26 junho, 2009

Ilusões Persas



ILUSÕES PERSAS


Nas eleições presidenciais iranianas, o Presidente cessante, Mahmoud Ahmadinejad, conseguiu uma expressiva vitória com 63% dos votos, esmagando a concorrência, deixando o segundo posicionado, Mir Hossein Moussavi com 32% e os dois restantes com votações abaixo dos 2%.

Este resultado provocou surpresa e consternação no Ocidente, esperançado que estava que um candidato dito reformador removesse do poder um Presidente radical, beligerante, desbocado e perigoso.

A surpresa, a desilusão e as reacções, derivam de um conjunto de ilusões fundadas mais em esperança e desejo do que em hard facts.


AS ILUSÕES PERSAS DO OCIDENTE

1- Os Iranianos estão fartos de Ahmadinejad e dos Ayatollahs radicais que os governam e, perante uma alternativa reformadora credível abraçá-la-ão entusiasmados. Na verdade, muitos Iranianos de classe média urbana estarão saturados do Presidente do Irão e das suas políticas externa (agressiva), económica (ruinosa) e social (castradora), mas o populismo de Ahmadinejad, os generosos subsídios e outras prebendas distribuídas pelo Presidente durante o boom petrolífero garantiram-lhe vasto apoio nas camadas populares (maioritárias) e nas províncias.

2- O Irão está longe de ser uma democracia, apesar das eleições. A existência de um Líder Supremo não eleito com reais e supremos poderes, o carácter teocrático do regime e as múltiplas interferências dos ayatollahs, nomeadamente na triagem dos candidatos presidenciais, as limitações às liberdades de expressão e de imprensa, são demonstrativos do cariz não-democrático da dita república islâmica. Esperar que os detentores das alavancas do poder abram mão dele de forma suave e conformada, é outra ilusão.

3- Mir Hossein Moussavi é um liberal, moderado e reformador? Só com boa vontade se poderia chegar a essa conclusão. Poder-se-á dizer que, comparado com Ahmadinejad, qualquer um faz boa figura, mas Moussavi é, há 30 anos, parte do establishment iraniano: protagonista do encerramento das universidades iranianas e de purgas de professores na época da Revolução, Ministro dos Negócios Estrangeiros que defendeu a internacionalização da revolução islâmica e Primeiro-Ministro na altura do lançamento do programa nuclear do Irão. Ou seja, tal como com Khatami, Presidente de 1997 a 2005, o mais que se poderia legitimamente esperar seria um abrandamento dos aspectos mais agressivos e radicais da postura interna e externa do regime, mas sempre dentro das estritas balizas estabelecidas pelo Ayatollah Ali Khamenei e pelo Conselho dos Guardiões.

4- Teerão reflecte o pulsar político do Irão. Não é assim e os resultados eleitorais comprovam-no, mas é a realidade que os correspondentes ocidentais conhecem e extrapolam-na para o país inteiro, o     que cria outra ilusão.

5- As eleições foram uma completa fraude. Francamente, não acredito. Aponta-se como um indício de fraude o facto do Ministério do Interior ter proclamado Ahmadinejad vencedor no dia seguinte às eleições, o que até não é surpreendente se a margem de votos para Moussavi tiver sido tão grande, mas ninguém questiona como Moussavi pôde reclamar vitória no próprio dia das eleições. Além do mais, falsificar uma vitória por 13 milhões de votos, seria uma fraude de dimensões épicas e, portanto, pouco provável.

Daqui não se pode deduzir alguma simpatia pelo regime de Qom, perdão de Teerão, que é opressor do seu povo, retrógrado, belicoso e perigoso para a estabilidade do Médio Oriente e para a segurança do mundo através do seu programa nuclear. Ora, isto não é, bem pelo contrário, um país e uma situação acerca dos quais se possa ter quaisquer ilusões, sob pena de se sofrer forte desapontamento.

6 comentários:

freitas pereira disse...

Excelente analise, Senhor Rui Miguel Ribeiro.

Permita que exponha o meu ponto de vista.

