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27 outubro, 2014

Descaramento


DESCARAMENTO

 

Passos Coelho discursou no encerramento das jornadas parlamentares conjuntas do PSD e CDS. Ouvi um excerto na SIC: Coelho atirava-se furiosamente aos media, aos jornalistas e aos comentadores políticos, acusando-os de desinformarem, de não estudarem, de não investigarem. Chamou-lhes desonestos, mentirosos, preguiçosos e patéticos. E exigiu-lhes um pedido de desculpas público. Devo ter ficado com os olhos esbugalhados.

 

Coelho começou por não ter a coragem de identificar os media, os jornalistas e os comentadores responsáveis por tão insidiosa conduta. O PSD, que tanto se revoltou recentemente por epítetos como “vigarista” serem aplicados por atacado aos políticos, aplaudiu este ataque indiscriminado a uma classe inteira. Enfim…

 

Contudo, o mais escandaloso no discurso do personagem, é o descaramento demonstrado.

 

Então temos um sujeito que tem mentido aos Portugueses de forma compulsiva ao longo dos últimos 4 anos a acusar em tom revoltado os media, os jornalistas e os comentadores de mentir?

 

Então temos um sujeito que infligiu, em larga medida por opção, um sofrimento ímpar à grande maioria dos Portugueses e que não só não pede desculpa, como se compraz do que fez, a exigir que os media peçam desculpas públicas por comentários que ofenderam a criatura?

 

Então temos um sujeito que em 2011 garantia ter um plano para reduzir o peso e a despesa do Estado e que não só não o tinha como teve preguiça de o fazer, optando pela via cómoda de reduzir salários e aumentar impostos, tem o dislate de rotular os comentadores de preguiçosos?

 

Então temos um sujeito que se recusa a prestar esclarecimentos e justificações sobre dinheiro suspeito que recebeu, aparentemente ao arrepio das regras parlamentares e à margem do fisco, esconde-se atrás da sua maioria e da prescrição, a acusar os comentadores de desonestos?

 

Finalmente, haverá algo mais patético do que um sujeito que ameaça e maltrata os que julga fracos e vulneráveis, como os funcionários públicos, os reformados e pensionistas, ou os jovens à procura de emprego, e se encolhe, humilha e enxovalha perante os fortes e poderosos, sejam eles os detentores das PPP, as empresas energéticas, os bancos, o os poderes de Berlim, Washington, Frankfurt, ou Bruxelas?

 

Passos Coelho é um pobre de espírito, destituído de carácter, ignorante e de má índole, ainda tem o supremo descaramento de invectivar quem quer que seja? Calhorda!

05 abril, 2014

O Circo Chegou, o Circo Partiu


O CIRCO CHEGOU,
O CIRCO PARTIU


BBC Breaking News!!!!

in BBC News at http://www.bbc.com/news/

 Os ciclos noticiosos internacionais são normalmente muito intensos e relativamente curtos. Fazendo um exercício empírico e simplificativo, podemos dizer que se processam assim:


1- Detecção do evento/crise, por vezes quando ele já decorre há algum tempo.


2- Notícias exploratórias, que vão suscitando o interesse a curiosidade do público.


3- Escalada. Corresponde à escalada da própria crise/conflito e ao despacho de “enviados especiais”. É o sinal claro que os media concluíram que a “coisa” é grave e que o seu impacto (e audiência) justifica a despesa. O circo chega à cidade.


4- Efeito multiplicador. Conforme os casos, a invasão dos media ocidentais pode motivar os actores locais a intensificarem as suas acções, cientes do impacto global que passaram a deter. É também a fase em que as potências estrangeiras aumentam a sua pressão e ingerência para obterem um desenlace da crise que lhes seja favorável.


5- Clímax. É a altura em que a crise atinge o apogeu, o drama está no máximo.


6- Conclusão. Do clímax deverá resultar uma conclusão. Os media fecham a história, fazem as malas e partem para o próximo hotspot, ou para casa. O circo parte da cidade.


7- Follow-up. A “conclusão” muitas vezes não encerra o conflito e este continua em versão low-profile, longe dos holofotes mediáticos. Pouca interessa. Não aparece na TV, logo, para a generalidade das pessoas acabou. Não existe.


8- Retorno. Há sempre a possibilidade de haver alguma evolução dramática do conflito que, aliada à eventual ausência de alternativas mais apetecíveis, podem fazer regressar o circo mediático à cidade. Imagino que muitos cidadãos descubram então, com perplexidade, que aquilo que julgavam resolvido e encerrado, afinal prosseguia ininterruptamente há meses, ou mesmo anos.


Vem tudo isto a propósito dos acontecimentos na Europa Oriental, mais concretamente na Ucrânia e na Crimeia, que ocuparam os noticiários desde o final de Novembro, com uma interrupção de algumas semanas na quadra natalícia, até ao fim do Inverno e que tiveram, entre outros, o condão de eliminarem a Síria do ciclo noticioso.


Surgem agora algumas notícias avulsas referindo o 3º aniversário do conflito sírio, o número de mortes, a multidão de refugiados, os desentendimentos entre os rebeldes. No luck. A “coisa” dura há muito tempo, o conflito não parece sair do sítio, apesar dos esforços dos media, não parece haver bons da fita. Um conflito distante, que se arrasta sem fim à vista e em que são quase todos feios, porcos e maus é, como direi,….boooring.


