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31 julho, 2013

O Inverno Egípcio

O INVERNO EGÍPCIO


 

A disputa no Egipto.
in The Washinton post em http://www.wasshingtonpost.com    
 
A PRIMAVERA
Desde Janeiro de 2011 que o Egipto está a maior parte do tempo no topo do noticiário internacional. Primeiro foi a Primavera Árabe que movimentou alguns milhões no Médio Oriente e excitou e deslumbrou muitos mais na Europa e na América do Norte. Supostamente, das manifestações anti-Mubarak e do afastamento destes pelos militares, desabrocharia uma democracia liberal. Mesmo o nome trazia reminiscências da Primavera de Praga.
 
O VERÃO
O deslumbramento feneceu quando se tornou claro que a alternativa ao poder militar era o poder islamita. Chamei-lhe o “Verão Egípcio” Num post de Junho de 2012 (http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/06/o-verao-egipcio.html), que começa assim:
A “Primavera Árabe” já está distante. Particularmente no caso do Egipto, as ilusões primaveris foram amarfanhadas nas eleições de Outono-Inverno. O Verão, muito provavelmente, vai esmagá-las. Depois de muitas vicissitudes, tudo indica que que vai ser no Verão que se vai definir o futuro político do Egipto no curto-médio prazo. E começa já este fim-de-semana.
 
Os islamitas venceram múltiplas eleições, nas quais as forças ditas secularistas tiveram resultados miseráveis. O tandem forças armadas – poder judicial eram as únicas barreiras entre a Irmandade Islâmica e o poder total.
O OUTONO
Depois de vencer as eleições presidenciais, Mohammed Morsi e a Irmandade Muçulmana entraram numa vertigem de poder, arrebanhando poderes e competências, tentando neutralizar o poder judicial e colocando o Presidente fora e acima de qualquer controle político ou judicial. Foi o tempo em que a desilusão se instalou e pareceu irreversível. Os militares, salvaguardando os seus direitos/interesses pareciam ter-se acomodado. A oposição apresentava-se fragmentada e incapaz. Em Dezembro de 2012, no post “O Outono Egípcio” (http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012_12_01_archive.html) terminava assim:
E depois da Primavera das esperanças desmedidas, e da quente realidade do Verão, o Outono no Egipto também é um tempo de folhas caídas: esperanças estilhaçadas, instalação de poderes intransigentes e um esfriar da democracia. Resta aguardar o que o Inverno trará aos Egípcios….
 
O INVERNO
Embora estejamos no Verão, os últimos acontecimentos anunciam o Inverno Egípcio. O Egipto mergulhou novamente no fragor de manifestações maciças, ainda maiores e mais generalizadas do que as de 2011. Pressentindo a mudança dos ventos, os militares posicionaram-se como força de equilíbrio, mas pendendo para os manifestantes. Morsi, no entanto, foi incapaz de ler os acontecimentos e avaliar correctamente a correlação das forças em presença. Caiu num ridículo ainda maior do que o de Mubarak: nervoso, mas desafiador, recusou a proposta dos militares. Mais tarde aceitou-a, mas já estava demitido. Antes que se apercebesse do que se passava, estava preso. E ainda está. Era o fim do processo democrático iniciado em 2011. A Primavera está distante, instala-se o Inverno.
 
E agora?
 
A democracia não está arredada do horizonte, porém, os acontecimentos de Junho/Julho mostraram que a rua egípcia tem, actualmente, poder. Se bem mobilizada, em grandes números, em várias cidades e mantida por algumas semanas, os militares podem ajuizar que se trata do pulsar da maioria dos egípcios e tomam o poder interinamente, até o poder passar nas suas condições aos protagonistas seguintes. Tal mostra, também que como vimos defendendo, os militares detém a chave do poder. Só não o exercem porque têm receio de perder prestígio e porque preferem exercê-lo nos bastidores, sem desgaste político. E vão fazê-lo novamente desta vez.
 
A grande incógnita no roadmap elaborado pelos militares é a Irmandade Muçulmana: Irá ela manter-se no jogo político democrático apesar da humilhante destituição que sofreu? Irá ela aprender com os erros crassos cometidos na ânsia de arrebanhar poder e menosprezar ou asfixiar as forças opositoras? Ou irá regressar a uma semi-clandestinidade. Aguardando melhores dias para regressar?
 
Enquanto a Irmandade Muçulmana delibera e tenta perceber qual o destino da sua liderança aprisionada, o Egipto segue em clima de instabilidade e confronto entre apoiantes e opositores do coup e um crescente número de atentados terroristas na Península do Sinai.
 
