REVOLTA EM ATENAS
E passados dois
anos foi-lhes finalmente dada a palavra. E eles usaram-na de forma implacável.
Eles são os
Gregos. O modus operandi foi o voto. A sentença foi inapelável: cortaram à
esquerda e à direita, golpeando e esquartejando com raiva incontida.
No final da
batalha eleitoral, jaziam no campo de batalha o PASOK, a Nova Democracia,
Papandreou, Venizelos, Samaras. Presentes na mente e no voto dos executores
estavam também Merkel, Sarkozy (efectivamente liquidado numa refrega distante),
a Troika e o seu Memorando.
A dimensão do castigo sem precedentes (redução do share do voto da ND e do
PASOK de 80% para 33%!!!) pode surpreender um pouco, mas tendo em conta que os
dois partidos governaram (??) em conjunto no último meio ano, continuando a
impor a mais brutal (e sem sentido) austeridade de que há memória, só se os
Gregos fossem uns totais otários ou tivessem vocação para mártires é que não
iriam procurar alternativas. Não as havendo no centro, encontraram-nas nas
extremidades do espectro político. É clássico e é normal. Também por isso,
sempre fui totalmente contra o Bloco Central.
Resta agora saber que governo a Grécia vai ter e como os representantes
eleitos se vão comportar, perante os seus representados e perante a Alemanha,
que tem actuado como uma potência administrante.
Os Gregos, pelo que se tem ouvido, estão contentes com o que fizeram, mas
expectantes, até um pouco desconfiados, sobre o futuro próximo.
Os Alemães, esses não têm dúvidas: Greece must implement reforms it agreed to as part
of its bailout package. The agreements represent Greece's best path forward and
Athens must adhere to them. (Steffen Seibert, porta-voz do Governo Alemão).
Resulta claro que o
Senhor Seibert (e o Governo Alemão) sabe o que é melhor para os Gregos. Estes,
por sua vez, parecem discordar e gritaram-no de forma ensurdecedora no dia 6 de
Maio.
A política económica (??) e fiscal não pode prosseguir inalterada na
Grécia, sob pena de uma sublevação geral que torne literais os 3 primeiros
parágrafos deste texto. Assim, no plano externo, terá de haver um ajustamento
do plano de estrangulamento, perdão ajustamento, da Grécia, ou o rompimento
total. No plano interno, a reedição de soluções passadas está fora de hipótese,
como comprovou a incapacidade da Nova Democracia formar governo. A
possibilidade de um governo baseado nos partidos da revolta, esvaiu-se com a
abdicação da Syrisa (Esquerda Radical) em constituir governo. Dado que a última
hipótese prevista, um governo formado pelo PASOK, seria uma afronta, parece
caminhar-se para novas eleições em Junho.
Se assim for, teremos de esperar um mês para saber se a Revolta de Atenas
é a sério, ou se, desta vez, o Olimpo pariu um rato.
Post-Scriptum: Cavaco Silva veio mostrar-se preocupado com a ascensão da extrema-direita
e dos eurocépticos na Grécia. Porquê só a extrema-direita? A extrema-esquerda
não o preocupa? E os eurocépticos preocupam-no porquê? Defende o pensamento
único? Por isso é que nunca quis fazer referendos? E mistura-os com extremistas
porquê? Já agora, porque não se cala?
8 comentários:
Estou em pulgas para ver o que vai acontecer à Grécia nos próximos tempos, se de facto o "Diabo" (como a maioria dos meus conhecidos lhe chamam) for mesmo o timoneiro do "barco". E se conseguirem vir à tona (sim, porque mais fundo não podem bater!), mantiverem à deriva e, quem sabe se até navegar, mesmo em passo de caracol?
