SNOWDEN OU
SNOWORM?
Edward
Snowden vendeu segredos relacionados com a segurança nacional dos Estados
Unidos da América. Eu sei que ele se vangloria de não ter recebido dinheiro.
Mesmo admitindo que seja verdade, entregou-os e divulgou-os para obter fama e
mediatismo, para se arvorar em herói de uma causa pouco clara e na qual se
adivinha o nome “Snowden”. Isto para não falar dos livros, palestras e
entrevistas que certamente fará se e quando conseguir sair de Moscovo e que lhe
valerão certamente muita boa maquia. Receba
em dinheiro, géneros, ou algo de imaterial, parece-me líquido que vendeu e se
vendeu. E quem vende, rouba, ou divulga informação secreta do seu país tem um
nome: TRAIDOR.
Se
Snowden quisesse fazer uma denúncia, mudar a situação, suscitar o debate, faria
a denúncia ao Congresso ou aos tribunais, sem comprometer a segurança do seu
país e ficava. Ficava e assumia as consequências. Como outros fizeram antes
dele. Mas não, fugiu como um galináceo apavorado, alegando que tinha medo de
ser torturado e assassinado, como se a sua denúncia pública não fosse ela própria
uma garantia da sua segurança. Como se não fosse mais fácil para os EUA
liquidá-lo no Equador, na Bolívia, ou na Venezuela do que nos próprios EUA.
Snowden,
segundo ele próprio, trabalhou para a CIA e a NSA (indirectamente) durante 6
anos, que pelos vistos foi o tempo que demorou a perceber que fazia coisas
atrozes. O mais curioso é tentar chocar-nos com o facto de os Estados Unidos
espiarem os seus aliados como se tal constituísse novidade: não só os EUA, como
outros países como a França, o Reino Unido e Israel espiam e recolhem
informações em países amigos e aliados. Tal faz parte do core business dos serviços de informações. E não é Snowden que vai
acabar com isso.
De
igual forma, qualquer pessoa que leia material em open source, ou que veja
séries norte-americanas tem noção do potencial de controle e espionagem das
comunicações electrónicas. O que Snowden traz de novo é a documentação
comprovativa das metodologias e dos alvos. É evidente que é grave e danoso para
a imagem dos EUA, bem como para o sucesso das suas actividades de spying & intel, mas ao contrário do
que julga, não vai mudar o mundo, tal como o suspeito violador que dirigia a Wickedleaks não mudou (ver “Wickedleaks” em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2011/02/wickedleaks.html).
Não
estou com isto a defender a espionagem dos cidadãos em roda livre. Por exemplo,
desconfio do novo Bilhete de Identidade com concentração de dados consultáveis
por qualquer agente do Estado munido do aparelho próprio. Não gosto da
proliferação de câmaras quando não são estritamente necessárias, detesto ser
perseguido por carros da polícia descaracterizado como se fosse membro de um gang
de criminalidade organizada, acho abusivo o screening
indiscriminado de comunicações e sinto-me desconfortável por a minha vida poder
ser vigiada através do uso de artefactos como o cartão de crédito e a via
verde.
Não
obstante, compreendo e aceito que as tecnologias sejam utilizadas para
prevenir, deter, combater, punir, exterminar eventuais atacantes. Na medida em
que a lei seja cumprida e o controle seja focado em ameaças credíveis, estamos
no domínio do razoável. A linha separadora entre a vigilância necessária e o
abuso é muita estreita e algo subjectiva. Por isso, é preciso vigiar os
vigilantes e controlar os controladores. E esperar que haja boa-fé e bom senso.
Não é fácil.
Estas são
características que parecem faltar a Snowden. Infelizmente para ele, mas
previsivelmente para mim, as coisas correm-lhe mal. Em vez de herói das massas oprimidas, é um pobre coitado acossado e embarrilado
no aeroporto de Moscovo. Os membros destacados do seu clube de fans são os
Coronéis Tapioca do século XXI (Maduro da Venezuela, Morales da Bolívia, Correa
do Equador e Ortega da Nicarágua.
Não
acho que os EUA se dêem ao trabalho de o abater. Snowden deverá sair da Rússia
eventualmente e provavelmente irá viver e apodrecer num dos países americanos
referidos. Seja onde for, irá viver a olhar por cima do ombro e não usará
computador ou telemóvel. Teve comportamento de verme, terá destino de verme e
até tem, com um pouco de imaginação, nome de verme: EDWARD SNOWORM.
12 comentários:
A questão é evidentemente absurda, como se em 1776 os Pais Fundadores tinham podido imaginar algo como Internet, ou mesmo o telefone.Mas teriam compreendido a capacidade dum governo a ler o correio e de abrir inquéritos e espionar todos aqueles suspeitos de deslealdade.
E teriam certamente compreendido o conceito de arriscar o seu futuro pelo amor dos seus ideais.
