BLÁ, BLÁ, BLÁ
Vivemos num país mergulhado em
profunda crise económica, financeira, política, social, psicológica e de
valores. Os problemas são esmagadores e há, cá dentro e lá fora quem se
encarregue de os tornar piores. É evidente que não existe liderança que seja
capaz de conduzir Portugal num rumo que nos leve a um porto minimamente seguro.
Os Portugueses já perceberam isso há
algum tempo. Não deixa de ser confrangedor que quem está em lugares de
responsabilidade não consiga emitir uma mensagem coerente, consistente e
credível que transmita pelo menos uma esperança fundada que algo de bom e justo
está a ser feito. Em linguagem coloquial, ouvimos muito blá blá e pouco
conteúdo credível.
1- Álvaro Santos Pereira apresentou mais um programa para o
crescimento económico e combate ao desemprego. Ou seria ao contrário? Bem, ouvimos uma ou duas coisas boas (corte de 50% na taxa
única portuária), um conjunto de medidas requentadas como a canalização de
financiamento do QREN para as empresas e a redução do IRC, que ainda não vai
acontecer.
Ouvimos outras surreais: “agilizar” a aprovação de projectos de
investimento que estejam congelados há mais de 12 meses!!! Quer dizer que este
indivíduo preside a uma burocracia que mete na gaveta investimentos durante mais
de um ano e volvidos 22 meses no cargo vem gabar-se que vai resolver o problema???
Mas atenção, os que estão à espera há 9 ou 10 meses terão de aguardar
pacientemente até aos 13 meses, altura em que entrará em acção a eficiência do
Sr. Pereira.
Finalmente este liberal da linha
chinesa vai controlar os spreads dos bancos que já disseram que não os iam
baixar e decidiu que a Caixa Geral de Depósitos vai injectar 3.5 biliões na economia.
Blá, blá, blá….
O que o autor deste plano heptanual (os modestos Chineses ficam
pelo quinquenal) não disse, é como estas poucas medidas e muitos desejos vão
revitalizar uma economia moribunda devido à brutal contracção da procura
interna, razão principal do desaparecimento do investimento como apontou a
própria banca. E não adianta decretar que as exportações serão 50% do PIB em
2020 se o PIB vai encolhendo todos os anos, com o desemprego em subida
constante e as empresas a desapareceram aos milhares, até porque a maioria
jamais exportará e depende do mercado interno. E 50% de coisa nenhuma…é zero.
Blá, blá, blá….
2- Cavaco Silva discursou na Assembleia da República na Sessão Solene do 25 de
Abril. E apelou ao consenso. Blá, blá, blá…. E criticou aqueles que “aproveitam”
as dificuldades governativas e económicas para fazer política oposicionista!!!
Eu sei que Cavaco nunca foi oposição a não ser ao último (não o actual) governo
liderado pelo seu partido e, como tal, não estará muito familiarizado com a
praxis oposicionista, mas não será difícil perceber que se a oposição não
explorar as fraquezas governativas (e elas são tantas!), não consegue fazer….pois,
oposição. Largamente branqueando as sucessivas calinadas do governo, Cavaco lá
mencionou que os Portugueses sentiam “fadiga da austeridade”. Mais blá, blá,
blá. Não Senhor Presidente, os
Portugueses não sentem uma fadiga superável com umas horas de sono extra no
feriado; os Portugueses estão saturados, exauridos e revoltados e a sua (nossa)
tolerância para mais blá, blá, blá inconsequente é zero.
3- O burocrata finlandês encarregado da pasta da economia na
CE, Oli Rehn, foi questionado pela eurodeputada Elisa Ferreira a propósito dos custos sociais e económicos que os planos
de ajustamento, vulgo o jugo fiscal, imposto pela Alemanha, EU e FMI a vários
países europeus, especialmente da Europa Meridional, bem como sobre a
razoabilidade (neste caso, a falta dela) de prosseguir neste caminho. O Senhor
Rehn pôs a máscara contrita e disse estar ciente das dificuldades e sofrimento
blá, blá, blá, mas que os ditos planos estavam a resultar, blá, blá, blá e que
a situação melhoraria (presume-se que dentro de relativamente pouco tempo),
sempre blá, blá, blá.
E assim vamos sobrevivendo com uma elite dirigente que
prossegue a sua própria agenda ao arrepio da população e dos eleitores e/ou
vive num mundo de faz-de-conta que nada tem a ver com a realidade que as
pessoas reais vivem no mundo real. Não admira pois que, seja por dolo, seja por
ignorância, não consigam debitar muito mais do que um blá, blá, blá palavroso e
inconsequente, pleno de expressões elaboradas, de anglicismos e de conceitos
rebuscados com que procuram ocultar a sua vacuidade, que aqui ilustramos com um
jocoso blá, blá, blá.