Finalmente, o novo regime encontrou apoio na Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos e Kuwait disponibilizaram uns biliões de Dólares para servir de balão de oxigénio que trave a marcha da economia egípcia para a ruptura.
 
Parece claro que o Egipto ainda vai passar por um período difícil, fruto da grave crise económica e da violenta polarização política. Só bons resultados políticos e económicos obtidos pelo o actual governo ou por qualquer outro permitirá uma redução dos níveis de conflito e uma gradual pacificação nacional. E mesmo aí, o melhor que podemos esperar é uma democracia tutelada e balizada pelas Forças Armadas. Podia ser pior, mas o Inverno Egípcio está instalado. Resta saber se vai ser longo e severo….

15 dezembro, 2012

O Outono Egípcio


O OUTONO EGÍPCIO

Bandeira gigante do Egipto numa manifestação anti-Morsi no Cairo a 28 de Novembro.
in “The Times” at http://www.thetimes.co.uk/tto/news/world/middleeast/article3613374.ece
A “Primavera Árabe” já está distante. Particularmente no caso do Egipto, as ilusões primaveris foram amarfanhadas nas eleições de Outono-Inverno. O Verão, muito provavelmente, vai esmagá-las. Depois de muitas vicissitudes, tudo indica que que vai ser no Verão que se vai definir o futuro político do Egipto no curto-médio prazo. E começa já este fim-de-semana.


Assim começava o post O Verão Egípcio publicado em “Tempos Interessantes” no dia 14 de Junho passado (ver em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2012/06/o-verao-egipcio.html )


Nesse fim-de-semana de Junho, os eleitores escolheram por pequena margem Mohammed Morsi, o candidato da Irmandade Muçulmana, para Presidente.


Em Agosto, Morsi remodelou as chefias das forças armadas. Em Setembro incrementou os ataques ao aparelho judicial. Em Novembro, publicou um decreto auto-atribuindo-se plenos poderes e colocando-se acima da lei (sic).


Esta deriva totalitária resulta de vários factores, o principal dos quais é o desejo e a urgência da Irmandade em controlar as alavancas de poder no Egipto. Para tal, precisa de fazer aprovar uma nova constituição por si formatada e desencadear um processo eleitoral legislativo para garantir uma (presumível) maioria parlamentar. A partir daí, com presidência, governo, parlamento por si controlados e constituição a gosto, a Irmandade Muçulmana poderá prosseguir os seus objectivos de islamização política e social do Egipto


É óbvio que se tal for conseguido com base em vitórias eleitorais democráticas, por muito que não se goste, não há muito a dizer. É óbvio também, que se tal desiderato for atingido pela usurpação de poderes pelo Presidente, pelo desrespeito e amarfanhamento do poder judicial e pela manipulação do processo constituinte, então já haverá muito a dizer.

Porém, haverá muito pouco a fazer.


Porquê a urgência? Porque o Egipto está com sérias dificuldades económicas e de financiamento pelo facto de estar a atravessar um PREC (Período Revolucionário Em Curso) desde Janeiro de 2011, durante o qual muita da actividade económica do Egipto quase paralisou e também, as grandes receitas provenientes do turismo secaram. Para ultrapassar a situação, o governo terá de tomar medidas impopulares, como a redução brutal de certos subsídios governamentais, como o dos combustíveis, ou do pão. Urge pois consolidar o poder antes de este poder ser contestado nas urnas.


No já referido post O Verão Egípcio, escrevi: existem dois pólos de poder político e fáctico no Egipto, os militares com o lastro do regime anterior e os islamitas, congregados em torno da Irmandade Muçulmana e, em menor grau, dos Salafistas. O que se disser sobre outras forças e influências, é mero entretenimento.


Isso continua a ser verdade. Os militares não demonstram muita vontade de exercer o poder político e ser responsabilizados pelos resultados da governação. No entanto, querem manter a sua autonomia e os seus privilégios institucionais, corporativos e económicos, ou seja, continuarem a ser uma realidade paralela. Os islamitas, pelo seu lado, compreendem que não é do seu interesse afrontar o exército e, provavelmente, perder. Garantirem o poder e ficarem excluídos da esfera militar será algo com que podem viver por uns anos.


