PROJECTO EUROPEU (?)
in “The Economist”, 29 de Outubro 2011
Andámos anos a ouvir louvar o chamado projecto europeu, a sua colegialidade e altruísmo, a forma como permitia que os pequenos tivessem a mesma voz que os grandes, etc, etc.
Quem destoava deste cenário idílico eram os maus dos Britânicos, ou de quando em vez uns Escandinavos mais assertivos, que pareciam sempre querer sabotar o tal projecto.
Nunca subscrevi esse cenário róseo, mas sempre me encontrei em (larga) minoria. Talvez por isso, não consigo deixar de sorrir com os gritos das virgens ofendidas quando há uns anos os líderes do Reino Unido, França, Alemanha e Itália combinaram uma cimeira a quatro à revelia dos parceiros menores. O mesmo acontece agora com a crise da zona euro (quase com 2 anos), com cimeiras a serem marcadas, desmarcadas e remarcadas ao sabor de Angela Merkel, e Nicolas Sarkozy enquanto os outros 15 papalvos fazem a figura do desesperado com dores de dentes, horas na sala de espera do dentista. Sim, porque as medidas supostamente tomadas para combater a crise são como nos arrancar os dentes.
A mim não me choca a manifestação de poder por parte de quem o tem (o que não quer dizer que me agrade). É a ordem natural das coisas, nomeadamente nas Relações Internacionais.
O que me aborrece é a cantiga da falsa fraternidade. Por que é que não assumem que cada Estado-Membro está na EU para defender e promover os seus interesses, mesmo que tal tenha custos para os parceiros?
Ainda pior são os Estados que não conseguem defender capazmente esses interesses e acham que vergando a cerviz aos poderosos é a melhor maneira de sair do buraco em que se meteram (cf. “O Eixo” em http://tempos-interessantes.blogspot.com/2011/08/o-eixo.html ).
Finalmente, ainda pior do que exercer o poder que se tem (Alemanha e França) é exercê-lo de forma incompetente, hesitante, ineficaz.
Isso traduz-se em incontáveis cimeiras inconsequentes, em fundos de resgate insuficientes para tranquilizar os mercados e acudir aos fogos presentes e aos previsíveis desta crise, na negação irracional do inevitável default grego (cf. “Falidos” em http://tempos-interessantes.blogspot.com/2011/08/o-eixo.html escrito em 10 de Abril), mesmo que disfarçado de haircut voluntário, na aposta cega e unidireccional no combate aos deficits (sem negar a prioridade) apostando em aumentos da carga fiscal que afundam as economias e criam uma espiral negativa.
Em suma, estamos reféns. Reféns de uma dívida e de um déficite escandalosa e inadmissivelmente altos, fruto de incompetência criminosa própria. Estamos reféns de um Governo com palas que está determinado a resolver os seus problemas com o dinheiro e o sacrifício sem nexo dos cidadãos e das empresas. Finalmente, estamos reféns dos poderosos Alemães e dos influentes Franceses, que rivalizam na incompetência e na falta de visão e de capacidade de decisão.
Entretanto, o Projecto Europeu que na realidade era um Projecto Franco-Alemão e agora é um projecto Germano-Francês vai navegando à vista até ao iceberg final!