VIOLÊNCIA
E VIOLÊNCIA
Fogo e violência nas manifestações contra a austeridade em Lisboa.
Ontem ocorreram em Lisboa cenas de violência na sequela da greve
geral e das manifestações a ela associadas. Embora não se revestissem das
características destruidoras e de saque supra descritas, não é líquido que não
tenham sido protagonizadas por profissionais
da violência.
Hoje ouvimos na SIC o Presidente da República repudiar estes
acontecimentos “que querem destruir a sociedade [….] e visam destruir a riqueza
do nosso país [….] e a força humana que existe no nosso país”.
Curiosamente, o
mesmo Presidente da República, não teve mais que suaves e subliminares
admoestações ou avisos para com o último e o actual governos que mais não
fizeram/fazem que destruir a sociedade, a
riqueza nacional e a força humana.
Efectivamente, nos últimos anos os Portugueses têm sofrido
sucessivos assaltos fiscais e sociais que lhes provocaram reduções brutais nos
seus rendimentos, já para não falar dos que caíram no desemprego. Tais reduções
lançaram muitos milhares de famílias que viviam sem grande margem entre os
rendimentos e as despesas, na miséria, na indigência, incapazes de pagar a casa
e os estudos dos filhos. Isto é uma violência brutal exercida sobre milhões de
pessoas de forma unilateral e sem qualquer consideração pelas consequências que
esses cidadãos vão sofrer.
Contra esta
violência generalizada e cobarde os cidadãos não têm grande defesa. Os manifestos e
programas eleitorais são uma fraude, os governos mandam em desmando, o
Parlamento divide-se entre uma caixa de ressonância do governo e a vacuidade da
oposição, o Presidente é cúmplice dos governos, o Tribunal Constitucional é uma
farsa. Finalmente, os protestos e
manifestações fazem abanar a governação, podem levar a um recuo táctico como
aconteceu com a TSU, mas passado o abalo, os governos retomam o saque dos
cidadãos, especialmente os da ex-classe média.
Perante esta impotência,
até que ponto é que será legítimo o recurso à força para resistir ao abuso do
aparelho de estado, para resistir ao assalto fiscal, para resistir ao
empobrecimento compulsivo?
Perante esta
realidade, até que ponto é que o recurso à força constitui um exercício de
legítima defesa perante o ataque sem quartel à vida e propriedade dos cidadãos,
das famílias, das empresas?
Toda a vida
acreditei no são funcionamento da democracia. Hoje debato-me com estas graves interrogações.
Fui eu que mudei? Não me parece. O Estado de Direito não existe e a Democracia
está amarfanhada pela rapacidade de poderes espúrios e há limites para a capacidade
das pessoas suportarem o abuso e o sofrimento….
“Roma e os Bárbaros” em
“Vândalos em Londres” em
6 comentários:
Para além das manifestações sinceras que reivindicam um mundo mais justo, caucionamos todos, alguns inconscientemente, uma violência. Não condenamos da mesma maneira os mesmos actos segundo os autores ou os motivos. Um terrorista pode ser um resistente, e vice versa, segundo os países e os regimes políticos vigentes. Em certos casos, pode suscitar a indignação, a aprovação ou mesmo a admiração. O vocabulário escolhido para descrever as duas acções contém nele mesmo o julgamento do acto.
No caso que nos interessa, que o Dr.Miguel Ribeiro muito bem descreve, podemos julgar inapropriado para a causa defendida pelos manifestantes, o acto de destruição do bem alheio. Este acto pode muito bem retirar um pouco da legitimidade à manifestação. E seria lamentável, porque o objectivo da manifestação é justo.
A violência tem, pois, a meu ver, vários rostos, diferentes explicações, ela não é monolítica contra a qual cada um se revolta. A violência não é o apanágio do Mal para se exprimir. O Bem também recorre à violência frequentemente.
Traçar uma hierarquia da violência e uma linha precisa parece impossível.
As suas interrogações são compreensíveis. Os governos e as instituições têm sempre o desejo de criminalizar o associativo, que ele seja sindical ou não, a massa revoltada pelos maus tratos a que é submetida, identificando-os como movimentos violentos e antidemocráticos.
E na verdade, depois de serem desprezados, mesmo perseguidos, aquando das grandes manifestações populares, alguns manifestantes pacíficos arriscam-se a cair numa escolha mais radical da contestação, desapontados pela escuta insuficiente obtida até agora.
Se esta fé num sistema democrático vacila, os movimentos cidadãos caiem na confusão onde não se sabe quem é violento, quem é pacifista, e no fim quem é pela democracia.
Foi sempre o perigo constatado quando num movimento organizado, reflectido, aparece outro mais voluntariamente violento.
Mas o problema essencial resta , e tem razão no seu "post", o da falta duma política justa e legítima, que incita à revolta e pode muito bem levar alguns a compreender e aceitar a violência.
Freitas Pereira
Amigo Doutor Rui Miguel
Continue a "bombardear" estes profissionais do alheio, que nós seremos a "infantaria". Gostava era que a batalha mesmo que tardasse, não falhasse.
Bom fim-de-semana. Beijinhos
Estella
Foste tu que mudaste, Rui. Com eu mudei, e como tantos tipos normalmente pacíficos que se vêem humilhados, espoliados, roubados, saqueados por uma cáfila de energúmenos que se apodera ilegitimamente do poder e da força legal do Estado para lançar o esbulho e o confisco em proveito próprio e dos seus sequazes. Esta "violência legal" está a atingir os limites, se não os excedeu já, e largamente - como a exacção nobiliárquica e senhorial no final do Antigo Regime, que retornou em banhos de sangue. Para aí tristemente nos dirigimos, por culpa das alimárias vesgas que nos governam.
Sr. Freitas Pereira,
Quero felicitá-lo. O seu comentário é fantástico!!!
O 1º parágrafo põe o dedo na ferisda. Eu próprio já me vi perante esse dilema. Acho que toda a gente acaba por cair na tentação do "serviço à la carte"!
Quanto ao resto, penso que expõe muito bem a problemática da liberdade de associação e manifestação, a ordem pública, o desprezo do Estado e o recurso à violência.
Agradeço-lhe vivamente!
Estella,
Continuarei. Mas como já aqui disse, sou um céptixco do sucesso desta mega-empreitada.
Sérgio,
Acho que sim, que mudei. Mas como tu dizes, não mudei de livre e espontânea vontade, nem por conversão ideológoca ou filosófica. Mudei porque atingi a saturação. Atravessaram a minha Red Line!!!
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