12 julho, 2013

Cavaco Silva Out of the Box

CAVACO SILVA OUT OF THE BOX

 
Cavaco Silva conseguiu surpreender toda a gente na sua comunicação ao país sobre a crise política em Portugal. Eu, como a maioria das pessoas, pensava que ele iria, mais uma vez, dar luz verde e carta-branca ao Governo, abençoando a segunda proposta apresentada por Passos Coelho, que previa a manutenção de Portas no governo e uma reestruturação da orgânica, dos poderes e dos nomes do governo.

Em vez disso, Cavaco Silva encontrou uma fórmula que não agradou a Gregos nem a Troianos. Aliás não agradou a PSD e CDS porque chumbou a proposta conjunta; não agradou a PS, PCP e BE porque vetou eleições imediatas.

Quais são os prós e contras da iniciativa do Presidente?

PRÓS

1- Cavaco Silva pensou out of the box, qualidade que se pensava já não ter. Não se resignou ao óbvio, não se submeteu à coligação e apresentou um caminho alternativo.
 
2- Cavaco Silva conseguiu de uma assentada entalar os 3 partidos que, de formas, em graus e em tempos diferentes são os responsáveis pelo estado catastrófico a que Portugal chegou.
 
3- Cavaco Silva mostrou um cartão vermelho a prazo ao Governo. Sim, ao colocar um prazo de validade de um ano e apenas por causa da duração do resgaste até essa data, Cavaco colocou um rótulo de desconfiança sobre o Governo. É mais do que merecido. A incompetência irrevogável de Passos Coelho e os malabarismos de Portas não lhe deixaram alternativa. Acredito que o tenha feito contrafeito tendo em conta o apoio incondicional que foi dando ao Governo. Mas até Cavaco se encheu. É obra!

CONTRAS

1- Cavaco Silva menorizou e criticou as eleições como forma de resolução do problema. Não o deve fazer porque, para o melhor e para o pior, é o exercício mais nobre em Democracia.
 
2- Cavaco Silva sobrevalorizou as reacções dos mercados e ainda por cima o seu discurso provocou um impacto semelhante nos juros da dívida soberana ao da demissão de Paulo Portas. Aqui não há volta a dar. Cavaco Silva enferma do mesmo mal que Sócrates, Coelho e Portas: tem terror da Troika, é incapaz de assumir uma atitude de firmeza perante ela e tem uma visão ajoelhada do interesse nacional.
 
3- O horror ao confronto político. Cavaco, talvez ainda estacionado nas suas mega-maiorias de 1987 e 1991, não aceita que o confronto, a divergência e a diferença são ingredientes incontornáveis da Democracia. A sua insistência num consenso à volta de políticas que provocam revolta na maioria da população é uma aberração. Mesmo apreciada por muitos comentadores do establishment, não deixa de ser isso mesmo: uma aberração.
 
4- A proposta/exigência de um entendimento macro-político entre PSD, PS e CDS para o período 2013-2017 é um atentado à Democracia. A Democracia requer alternativas (que é diferente de alternância). Se a intenção de Cavaco vingar, teremos em Julho de 2014 os 3 maiores partidos a concorrerem com uma plataforma comum, reduzindo os eleitores descontentes com ela a optarem entre o PCP, o BE, o MRPP, o PPM, alguns grupúsculos, ou o voto branco ou nulo. Muito mau.
 
5- Se a proposta de Cavaco vingar, teremos estrada livre para a ascensão de projectos de índole totalitária em 2014 e mais além. O descontentamento generalizado não vai desaparecer por obra e graça do Mega Bloco Central e o PS deixará de canalizar parte desse descontentamento. Restam o alheamento (abstenção), o protesto (brancos e nulos) e a extrema-esquerda (PCP e BE), que será a grande vencedora.

Resumindo, a proposta de Cavaco não foi tão má quanto pensei, mas mesmo assim é má. Os contras superam largamente os benefícios e não me refiro à quantidade (5-3), mas sim à bondade destes versus a gravidade daqueles. Resta ainda saber a resposta à million Dollar question: qual é o Plano B de Cavaco Silva?

Talvez nunca venhamos saber. Certo, certo é que estamos nas mãos de Cavaco Silva, Passos Coelho, Paulo Portas e António José Seguro. Isso é, só por si, muito deprimente.

6 comentários:

Cláudia disse...

A "solução" tem um grande enviesamento para o PSD: não transferir poder para o CDS (claramente, o negócio de PPC era mau, nessa perspectiva) e atar o PS à mó da reforma do Estado, para estarem todos presos nas próximas eleições (mau negócio para o PS portanto).
Lesa a democracia e esta treta dos consensos cheira à Grécia por todos os lados: este processo está a penalizar e como a autonomia dos países periféricos.
Plano B: o melhor comentário que ouvi foi do Ricardo Araújo Pereira, sb. governos de iniciatica presidencial: é que a pessoa em causa tem no caderninho dos telefones nºs como os de Dias Loureiro, Duarte Lima... não parece lá muito judicioso na escolha dos áulicos.
Plano C: sugiro o Ricardo Araújo Pereira para chefiar o governo; ou o D. Duarte Pio, se tiver paciência para ensinar Belém a comer de talheres!