E seria evidentemente possível que teriam visto, também, Snowden como o homem que traiu os segredos do seu pais divulgando informação secreta.
Mas não acha que também seria possível que tivessem visto nele um espírito irmão, alguém que que teria feito um passo irrevogável sobre uma questão de principio?
Particularmente, não teriam eles podido ver nele um homem que reconheceu a tendência natural dos governos a estender o controlo sobre os cidadãos, e habitualmente em nome da segurança nacional?
Os Pais Fundadores tinham também criado o 4° "Amendement" na Constituição porque tinham compreendido que o facto de defender a vida privada individual contra a pressão da autoridade governamental é um direito humano essencial e uma salvaguarda importante da liberdade.
Há 238 anos esta declaração chocou muitos.
O mundo saiu mais rico deste acto corajoso da parte de alguém que desafiou os poderosos da época, por idealismo.
Jefferson e Madison, os autores revolucionários desta declaração não traíram o seu pais.
O sistema político baseado na espionagem permanente dos cidadãos, em todos os seus actos e gestos, mesmo os mais simples como telefonar , é o primeiro passo para o mundo que todos tememos. "Big Brother" por todos os cantos, a cada passo que damos, é inviável.
E ainda não chegamos à fase que preparam os cérebros de IBM,na qual a Internet dos objectos será criada. Cada objecto que compramos, sem distinção, será dotado do seu "chip". Os progressos da nanotecnologia e da biotecnologia permitem de pensar que um dia , como jà acontece com a Internet actual, onde o "histórico" das ligações permite de conhecer os nossos gostos em todos os géneros, também "eles" saberão onde estamos em permanência e tudo o que compramos. A nossa liberdade terá chegado ao fim.
Freitas Pereira
Não me parece que pelo facto de ter divulgado uma má prática do seu país, ainda que tenha colaborado nela, Snowden seja um traidor. Podemos especular acerca dos seus motivos. Como visados pela espionagem devemos estar gratos pelo seu acto. Não deixou de ser uma luta de David contra Golias, pelos riscos que acarretou para toda a sua vida. Porque os EUA, que não olham a meios para atingir fins, não esquecem nem largam as presas. Mesmo com toda a ajuda possível, será fugitivo para
sempre. A mesma tecnologia que tão bem conhece ser-lhe-á adversa. E quando deixar de ser notícia, nunca saberemos a razão. Apagado do "sistema"? Da vida?
Quantos haverá que, conhecedores de ilegalidades e práticas isentas de qualquer Ética se calam, quer por receio das consequências (muito menores que as de Snowden), quer porque cairiam em "saco roto".
E se denunciadas quebrando um código deontológico, seriam traição ou prestação de um serviço público no exercício de cidadania?
Ó Rui! Estás mais interessado em desmascarar o mensageiro do que em analisar a mensagem...
Se bem percebi, temos de nos resignar às atividades de espionagem que toda a gente faz a toda a gente. É feio, Rui (a espionagem, bem entendido). E perigoso. Desvalorizares a intrusão sistemática por ponderosas razões de "segurança nacional" (com o subjetivismo que a expressão transporta), para depois te preocupares com o cartão de cidadão, as CCTV espalhadas por todo o lado, a via verde e o cartão de crédito, etc., parece-me incoerente.
Eu sei que esta conclusão soa a ingénuo, mas cá vai na mesma: um genuíno Estado de direito seria aquele onde não há serviços secretos, espiões e outras degenerescências similares.
Um abraço!
PVM
Rui: de facto o moço é traidor (ou um anjo na Terra...); de facto todo o mundo espiona todo o mundo; de facto não posso estar a escrever isto sem a NSA lêr (btw, this is for you, NSA: nhanhanha nhanhanha nhanhanham brhbrhbrhbrhbrh...., bunch of voyeurs!!! ok, ok, it's french but you use the same word, don't you?), de facto a privacidade é uma coisa difícil de definir (e não é de hoje). Mas vale a pena tanto "fuzué" (como dizem os basileiros)? não me parece. Traidores sempre houve, consciências pesadas também, moços puros e angélicos nem por isso, segredos terríveis e violação de correspondência idem aspas na mesma data. Por mim, "tá-se bem" - espionem, leiam, divirtam-se, lambuzem-se, gastem muitos milhões de terabytes e de $$$ a gravar os meus e.mails e os meus telefonemas: tanto se me dá como se me deu :) :) e se um agente Da CIA for a Moscovo, ou a Conchinchina, e meter uma balázio no meio dos olhos do analista de sistemas... são brancos, que se entendam. Este é um mundo amoral, não vale a pena gastar energias a tantar alterar isso. Basta poder adormecer sem peso na consciência - e isso, isso só cada um de nós sabe, nem a NSA consegue descobrir ;). O resto é espuma.
