O PRINCÍPIO DO FIM
O Bundestag eleito em
2017 tem o maior número de deputados de sempre (709) e, também, o maior número
de grupos parlamentares – 6.
Nos últimos anos temos assistido ao
endeusamento da Chanceler alemã Angela Merkel. As razões são várias: é a líder
de uma grande potência ocidental há mais tempo em funções, lidera um país que
prospera cada vez mais e que é uma implacável máquina exportadora, tem uma
postura normalmente calma, ponderada e equilibrada; também tomou algumas opções
políticas populares para um nicho político, social e mediático com grande
exposição pública, tais como, a abrupta antecipação do fim da indústria nuclear
na Alemanha (2011) e a abertura das fronteiras germânicas a uma avalanche de
refugiados e imigrantes (2015; finalmente, como se sabe, o establishment
político-mediático entrou em órbita com o Brexit, com a eleição de Donald Trump
e com a contínua ascensão de partidos nacionalista e, no desespero,
convenceu-se que Angela Merkel seria um farol da liberdade e putativa líder do
Ocidente, i.e., baluarte do statu quo.
No entanto, a realidade era e é
diferente. Se é verdade que Merkel lidera um país que é um sucesso económico,
já a sua ponderação e equilíbrio são mais questionáveis. Um exemplo disso foi a
repentina e injustificável antecipação do fim do nuclear da Alemanha, reacção
intempestiva e sem fundamento ao desastre de Fukushima no Japão, desde logo
porque a Alemanha não se encontra numa zona de actividade sísmica e não é,
obviamente, ameaçada por tsunamis, já para não referir os enormes cistos
económicos da decisão. Outro exemplo foi a epifania
de Merkel em 2015: a abertura total das portas da Alemanha a refugiados e
imigrantes deu-lhe uma enorme popularidade instantânea, mas como era
previsível, valeu-lhe uma crescente oposição, mesmo dentro do seu partido,
quando a poeira assentou e a realidade de uma decisão emotiva e precipitada se
tornou mais clara: o excesso de refugiados/imigrantes, os atentados
terroristas, a tentativa de impingir os custos da generosidade alemã a outros países europeus, desgastaram-lhe a
imagem e o apoio, que foi sendo transferido para outros partidos. E não podemos
olvidar os enormes custos económicos, sociais e pessoais que a brutal política scroogiana, exigida por Berlim, impôs à
Europa meridional.
Mesmo assim, Merkel chegou a 2017 e
às suas 4ª eleições na condição de líder da CDU com a confiança das vitórias anteriores
e da auréola de invencibilidade. A previsível (e consumada) débacle do SPD que
tem servido de parceiro menor à CDU/CSU, acentuava a confiança numa grande
vitória.
Porém, o desgaste inexorável do tempo
e a cobrança eleitoral das más decisões, a saturação com o establishment
central cada vez mais uniforme, desabaram sobre o SPD, a CDU e a CSU. Se, no
caso do primeiro, os resultados foram devastadores (os piores do pós-II Guerra
Mundial), a CDU e a CSU caíram o suficiente para ficarem muito longe da maioria
absoluta.
Este gráfico mostra
claramente a dimensão das perdas da CDU/CSU e do SDP, que equivalem aos enormes
ganhos do AFD e do FDP, cerca de 14%.
Dois meses volvidos , ainda não há
governo. O FDP (Liberal) abandonou as negociações com a CDU, CSU e os Verdes, o
que parece indiciar que Merkel se terá aproximado mais dos Verdes do que dos
Liberais o que, a ser verdade, é espantoso e incompreensível. O azedume da CDU
após a ruptura mostra também a frustração e o desespero de Merkel. Igualmente
significativo é o facto de os focos principais de divergência entre os 4
partidos terem sido precisamente aqueles onde Merkel falhou: imigração/refugiados,
ambiente e fiscalidade.
Neste momento, após o SPD ter
reiterado que não vai voltar a ser o trampolim de Merkel, restam 3 opções:
recomeço das negociações entre CDU, CSU, FDP e Grunen; governo minoritário;
dissolução do Bundestag e novas eleições. A Chanceler parece querer a última, o
Presidente Frank Walter Steinmeier prefere uma solução governativa no actual
quadro parlamentar. Eos “vencedores” das últimas eleições, a AFD (direita) e o
Die Linke (esquerda), vão assistindo de palanque à desorientação vigente.
A CDU de Angela Merkel até pode
vencer de forma mais expressiva umas eventuais novas eleições, ou conseguir
liderar um governo sem elas, mas o que é claro é que Merkel entrou no princípio
do fim do seu percurso na liderança da Alemanha e da EU.
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