10 comentários:
O problema é que o blá blá blá "deles" é (por hierarquia de valores): a) a fome de muitos, b) a pobreza de tantos; c) o desespero de quase todos; d) a perda de esperança de todos (excepto dos que assinam contratos "suópe"); e) a destruição irremediável desta democracia e desta paz na Europa.
adorei o 'liberal da linha chinesa'...
quanto às causas subjacentes à actuação... serão certamente complexas, mas causa-me sempre perplexidade a (baixa)qualidade do português com que se expressa. Se, porventura, essa corresponde à qualidade do raciocínio...
uma sugestão: indexarmos o vencimento dos nossos políticos à evolução do PIB... numa era de trabalho 'liberal' bem poderiam 'ganhar à comissão' ('disclaimer', para liberais de linha chinesa: ironizo!!)
Excelente como de costume. Tem razão: a realidade é cada vez mais insuportável. Estamos em Abril, mas para o momento é bem a contra revolução capitalista que está em marcha. Os seus projectos são defendidos tanto pela direita sem complexos que pelos partidos sociais democratas. Desmantelamento do direito do trabalho, desmantelamento da protecçao social, dos serviços públicos, dos orçamentos nacionais submetidos à regra de ouro, desmantelamento de toda a proteção do nosso aforro, transformações graves e destructurantes que se instalam de maneira acelerada e simultânea, desequilibrando o mundo e as nossas vidas.
Como o facto de fazer cortes sucessivos em todos os serviços públicos essenciais, como a saúde e a educação, organizando a sua asfixia, e quanto à saúde, afim de deixar o campo livre ao sector privado lucrativo.
Os membros da equipa no poder não são mais que agentes activos da contra revolução capitalista liberal, depois da aceitação do "Tratado sobre a estabilidade, a coordenação e a governança", que induziu uma austeridade tanto injusta que economicamente absurda, um recuo da democracia, até ao projecto de traduzir em texto de lei o acordo que sapa mesmo os fundamentos da soberania nacional.
Claro que nos dizem que "não se deve contrariar os mercados" ! Mas para não os contrariar devemos ir até ao suicídio, quando as pessoas não têm os meios para viver decentemente, sem uma rede de segurança mínima ? Os discursos deles só servem para dissimular por trás duma cortina de fumo as evidências da realidade da exploração capitalista e da sua responsabilidade nos desastres sociais, econômicos e ecológicos que se amplificam.
Apertar o cinto para baixar o "custo" do trabalho, dizem eles! Mas quanto lucro permite ele àqueles que se apoderam da riqueza criada? Dizem que as caixas estão vazias! Mas quem não vê para quem vai a riqueza colectiva, senão para os acionistas, quando não escapa directamente para os paraísos fiscais? Para pagar a divida, dizem eles! Jamais esta poderá ser paga nas condições exigidas pelos credores, porque quando se é obrigado a pedir mais empréstimos para pagar os juros estamos num circulo infernal, sem fim.
A mudança não passará por uma "carta branca" dada aos políticos. Ela implica de sair das armadilhas ideológicas e de se interrogar sobre as estructuras do poder que nos aprisiona para poder em conjunto, à escala da Europa, descontrui-las.
Sérgio,
Tens razão. O blá blá blá é o menos mau. O que o blá blá blá tenta esconder é o pior de tudo. O resto é não ter a coragem e a réstea de dignidade para assumirem as velhacarias que fazem.
Cláudia,
Obrigado pelo elogio. E muito bem dito. Eu acrescentaria à comissão, penalizações por não apresentar resultados e falhar objectivos. Teríamos o Gaspar e o Coelho a financiar o déficite. lol
Sr. Freitas Pereira,
Eu considero-me um liberal, mas concordo em absoluto que estamos num "círculo infernal", numa espiral demencial que nos leva à ruína. Infelizmente, mesmo sem "carta branca" os actuais políticos fazem o que querem (ou o que lhes mandam) e borrifam-se para o eleitorado que, por sua vez, é frouxo na sua revolta. Vivemos um absurdo.
Não lhes perdoo. Sabem muito bem o que fazem.
Alberto
Alas Miguel, I suspect Portugal is not alone. I wonder if you are somewhat ahead of us and we will follow.
Elaine
Alberto,
Não é para perdoar. Ninguém erra tanto e tantas vezes sem dolo! Imperdoável.
Elaine,
Hope not and trust not.
Enviar um comentário