Estella disse...

Como já afirmei em comentário anterior, não acredito que os três "estarolas" designados pelo PR resolvam o que quer que seja. Já deram provas do que são capazes ao longo dos anos que precederam o 25 de Abril. Também não compreendo porque não foram incluídos os restantes partidos com assento parlamentar. Teria sido uma atitude democrática e de respeito por quem neles votou. Há como que uma ideia pré-concebida de que os "convidados" presidenciais são os únicos capazes. São precisamente os únicos incapazes, com provas dadas. Dos outros partidos podemos ter as nossas dúvidas, mas não podemos inferir absolutamente nada porque nunca foram governo.
Não tenho uma solução para a crise, tal como não terá a maioria dos cidadãos. Porém, tenho plena e absoluta certeza de que não quero continuar a ser roubada por ladrões de cartola, assistir continuamente à mudança de governos que mais não fazem que governar-se e servir a sua "clientela", ver a justiça pelas ruas da amargura, representantes e funcionários das autarquias que impunemente aparecem ricos da "noite para o dia", empresas públicas de interesse dúbio que não favorecem a população (a não ser as mordomias que proporcionam a quem as representa), etc. Tanto, tanto por onde cortar e beneficiar equitativamente todo os cidadãos de uma nação, defendendo a sua soberania da "matilha" que há muito tenta arrebanhar o que dela sobra!
Pugnemos por integridade nos representantes e transparência nas acções. Acabar com a corrupção era um passo de gigante para a solução.
A altura é de mudança. Não fosse a CPR e os movimentos sociais podiam ser o caminho.

Sérgio Lira disse...

Rui, desta não concordo contigo :) ... Na minha modesta opinião o Cavaco fez foi apenas e somente tentar salvar o que resta do PSD - mesmo que eventualmente à custa do interesse do País. Explico: a negociata do Portas era um golpe e tanto, alcandorando o CDS para um poder que não ganhou pelo voto; PPC, que é um imbecil chapado (pelo menos em termos políticos) aceitou ser capacho do Portas (vá-se lá perceber porquê: agarrado ao poder? sem mais nada para fazer? a mulher mandou?...) e preparava-se para menorizar o PSD na brincadeira. Para o CDS, e para Portas, era o tudo-ou-nada: se corresse bem seriam catapultados para heróis nacionais, se corresse mal era como o Tiririca - pior não fica... Ora há gente no PSD menos burra que PPC e o telefone do Cavaco deve ter tocado a rebate depois daquela homilia em que PPC foi padre e Portas acólito, olá se não deve! E a múmia sai-se com um disparate sem tamanho, uma "solução"-chiclete que por muito que mastiguem nunca será comida; e mesmo que engulam, nunca será digerida. A única coisa que a "solução" da múmia salva é o próprio PSD de ser (eventualmente) eclipsado. Depois de termos um Sampaio a jogar pró PS agora temos um Silva a jogar pró PSD - e que se lixe o País.

Joaquim de Freitas disse...

A peça de teatro , dramático, continua. A mesma galeria de "clochards" da política, de errantes, que vão e vêm, ao sabor duma demissão ou duma birra, de "clowns" ou de doentes que acabam por ser tão célebres como o Rei Lear ou Hamlet de Shakespeare. Porque fazem tremer a Europa.

Mas estas personagens de teatro não têm psicologia, individualidade no sentido clássico : são sombras, figuras, incarnações duma certa condição humana, e sobretudo, são vozes.

O personagem principal da peça define-se pelos seus actos. Se nada se passa, se o personagem não faz nada, não tem nada a fazer, se se satisfaz de estar lá, os outros esperam que ele fale: é este espaço- tempo que é dramático. E lhe confere o estatuto.
Para ele, falar equivale a ser, a subsistir, a continuar apesar da derrocada geral, à sua volta, uma voz que rompe o silêncio universal, para não dizer nada : ele fala como a boca respira. Para ele, a tarefa consiste em representar o personagem que lhe foi confiado. O drama é a razão de ser do personagem; é a sua função vital: necessária para a sua existência. Não esqueçam que eu existo e tenho o poder de os punir !

Vladimir e Estragon continuarão a se falar e a zangar-se, para se reconciliar em seguida. De vez em quando falarão também de suicídio. O segundo sendo , como um cão, que o primeiro segura pela trela . A não ser que seja o contrário!

E assim vão continuar, porque, finalmente, Godot, que eles esperavam, não veio esta noite! Talvez amanha.

Rui Miguel Ribeiro disse...

Cláudia,
Tens toda a razão, especialmente na nota sobre os países periféricos. or perceber que era o "entalado" neste negócio, o PS mandou Cavaco às malvas.
Ricardo Araújo Pereira teria 3 vantagens a priori:
1- É inteligente
2- Tem sentido de humor
3- É do Benfica
Já vi mutios líderes políticos menos qualificados!

Rui Miguel Ribeiro disse...

Estella,
Excelente a resenha do que não quer. Eu também não. Também gostei muito da alusão aos 3 estarolas!!!