Gostei muito do comentário do Sr. Sérgio Lira! Com humor, escreveu verdades! So que, deixar passar a espuma pode ficar caro, um dia. Penso, ao contrário, que uma reacçao ao nível mundial contra este poder arrogante dos USA de nos espionar,é o mínimo que se pode exigir.
Não posso esquecer a historia do "bom" democrata alemão, que não estava la muito de acordo com a maneira como Hitler escorraçava os opositores do seu caminho nos anos 30.
E no dia em que viu a Gestapo vir buscar o vizinho, não disse nada. Este era Judeu. Depois viu o vizinho socialista ir também. Mas não disse nada! Ele não era socialista! E um dia vieram buscá-lo também. Não compreendeu, porque era democrata. mas já era tarde demais para compreender. E já não havia mais ninguém para o defender ele mesmo.
O que lhe aconteceu, aconteceu a muitos democratas alemães!
Assim, quando o medo se instala por toda a parte, que ninguém ousa revoltar-se, no dia em que se acorda o pesadelo começa. A longa noite salazarista começou assim.
Caro Sr. Joaquim de Freitas: concordo na íntegra. E a alegoria à perseguição nazi diz-me - directamente - respeito. Mas a questão da espionagem electrónica é, aparentemente, inelutável: nenhum de nós pode fazer nada sozinho (no entanto, fica uma ideiazinha maldosa, que já está em execução: um grupo de algumas dezenas de utilizadores da net cria uma rede peer-to-peer e todos enviam (todos a todos) uma meia-dúzia de bites encriptados com uma periodicidade qualquer (hora a hora, por exemplo); do ponto de vista do tráfego de cada um é absolutamente irrelevante, e a brincadeira pode ser feito por bot; o conteúdo do enviado é também totalmente irrelevante; o "escutador" da NSA tem que guardar TODO o tráfego (porque é encriptado) para depois desencriptar e analisar (vamos admitir que é verdade a teoria da conspiração que afirma que os algoritmos de encriptação tem backdoors exigidas pelas autoridades USA...); nos níveis da computação actual esta tarefa (guardar todo este tráfego, desencripta-lo e analisa-lo) é irrealizável em tempo útil, desde que o tal grupo tenha umas dezenas de utilizadores; a NSA já tem "grupos de exclusão" formados por estes maduros que ficam à margem da escuta; este processo está a alastrar e o nº de grupos de exclusão também, obviamente; é uma forma legal e inteligente de resistir pacificamente...).
Quanto à questão do Estado Novo parece-me bem mais complexa: a Ditadura e o Estado Novo tiveram, pelo menos até ao final da IIGG, algum apoio no seio da Nação - propaganda bem feita, endoutrinação eficaz, um António Ferro providencial... de tal forma que, ainda hoje, Portugal é essencialmente salazarista.
Caro Sr. Freitas Pereira,
Eu abomino a pespectiva do Big Brother, mas não pode pôr no mesmo saco Jefferson e Madison e Snowden. Aqueles contribuiram para o arquitectar de um sistema constitucional bem sucedido, este divulgou informações secretas que, mais do que alertar os seus concidadãos, ajudaram inimigos dos EUA. Isto é o que eu considero condenável nele. Para além da convicção subjectiva de não acreditar na bondade das suas intenções.
Estella,
Eu não estou agradecido. Uma coisa é fazer uma denúncia no seu país, outra bem diferente é divulgar segredos de estado a inimios e adversários. Isso é traição. Na mi ha opinião, os traidores devem ser punidos. Fortemente.
Paulo,
Sim, o enfoque do texto foi sobre o mensageiro. A espionagem é algo de incontornável e milenar com que temos de viver. Traição também é milenar, mas é mais execrável, do meu ponto de vista.
Não me é indiferente nem gosto que bisbilhotem as minhas chamadas e mails e acho que os estados democráticos devem ter contenção e equilíbrio quando se trata de questões de segurança e privacidade.
Quando refiro as CCTV e a via verde, refiro-me a controles que não têm a ver com questões de segurança ou de ameaça pública que justifiquem quebra de privacidade.
Quanto ao estado de direito, preocupa-me mais o estado ladrão, vigarista, extorsionista que não paga, não serve, multa e desrespeita os cidadãos.
Enfim, reconheço que é uma linha estreita a que separa a segurança da intromissão abusiva....
Grande comentário Sérgio. É mesmo teu. Até me faz pensar se devia ter escrito o post in the first place!!!! ;-)
Sr. Freitas Pereira,
Com todos os seus defeitos, os EUA estão muito longe do III Reich e não creio que se vá por aí. Agora que toda a atenção é pouca, absolutamente. Como diz o povo, cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.
Sérgio,
As coisas que tu sabes! Também fazes parte de um desses grupos? Não é para responder.
Excelente a observação sobre o Estado Novo.
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