09 maio, 2012

Revolta em Atenas

REVOLTA EM ATENAS



O novo Parlamento grego.

E passados dois anos foi-lhes finalmente dada a palavra. E eles usaram-na de forma implacável.


Eles são os Gregos. O modus operandi foi o voto. A sentença foi inapelável: cortaram à esquerda e à direita, golpeando e esquartejando com raiva incontida.


No final da batalha eleitoral, jaziam no campo de batalha o PASOK, a Nova Democracia, Papandreou, Venizelos, Samaras. Presentes na mente e no voto dos executores estavam também Merkel, Sarkozy (efectivamente liquidado numa refrega distante), a Troika e o seu Memorando.


A dimensão do castigo sem precedentes (redução do share do voto da ND e do PASOK de 80% para 33%!!!) pode surpreender um pouco, mas tendo em conta que os dois partidos governaram (??) em conjunto no último meio ano, continuando a impor a mais brutal (e sem sentido) austeridade de que há memória, só se os Gregos fossem uns totais otários ou tivessem vocação para mártires é que não iriam procurar alternativas. Não as havendo no centro, encontraram-nas nas extremidades do espectro político. É clássico e é normal. Também por isso, sempre fui totalmente contra o Bloco Central.

Resta agora saber que governo a Grécia vai ter e como os representantes eleitos se vão comportar, perante os seus representados e perante a Alemanha, que tem actuado como uma potência administrante.

Os Gregos, pelo que se tem ouvido, estão contentes com o que fizeram, mas expectantes, até um pouco desconfiados, sobre o futuro próximo.

Os Alemães, esses não têm dúvidas: Greece must implement reforms it agreed to as part of its bailout package. The agreements represent Greece's best path forward and Athens must adhere to them. (Steffen Seibert, porta-voz do Governo Alemão).

Resulta claro que o Senhor Seibert (e o Governo Alemão) sabe o que é melhor para os Gregos. Estes, por sua vez, parecem discordar e gritaram-no de forma ensurdecedora no dia 6 de Maio.

A política económica (??) e fiscal não pode prosseguir inalterada na Grécia, sob pena de uma sublevação geral que torne literais os 3 primeiros parágrafos deste texto. Assim, no plano externo, terá de haver um ajustamento do plano de estrangulamento, perdão ajustamento, da Grécia, ou o rompimento total. No plano interno, a reedição de soluções passadas está fora de hipótese, como comprovou a incapacidade da Nova Democracia formar governo. A possibilidade de um governo baseado nos partidos da revolta, esvaiu-se com a abdicação da Syrisa (Esquerda Radical) em constituir governo. Dado que a última hipótese prevista, um governo formado pelo PASOK, seria uma afronta, parece caminhar-se para novas eleições em Junho.

Se assim for, teremos de esperar um mês para saber se a Revolta de Atenas é a sério, ou se, desta vez, o Olimpo pariu um rato.


Post-Scriptum: Cavaco Silva veio mostrar-se preocupado com a ascensão da extrema-direita e dos eurocépticos na Grécia. Porquê só a extrema-direita? A extrema-esquerda não o preocupa? E os eurocépticos preocupam-no porquê? Defende o pensamento único? Por isso é que nunca quis fazer referendos? E mistura-os com extremistas porquê? Já agora, porque não se cala?



8 comentários:

Anónimo disse...

Estou em pulgas para ver o que vai acontecer à Grécia nos próximos tempos, se de facto o "Diabo" (como a maioria dos meus conhecidos lhe chamam) for mesmo o timoneiro do "barco". E se conseguirem vir à tona (sim, porque mais fundo não podem bater!), mantiverem à deriva e, quem sabe se até navegar, mesmo em passo de caracol?

Estella Queirós

Sérgio Lira disse...