A realidade é que, embora os media marquem os ciclos noticiosos que não podem, regra geral, ser muito longos, a attention span do público é muito curta. As pessoas querem acção, drama e, se possível, um happy end. Mas acima de tudo, querem um end! Se não houver conclusão, as pessoas desligam.


Por isso, já pouca gente presta atenção ao ping-pong entre Moscovo e Washington no qual Kiev e a Crimeia são as bolas.


Por isso, ninguém liga à Síria.


Por isso, as pessoas já desistiram do MH370.


E por isso, já quase toda a gente há anos que muda de canal quando se fala do processo de paz Israelo-Palestiniano.


Em suma, a Guerra dos Cem Anos, no século XXI, seria um desastre mediático.



P.S. Não obstante, para a semana publicarei um post sobre a Síria. Se entretanto não rebentar uma guerra noutro sítio qualquer, é claro.




27 agosto, 2013

Wishful Thinking

WISHFUL THINKING

 
Yuri Andropov sucedeu a Leonid Brejnev como Secretário-Geral do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) em 1982. Após longos e estiolantes 18 anos de governo de Brejnev, durante os quais a URSS atingiu o apogeu do seu poder militar e político no plano externo e, também, estagnou e ossificou o seu sistema económico e político interno, a ânsia no Ocidente era ver suceder-lhe um líder reformista, mais aberto que começasse a rachar o monólito soviético.


Yuri Andropov (1914-1984), líder da URSS durante 15 meses (Novembro 1982-Fevereiro 1984) e Director da KGB entre 1967 e 1982, saudando da tribuna do Mausoléu de Lenine na Praça Vermelha, em Moscovo.

Da realidade ao desejo foi um pequeno passo para os media ocidentais que rapidamente descobriram que Andropov bebia Scotch whisky, ouvia Glenn Miller e devorava literatura norte-americana; desses supostos gostos ocidentais, deduzia-se uma generalizada adesão às convicções ocidentais, mormente no plano político. Ou seja, estávamos perante um reformador. Talvez cientes de que a extrapolação desafiava as regras do bom senso, media houve que foram mais longe, descobrindo (???) que quando regressava a casa à noite, Andropov entretinha tertúlias de debate político com oposicionistas do regime comunista, ao som de Glenn Miller e lubrificadas com Scotch.


Atenção, não estamos a falar de pasquins sensacionalistas e demagogos. Refiro-me a jornais como o Wall Street Journal, o New York Times, o Washington Post e o Christian Science Monitor.


Tudo isto é muito bonito, excepto que esbarrava num pequeno obstáculo: a REALIDADE. E essa realidade era pouco rósea: Andropov era embaixador soviético em 1956 quando os tanques soviéticos invadiram o país e suprimiram a Revolução Húngara com grande violência. Andropov foi um dos instigadores e mentores da invasão. Andropov era membro do Comité Central do PCUS há 21 anos e do Politburo há uma década, ou seja, pertencia ao grupo restrito de altos dirigentes soviéticos.

Mas falta a cereja no topo do bolo da realidade: Yuri Andropov era há 15 anos, desde 1967, o chefe da KGB. Sim, essa mesmo, a polícia secreta soviética, orgulhosa sucessora do NKVD de Staline.


Portanto, de acordo com esses media, Andropov tinha uma vida dupla: de dia mandava prender, torturar, deportar para a Sibéria, executar dissidentes políticos. À noite, convidava-os para ir a sua casa beber uns whiskies, ouvir música e desancar no regime do qual ele era dirigente e responsável pela segurança. Fantástico!!!!


Relembro estes desvarios jornalísticos dos tempos da minha adolescência, porque este é um trend que se mantém até aos dias de hoje. Qualquer novo líder de um país totalitário, autoritário ou simplesmente desagradável aos olhos do Ocidente, é recebido com expectativas inauditas de que se trata de um novo Vaclav Havel ou Lech Walesa, mesmo que ele faça parte integrante do sistema e nele tenha prosperado e dele dependa. Assim foi com Kim Jong Il na Coreia do Norte, com Medvedev na Rússia, ou com qualquer novo Presidente do Irão.


O mesmo esquema mental é aplicado a revoluções em países ditatoriais: em meados da década passada na Ucrânia e no Quirguizistão e, desde 2011 na Líbia, no Egipto, no Iémen e na Síria. Todos eles se iam tornar a breve trecho exemplos de democracias liberais. Oito anos depois, a Ucrânia e o Quirguizistão ainda estão longe de o ser. Dois anos depois, a Líbia e o Iémen são failed states waiting to happen, a Síria está em estado de guerra civil e o Egipto está perto de onde estava em Dezembro de 2010, antes de começar a dita Primavera Árabe.


Conselho de amigo: muito cuidado com aquilo que os media relatam nestas situações. Hoje em dia, a maioria dos media vive em função do que gostavam que fosse, o que muitas vezes está a milhas de distância do que é. Opinam sobre a espuma que vêem e ignoram a realidade histórica, política e cultural, bem como os interesses e os poderes fácticos que na maioria das vezes, passado o delírio das manifestações e dos entusiasmos, são os que prevalecem. No meu tempo de estudante, ensinaram-me que o jornalismo relatava factos e não estados de alma.


Em Inglês existe uma expressão fabulosa que retractar esta atitude na perfeição: WISHFUL THINKING, que significa algo como, pensar aquilo que se deseja, em detrimento da realidade.