Duas organizações americanas , Terror Free Tomorrow e a New America Foundation ( que se podem dificilmente suspeitar de cumplicidade com o regime iraniano), fizeram um inquérito de opinião por telefone algumas semanas antes do escrutínio. O método de inquérito telefónico não é isento de erros ( um dos pontos fracos é que nem toda a gente tem telefone), mas ele tem o mérito de existir. Os resultados dão a Ahmadinejad mais do dobro das intenções de voto em relação ao seu rival Moussayj .

Precisamos lembrar que em 2005, Ahmadinejad tinha ganho as eleições com 61,7% dos votos, comparáveis aos 62,6% actuais. Nessa época, ele afrontava o presidente Ali Akbar Hashemi Rafsaniani, o que não facilita a organização duma fraude maçiça.

Estou de acordo com o que escreve mais acima, que Ahmadinejad terá realmente obtido a maioria dos sufrágios nas eleições do 12 de Junho ultimo.

O que preocupa as potências ocidentais, não é exactamente a falta de democracia ou a violência do regime, que não é aceitável de qualquer maneira.

Estas razoes são evocadas somente para esconder o verdadeiro problema : não poder controlar o dirigente dum pais considerado como estratégico. E não é a primeira vez que as potência ocidentais “escolhem” o tipo de democracia que lhes convém. Assim foi em Gaza, quando o resultado de eleições puramente democráticas deram um resultado ‘inaceitável” !

Curiosamente, estas eleições persas fazem-me pensar às do México uns anos antes, onde todos os mesmos ingredientes estavam presentes , mas as potências ocidentais não se preocuparam da mesma maneira.

Certos podem pensar que as violências contra os manifestantes tornaram a presidência de Ahmadinejad ilegítima. Mas a situação não era melhor no México. Um conflito extremamente violento começou em Maio 2006 e acabou sete meses mais tarde no Estado de Oaxaca. Numerosos participantes foram mortos na indiferença geral do mundo ocidental.

Anónimo disse...

Bem o Irão é um pais bem difícil de analisar particularmente para analistas ocidentais, particularmente preparados para rever eleições europeias ou até eleições americanas (para não falar de Mexicos). Infelizmente o Irão não se encontra dentro destas chamadas sandbox , e os proprios “Irani” sao surpreendidos.
Entrevistas telefónicas no Irão, para saber quais os resultados? Por favor.
O governo iraniano impôs uma serie de procedimentos de forma a controlar a sua população desde o inicio dos anos 80. Qualquer conversa relativa a politica pode ser escutada e referida as autoridades, isto acontece inclusive nas escolas, portanto uma das primeiras coisas que as crianças iranianas aprendem é a mentir relativamente a assuntos políticos e religiosos. Ninguém no Irão iria dizer que não iria votar em Ahmadinejad, isto chama-se Taqyah, ou seja dissimulação.

Nem todos usam telefone? Curioso e muito comum em Portugal e em países latinos, com o mal dos outros podes se bem, bem o Irão tem mais de 45 milhões de utilizadores de telemóveis e ainda 30 milhões de linhas fixas, assim como uma das maiores taxas de crescimento em telecomunicações do mundo, assim de memoria penso que são o 5° com mais crescimento.

1-Não concordo que Teerão esteja assim tao desfasado do resto do pais, o Irão não é o Paquistão, nem sequer o Afeganistão, não falamos aqui de Kabul ou até de Baghdad. As chamadas "províncias", são outro mito ocidental, é uma analise bastante utilizada para explicar desiquilibrios populacionais em países árabes(Cairo, Argel, etc). O Irão é constituído por outros 10-15 centros de decisão urbanos, a maioria dos iranianos vivem em cidades. Alem disso o perfil etário iraniano caracteriza-se por 60%-70% com menos de 35 anos, com um altíssimo nível de licenciados ou estudantes, todos estes a estudar em cidades. As manifestações contra a alegada vitoria de Ahmadinejad foram uma realidades em quase todas as cidades com mais de 1 milhão de habitantes.

2- Moussavi é uma ameaça para o sistema islâmico, porque ele é um antigo revolucionário e um ex-combatente, com uma áurea de sacrifício e martírio. No Irão existem uma palavra é "Taqyah", de origem arabe mas esta ligada aos principios Shia, significa dissimulaçao. Significa que a oposiçao politica iraniana, so pode mudar as coisas por dentro, dissimulando a sua verdadeira natureza, esta é a realidade politica iraniana dos ultimos 30 anos.
3-A queda da republica islamica de um dia para a outro? Eu sinceramente nao o desejo para o Irao, as ondas de choque dentro da sociedade seriam terriveis, assim como para a regiao e para o mundo. Nem a maioria dos proprios iranianos deseja esta queda, eles percebem bastante o que aconteceu na URSS.