A revolta dos Gregos é apenas normal, previsível e justa. O problema é que a extrema esquerda ou a extrema direita não auguram nada de bom. De um lado um nacionalismo xenófobo e racista (para não ir mais longe), do outro uma política de "parte tudo, quanto pior melhor"... Ou seja: a Grécia parece, numa finalmente dolorosa mas iniludível evidência, sem saída, encurralada, acuada. Aí a queriam os que acham que os países e os povo se podem "mugir" até à exaustão. As sanguessugas ainda vão tentar chupar alguma réstia de sangue até largarem a vítima - quando a despesa for maior que o lucro.

Para esse matadouro se encaminha também Portugal, não nos iludamos como os gregos se quiseram iludir até à excruciante agnórise que agora se desvenda. Quando os portugueses forem chamados a votar será, também para nós, demasiadamente tarde: já os gordos se terão abastecido, já os vampiros terão ressequido o "cadáver adiado" de uma Nação.

O pior de tudo é que não se vê solução ou alternativa. Vertigem suicida em que todos nos afundamos sem estrebuchar sequer...

Defreitas disse...

Nada será possível se se continua a respeitar os tratados europeus e os critérios do malfadado pacto de estabilidade de Merkel e Sarkozy.

Os Estados perderam todas as alavancas da soberania confiando à Europa as políticas monetárias e orçamentais.

Os tratados condenam os Estados à austeridade impondo-lhes um Euro forte e estável que beneficia quase exclusivamente aos Alemães. Estes, aliás, esquecendo que quando fizeram as reformas de que se vangloriam, foi há dez anos, quando a Europa, isto é 70% do mercado export. alemão, não estava em crise!

Não há relance possível no seio das estruturas actuais. Só a ruptura pode libertar a margem suficiente para lutar contra a miséria de massa.

A austeridade conduz a mais austeridade. Ela paralisa a actividade dum pais e encerra-o no circulo vicioso da divida. Porque sem actividade, há cada vez mais divida, mais juros e mais divida.

Esta Europa néoliberal que impõe planos de rigor cada vez mais injustos, cada vez mais fulminantes para as populações, significam : redução e /ou blocagem dos salários e das reformas , encerramento de serviços públicos essenciais, desmantelamento do código do trabalho ,enfim, retrocesso da sociedade duma maneira geral e o perigo de ver despertar soluções extremistas ditatoriais nefastas para a liberdade.

E mesmo se alguns, como noutros tempos Madame Thatcher, nos diziam que não existe nenhuma alternativa a esta fatalidade do aumento das desigualdades, que devemos recusar e combater, penso que é certamente possível mudar o curso duma historia que ainda resta a escrever.

Anónimo disse...

Óptima análise no meu entender!
Obrigada pela partilha. E realmente...porque não se cala o presidente?
Nós pagamos-lhe as mordomias todas a que tem direito (e não tem) na
mesma.
Mina

Rui Miguel Ribeiro disse...

Estella,
Temos de esperar para ver. Até agora é tudo uma incógnita, mas já há uma torrente de recados (na verdade são ameaças) vindas de Berlim e Bruxelas para coagir o voto dos Gregos...

Rui Miguel Ribeiro disse...

Caro Sérgio,

Como sempre, implacavelmente to the point.
A revolta dos Gregos terá chegado tarde demais. A inércia é terrível e a política europeia tem vivido na inércia de votar sempre nos mesmos dois partidos de forma alternada, mesmo quando ambos vão ficando cada vez mais iguais e igualmente maus.
O caminho poderia ser a revolta contra a política fiscal emanada de Berlim, mas os caminhos alternativos que vão sendo propostos em França e na Grécia também não levam a lugar nenhum.
Fica a revolta pela revolta....

Rui Miguel Ribeiro disse...

Caro Sr. Freitas,
Concordo em absoluto consigo relativamente ao Pacto de Estabilidade, às soberanias, aos privilégios alemães, à insensatez suicidária e resolver o déficit asfixiando a economia e à necessidade imperativa de uma ruptura. Inteiramente de acordo!

Rui Miguel Ribeiro disse...

Mina,
Muito obrigado pelas suas palavras. Não sei porque não se cala; talvez porque se o fizer as pessoas se esqueçam que ele existe...