A partir do momento em que os poderes fácticos arranjaram um modus vivendi mutuamente vantajoso, resta pouco que os restantes grupos possam fazer. Daí o ataque ao poder judicial, que era o poder remanescente. As manifestações serão a última arma da oposição secular, liberal, de esquerda, cristã, o que seja. Até agora mostraram alguma eficácia, ao ponto de Morsi ter revogado o seu decreto. Mas no que realmente interessa: presidente, governo, parlamento, constituição da Irmandade e poderes e privilégios das forças armadas, salvaguardados, provavelmente haverá pouco a fazer.

E depois da Primavera das esperanças desmedidas, e da quente realidade do Verão, o Outono no Egipto também é um tempo de folhas caídas: esperanças estilhaçadas, instalação de poderes intransigentes e um esfriar da democracia. Resta aguardar o que o Inverno trará aos Egípcios….

14 junho, 2012

O Verão Egípcio

O VERÃO EGÍPCIO


A bandeira do Egipto empunhada por um manifestante
in Carnegie Endowment em http://carnegieendowment.org/

A “Primavera Árabe” já está distante. Particularmente no caso do Egipto, as ilusões primaveris foram amarfanhadas nas eleições de Outono-Inverno. O Verão, muito provavelmente, vai esmagá-las. Depois de muitas vicissitudes, tudo indica que que vai ser no Verão que se vai definir o futuro político do Egipto no curto-médio prazo. E começa já este fim-de-semana.


Nos dias 16 e 17 de Junho, os Egípcios vão a votos pela 7ª vez desde Outubro de 2011 (3 voltas para elegerem o Parlamento, mais 2 para escolherem a Shura e outras 2 para eleger um Presidente. Mas vamos voltar um pouco atrás…

Em Fevereiro de 2011, multidões de Egípcios (as estimativas apontam para números da ordem dos 750.000 a 1.000.000) manifestaram-se na Praça Tahrir, no Cairo, durante 18 dias até à abdicação do Presidente Hosni Mubarak.

Os media ocidentais e a maioria dos analistas estavam eufóricos com aquilo que definiam como uma reprise da libertação da Europa Central e Oriental em 1989. Os manifestantes eram maioritariamente jovens, profissionais liberais e estudantes, instruídos, ocidentalizados e secularistas. O Egipto caminhava inexoravelmente para se transformar numa democracia liberal.

Em Outubro de 2011, os EgÍpcios começaram a sua maratona eleitoral. E estilhaçaram os sonhos de Primavera: dois partidos islamitas tiveram as maiores votações (Irmandade Muçulmana com 41% dos votos e o Al-Nur, Salafista, com 24%. O maior partido secularista ficou em 3º lugar com 9% dos votos.

Entretanto, o SCAF (Supreme Command of the Armed Forces), que tutela o Egipto desde a queda de Mubarak, ia manobrando para deter as alavancas de poder que lhe interessam (manter as Forças Armadas, o seu orçamento e os seus interesses económicos fora do controlo de qualquer poder legislativo ou executivo).

Em Maio de 2012, os Egípcios votam nas eleições presidenciais. Os vencedores são  Mohamed Morsi, candidato da Irmandade Muçulmana com 26% dos votos e Ahmed Shafiq, o último Primeiro Ministro de Mubarak e antigo Comandante da Força Aérea, com 25%.
O candidato islamita tido por mais liberal, Abdel Foutouh, teve 18% e Amr Moussa, ex-Secretário-Geral da Liga Árabe e ex-MNE, encarado como sendo o mais próximo dos secularistas, teve 10%.
Regressando ao presente, que conclusões se podem tirar?
Foi-nos apresentado o que poderia ser: os media ocidentais deixaram-se levar pelo wishful thinking, vendo aquilo que desejavam, indo além da realidade; iludiram-se coma  Praça Tahrir, onde esteve, no máximo, 1% da população do Egipto e que, claramente, não eram representativos do todo. Em literatura é uma sinédoque; em jornalismo é um erro crasso.
E o que realmente foi: existem dois pólos de poder político e fáctico no Egipto, os militares com o lastro do regime anterior e os islamitas, congregado em torno da Irmandade Muçulmana e, em menor grau, dos Salafistas. O que se disser sobre outras forças e influências, é mero entretenimento.

Em suma, na 2ª volta das eleições, estão em compita o candidato do principal partido islamita e o mais próximo dos militares e do regime de Mubarak (e de Nasser e de Anwar Sadat). O que se joga nas eleições é mais um round neste confronto que inclui, também, a elaboração da nova constituição. Destes dois momentos, emergerá um vencedor, ou uma partilha de despojos entre militares e islamitas. A resposta começa a se dado no fim-de-semana.