4-Os correspondentes foram completamente ultrapassados por outras fontes mais fidedignas. O Irao é pioneiro da comunicaçao politica deste que Darius I mandou fazer moedas com a sua imagem e um arco (simbolo de valor na cultura persa), passando pelas cartas clandestinas escritas pelo revolucionario iraniano Al-Afghani(durante a revoluçao Constitucional Iraniana 1905-11), que eram lidas nas salas de cha, ou as gravaçoes com os discursos de Khomeini que circulavam clandestinamente pelas casas dos iranianos, até aos actuais Twitters e Facebooks.
5-Fraudes nas eleiçoes, bem os ultimos documentos que sairam indicam que por exemplo na cidade de Kerman, toda a populaçao, repito todos os 600.000 habitantes votaram em Ahmadinejad, ora isto é obviamente impossivel, existem outros casos. Para nao falar da cidade natal de Moussavi, onde Ahmadinejad ganhou com 95 % dos votos. Falamos ainda de mais de 40 milhoes de votos contados em menos de 4 horas. Com um lead start imediato de 60%, bem isto é impossivel, bem nao sou eu que o digo, mas é o Chatam House, fica aqui o link:
http://www.chathamhouse.org.uk/publications/papers/view/-/id/755/

I.S.

Obrigado Rui por escrever sobre o Irao. Nao use o meu nome a responder, ainda tenho que ir la este ano :)
Desculpem eventuais erros, keyboard estrangeiro.

freitas pereira disse...

Apesar das reticências de « Anónimo » creio ainda que o autor do « blog » analisou muito bem a situação. Eu também andei por lá nas décadas de 70 e 80 e no inicio da década de 90 em missão comercial. Mesmo no tempo da “Savak” e do Shah.

Creio que o factor chave do futuro do Irão se situa na sua juventude, de facto.
A juventude iraniana, “capital” da Republica islâmica, viveu uma vida muito diferente da dos pais. Durante a primeira década da revolução e durante a guerra, mas também na década seguinte e mesmo após a chegada ao poder de Khâtami, tanto os jovens como as mulheres foram o alvo principal dos integristas.

O que diferencia os jovens dos anos 2000 dos outros dos anos 1980 é a experiência da Revolução islâmica e as tensões criadas. Estes dois grupos viveram em dois mundos diferentes e desenvolveram sensibilidades muito diferentes. Finalmente nem uns nem outros saíram indemnes dos 27 anos de revolução. Nenhum teve uma juventude “normal” e plenamente vivida.
Tive a oportunidade de fazer a comparação nos quadros jovens que iam chegando às empresas que visitava em relação aos seus predecessores.
Todos tiveram experiências de situações pouco comuns : os jovens dos anos 80 cresceram nos anos post-revolucionàrios e durante a guerra. Eles nela participaram, sobretudo os das classes populares, e marcaram a sociedade com o cunho do “jovem mártir”.

No principio da guerra, Khomeiny tinha lançado a ideia dum exército de 20 milhões de soldados. Este exército, antes de ser uma força militar no sentido clássico do termo, devia ser um exército islâmico,” ideologisado” grande defensor dos valores islâmicos.

Certo é, que hoje, a nova geração iraniana procura agora uma nova identidade.
Ao lado da evolução demográfica e social, a nova geração iraniana lança um olhar sobre o seu universo e procura o seu futuro nos valores modernos; ela pede uma vida mais fácil e mais confortável.
O drama é que para lá chegar é necessário “desalojar” os Ayatollah ! E como ?

Quanto à personalidade de Moussavi, que os ocidentais lamentam de ver perder as eleições, creio que “Anónimo” não analisou completamente o indivíduo.

