem planeamento e coordenação apurados.
in STRATFOR at www.startfor.com

ALGUÉM FALHOU?
Tendo em conta que houve participantes nos ataques que já estavam referenciados pelos serviços de segurança da França, Bélgica e Turquia, alguns dos quais vieram da Síria, acostaram na Grécia e atravessaram mais de meia Europa para chegar a França e outros transitavam entre a França e a Bélgica e ainda o tempo, pessoas e meios mobilizados para os ataques, tudo indica que algo falhou na prevenção dos atentados. Mais a mais quando a França foi alvo de ataques mortíferos há 10 meses, quando foi prometido um reforço da segurança. Tal como agora….

No que respeita à destruição do A-321 russo sobre o Sinai, parece claro que a segurança do aeroporto de Sharm El-Sheikh falhou na detecção dos terroristas, dos explosivos, e da sua colocação a bordo do avião; os serviços de segurança egípcios devem ter muito que explicar. Embora os ataques de Paris tenham desviado a atenção do atentado do Sinai, a verdade é que este foi mais mortífero (224 mortos, cerca de 90 a mais do que em França) e com consequências graves para o Egipto dado o impacto negativo no crucial sector do turismo.

Contudo, é bom ter presente que os recursos dos serviços de segurança são limitados e é impossível proteger tudo e todos e vigiar todos os perigos potenciais em permanência. Por isso, continuará a haver ataques terroristas.

PODE ACONTECER AQUI E A MIM?
Sim e sim. Pode acontecer a qualquer pessoa em qualquer lugar. É óbvio que um habitante de Celorico de Basto, de Trancoso, ou de Serpa corre um risco quase nulo. Aliás, Portugal é um país de baixo risco. Porém, a improbabilidade de tal acontecer ode maximizar o efeito surpresa e a destruição num eventual ataque.

PARA QUÊ?
O IS alcançou diversos objectivos com estes ataques. Conseguiu um golpe publicitário que focou em si a atenção de todo o mundo. Aumentou o seu prestígio, reputação e a aura que exerce um fascínio entre aqueles que a ele aderiram ou que por ele sentem alguma simpatia. Atingiu fortemente o inimigo e logo potências como a Rússia e a França. Lançou o medo e até a paranóia em milhões de pessoas, o que é um dos objectivos essenciais do terrorismo – provocar o terror. Do ponto de vista do IS, os atentados do Sinai e de Paris constituíram um sucesso em toda a linha.

OS ATAQUES DO IS SERÃO A SUA PERDA?
É possível. Os ataques a diferentes alvos e a multiplicidade de inimigos que vai criando e atingindo, aumentam a reacção contra o e a vulnerabilidade do Estado Islâmico.

E TAL NÃO REPRESENTA INCOMPETÊNCIA OU ESTUPIDEZ?
Não necessariamente. Estou convencido que a liderança do Estado Islâmico não é uma coisa nem outra. A liderança do IS encontra-se imbuída de uma crença messiânica de que tem de restaurar o Califado Abássida e levar até às últimas consequências as profecias do triunfo global do Islão sobre o Infiel.

Como tal, não procuram alianças, entendimentos, ou cooperação. O objectivo é destruir quem se oponha aos seus desideratos, mesmo que tal acarrete uma proliferação de inimigos e que conduza à sua destruição e ao martírio dos seus membros. Tratados de paz, cedências, acordos não são opção. É uma luta sem quartel, de vida ou de morte.

Será fanático e imprudente, mas tal é o Estado Islâmico e é com isso que temos de contar Luta sem tréguas até ao fim. Em Dabiq ou noutro sítio qualquer…



24 janeiro, 2015

Morreu o Rei



MORREU O REI


O Rei Abdullah (1924-2015) da Arábia Saudita.
in “WAMC – Northeast Public Radio”, em http://wamc.org/  

O Rei Abdullah bin Abdul Aziz da Arábia Saudita morreu. Governou 10 anos como monarca (2005-2015) a que se somam outros tantos (1995-2005) em que foi virtual regente dada a incapacidade física do Rei Fahd. Abre-se agora o 7º capítulo na História contemporânea da Casa de Saud enquanto família real da Arábia Saudita desde a moderna criação do Reino em 1923.

Abdullah governou durante tempos interessantes: 9/11, invasão Anglo-Saxónica do Iraque (2003), programa nuclear e ascensão do Irão como potência regional mais assertiva, operações da Al-Qaeda no Reino no início deste século, a dita Primavera Árabe, a instabilidade e a guerra ao redor do Reino (Egipto, Iémen, Bahrain, Síria, Iraque), a ascensão do Estado Islâmico e o combate geopolítico com Teerão. A tudo isto pode somar-se as reverberações internas destes acontecimentos.

Em tempos difíceis, o saldo do Rei Abdullah é globalmente positivo.

A Arábia Saudita reforçou o seu papel de liderança sobre uma parte substancial do mundo árabe e do universo sunita, logrando conter ou eliminar os efeitos tidos como perniciosos da Primavera Árabe. Nesse plano, sobressaem a intervenção militar de apoio ao regime do Bahrain e o apoio político, diplomático e económico ao novo regime de inspiração militar liderado pelo General Abdel El-Sisi no Egipto, onde derrubou a Irmandade Muçulmana.

No primeiro caso, travou a subida da maioria xiita ao poder e o possível estabelecimento de um testa de ferro iraniano encostado à Arábia Saudita. No segundo caso, subtraiu o mais populoso e armado Estado Árabe a uma entidade hostil (Irmandade Muçulmana) e à influência da Turquia.

Num tempo conturbado, a Arábia Saudita conseguiu congregar à sua volta a maioria dos Estados que lhe são geopoliticamente importantes: os parceiros do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC), o Egipto e a Jordânia, sendo o Iraque e o Iémen as excepções. O Iraque foi “perdido” com a invasão de 2003 e a substituição do regime de Saddam Hussein por outro dominado pela maioria xiita. O Iémen é uma situação em aberto sendo um palco em que a Arábia Saudita continua a deter considerável influência. Embora a seita xiita Zaidi detenha actualmente a maioria das alavancas do poder, a balbúrdia e a desintegração é que são os factores dominantes.



Os reinados dos sucessores do Rei fundador da Arábia Saudita, Abdul-Aziz Al-Saud.
in “STRATFOR” em http://www.stratfor.com/  

Internamente, o Rei Abdullah executou um cuidado exercício de equilíbrio entre reformas ditas liberalizadoras e a manutenção da arquitectura política, religiosa e social tradicional do Reino e na qual se sustenta o poder dos Al-Saud.

A verdade é que, apesar das previsões apocalípticas de instabilidade, revolta e desagregação, feitas a partir de 2011, a Arábia Saudita conseguiu manter-se estável e próspera, erradicou o terrorismo interno, reforçou alguns laços externos e tem aproveitado a guerra na Síria e no Iraque para colocar pressão sobre o Irão.

O curso do confronto geopolítico com o Irão, a gestão do enfraquecido relacionamento com os Estados Unidos e a manutenção do statu quo no Reino e nos seus vizinhos vitais são processos em aberto que continuarão a constituir os principais desafios da Casa de Saud. Em todos eles, a herança do Rei Abdullah não é fácil, mas contém as condições para que a Arábia Saudita prossiga o seu rumo.


* Organização que integra a Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Kuwait, Oman, Qatar e Bahrain.