Estella Queirós
A revolta dos Gregos é apenas normal, previsível e justa. O problema é que a extrema esquerda ou a extrema direita não auguram nada de bom. De um lado um nacionalismo xenófobo e racista (para não ir mais longe), do outro uma política de "parte tudo, quanto pior melhor"... Ou seja: a Grécia parece, numa finalmente dolorosa mas iniludível evidência, sem saída, encurralada, acuada. Aí a queriam os que acham que os países e os povo se podem "mugir" até à exaustão. As sanguessugas ainda vão tentar chupar alguma réstia de sangue até largarem a vítima - quando a despesa for maior que o lucro.
Para esse matadouro se encaminha também Portugal, não nos iludamos como os gregos se quiseram iludir até à excruciante agnórise que agora se desvenda. Quando os portugueses forem chamados a votar será, também para nós, demasiadamente tarde: já os gordos se terão abastecido, já os vampiros terão ressequido o "cadáver adiado" de uma Nação.
O pior de tudo é que não se vê solução ou alternativa. Vertigem suicida em que todos nos afundamos sem estrebuchar sequer...
Nada será possível se se continua a respeitar os tratados europeus e os critérios do malfadado pacto de estabilidade de Merkel e Sarkozy.
Os Estados perderam todas as alavancas da soberania confiando à Europa as políticas monetárias e orçamentais.
Os tratados condenam os Estados à austeridade impondo-lhes um Euro forte e estável que beneficia quase exclusivamente aos Alemães. Estes, aliás, esquecendo que quando fizeram as reformas de que se vangloriam, foi há dez anos, quando a Europa, isto é 70% do mercado export. alemão, não estava em crise!
Não há relance possível no seio das estruturas actuais. Só a ruptura pode libertar a margem suficiente para lutar contra a miséria de massa.
A austeridade conduz a mais austeridade. Ela paralisa a actividade dum pais e encerra-o no circulo vicioso da divida. Porque sem actividade, há cada vez mais divida, mais juros e mais divida.
Esta Europa néoliberal que impõe planos de rigor cada vez mais injustos, cada vez mais fulminantes para as populações, significam : redução e /ou blocagem dos salários e das reformas , encerramento de serviços públicos essenciais, desmantelamento do código do trabalho ,enfim, retrocesso da sociedade duma maneira geral e o perigo de ver despertar soluções extremistas ditatoriais nefastas para a liberdade.
E mesmo se alguns, como noutros tempos Madame Thatcher, nos diziam que não existe nenhuma alternativa a esta fatalidade do aumento das desigualdades, que devemos recusar e combater, penso que é certamente possível mudar o curso duma historia que ainda resta a escrever.
Óptima análise no meu entender!
Obrigada pela partilha. E realmente...porque não se cala o presidente?
Nós pagamos-lhe as mordomias todas a que tem direito (e não tem) na
mesma.
Mina
Estella,
Temos de esperar para ver. Até agora é tudo uma incógnita, mas já há uma torrente de recados (na verdade são ameaças) vindas de Berlim e Bruxelas para coagir o voto dos Gregos...
Caro Sérgio,
Como sempre, implacavelmente to the point.
A revolta dos Gregos terá chegado tarde demais. A inércia é terrível e a política europeia tem vivido na inércia de votar sempre nos mesmos dois partidos de forma alternada, mesmo quando ambos vão ficando cada vez mais iguais e igualmente maus.
O caminho poderia ser a revolta contra a política fiscal emanada de Berlim, mas os caminhos alternativos que vão sendo propostos em França e na Grécia também não levam a lugar nenhum.
Fica a revolta pela revolta....
Caro Sr. Freitas,
Concordo em absoluto consigo relativamente ao Pacto de Estabilidade, às soberanias, aos privilégios alemães, à insensatez suicidária e resolver o déficit asfixiando a economia e à necessidade imperativa de uma ruptura. Inteiramente de acordo!
Mina,
Muito obrigado pelas suas palavras. Não sei porque não se cala; talvez porque se o fizer as pessoas se esqueçam que ele existe...
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