Ele foi tudo o que o autor do “blog” mencionou e ainda mais. Primeiro ministro durante a guerra com o Iraque, foi responsável do massacre de milhares de prisioneiros políticos. Durante o seu mandato, a totalidade dos partidos e organizações políticas, sindicais, feministas, etc., foram perseguidos, muitos membros, dos quais milhares de jovens e estudantes foram presos e torturados, executados. Trata-se do maior massacre da historia contemporânea do Irão. Entre eles, 53 membros do partido comunista (Tudeh), dos quais 4 já tinham passado 25 anos nas prisões do Shah, poetas, escritores, professores universitários, médicos, dezenas de militares, dos quais o General Afzali, comandante das forças navais, acusado de ser comunista, os principais representantes das minorias religiosas do parlamento liquidados, após terem sofrido torturas físicas e psicológicas ( por exemplo obrigar um prisioneiro a dar o tiro de “graça” nos seus camaradas.)
Centenas de Kurdos e Turkmenes enforcados nas praças publicas. 30.000 assassinatos em poucos meses em 1980. Quatro milhões de Iranianos obrigados ao exílio.
Durante a campanha eleitoral, muitos estudantes pediram a Mussavi de se explicar sobre a sua actuação nestes anos trágicos.

E seria este homem que o ocidente preferia ? Também é verdade que o ocidente é useiro e vezeiro a preferir o pior ao mau !

Anónimo disse...

Bem praticamente o que disse "Freitas Pereira" são factos comunemente conhecidos, que qualquer investigador que conheça o Irão sabe, mas desde já parabens, porque em Portugal raramente alguém esta informado minimamente sobre o Irão, apenas penso que deve continuar a fazer um upgrade constante aos conhecimentos sobre o Irão, é que a evolução é vertiginosa. Quando vivo no Irão tento falar com o máxime de pessoas possivel, desde Mullah até aos mais jovens, os Mullah, acreditem que existem alguns bem "abertos de espirito" surpreendem-me sempre, algims deles até têm problemas por falarem de mais; as crianças e os jovens dizem-me o que os mais velhos, forçados com o chamado Tarof (protocolo comunicativo iraniano) não me dizem.

Somente devo dizer que nunca defendi Mussavi, é simplesmente um mal menor, e já é suficiente "ro rock the boat" do regime. Agora acho bastante exagerado culpa-lo de todos os mihares de mortos do regime iraniano, todos "eles" têm sangue nas mãos, qualquer criança no Irão sabe disto.

Outra questão bastante básica é que Moussavi "não perdeu as eleições", foi como se usa por aqui, suicidado politicamente. Como aconteceu ao alto funcionário do ministério do interior iraniano que divulgou o roubo eleitoral, e faleceu 24 H. depois num acidente de carro.

Agora relativemente aos ocidentais, como diz é melhor nem abrirem demasiado a boca, a mitologia iraniana, se calhar com alguma razão, é alérgica a interferências estrangeiras, sabe como é de Iskander (Alexandrus), Mongois, Ingleses, Russos e Americanos deixaram uma marca nada positiva na consciência colectiva Farsi.

Obrigado pelo feedback muito interessante.
I.S.

Bruno Rodrigues disse...

Caro Rui,
Obrigado pela análise muito interessante. Voltarei sempre. Um abraço.
Bruno Rodrigues

anareis disse...

Querido(a) novo(a) amigo(a), estou precisando muito de novos amigos pra me auxiliarem no meu projeto. Estou criando uma minibiblioteca comunitária e outras atividades pra crianças e adolescentes na minha comunidade carente aqui na minha comunidade carente no Rio de Janeiro,eu sózinha não conseguirei,mas com a ajuda dos amigos sim. Já comprei 120 livros e também ganhei livros até de portugal dos meus amigos dos meus blogs:Eulucinha.blogspot.com ,se quiser pode visitar meus blogs do google,ficarei muito contente. A campanha de doações que estou fazendo pode doar qualquer quantia no Banco do Brasil agencia 3082-1 conta 9.799-3 ou pode doar livros ou pode doar máquina de costura ou pode doar retalhos,ou pode doar computadores usados. Qualquer tipo de doação será bemvinda é só mandar-me um email para: asilvareis10@gmail.com , eu darei o endereço de remessa. As doações em dinheiro serão destinadas a compra de livros,material de construção,estantes,mesas,cadeiras,alimentos,etc. Se voce puder arrecadar doações para doar ao meu projeto serei eternamente grata. Muito obrigado pela sua atenção