INTERVIR
OU NÃO INTERVIR?
To Be, or Not To Be? O
dilema shaksperiano em Hamlet, transposto para Obama e para a Síria.
Em 2011, Barack Obama proclamou solenemente que o
Presidente da Síria Bashar Al Assad havia perdido a legitimidade para governar.
Em 2012 (primeira metade do ano), vários responsáveis
governamentais dos EUA, França e Israel avisavam que a queda do regime sírio
estava iminente e era irreversível.
Em 2013, o regime sírio sobreviveu ao 1º e ao 2º assaltos
e está em vantagem no 3º.
Os recentes sucessos militares da Síria vieram colocar a
política de Washington face à guerra civil na Síria debaixo de atenção e
pressão interna e externa.
Para Obama, a questão fundamental que se coloca é: intervir ou
não intervir (na Síria)? A segunda questão, subsidiária, é como intervir?
Sendo este blog frequentemente muito crítico do actual
Presidente dos Estados Unidos, não nos custa reconhecer que a sua política em
relação ao conflito na Síria tem sido fundamentalmente correcta.
Os EUA, ou qualquer outro país, no processo decisório
sobre uma intervenção militar, deve ponderar antes de qualquer outro factor, o
respectivo interesse nacional. Como é que o interesse nacional será afectado
pela abstenção de actuar e como uma intervenção afectará (des)favoravelmente
esse interesse.
Serão admissíveis intervenções militares em que o
interesse nacional não o exige? Sim, se o interesse nacional não for
prejudicado, se os ganhos forem substantivos e se as perdas e riscos não forem
significativos.
Nada disto se passa na Síria.
O único interesse que os EUA têm na queda do regime do
Partido Ba’ath é na perda por parte do Irão de um aliado estratégico no Médio Oriente
(ver “Os Amigos de Assad“ em http://tempos-interessantes.blogspot.pt/2013/05/the-friends-of-assad.html). Após uma década de envolvimento militar no Afeganistão e no
Iraque, os ganhos com a perda iraniana não justificam os riscos e perdas a
incorrer no teatro sírio.
Se o argumento fosse a brutalidade do regime sírio,
facto sobejamente conhecido há décadas, não faltariam países e regiões para os
EUA intervirem.
Se o objectivo fosse, como parece ser para alguns, a
implementação de um regime liberal, democrático e secular, a composição e
confusão da miríade de grupos oposicionistas e os acontecimentos noutros
estados árabes como a Líbia, o Iémen e o Egipto, deverá fazê-los pensar 10
vezes e desistir.
Porque é que então Obama está a ser pressionado e está
em dificuldades nesta matéria? Por dois motivos:
1-
Uma facção do Partido
Republicano liderada pelo Senador John McCain e os liberais do Partido
Democrata entendem (por motivos um pouco diferentes) que os EUA têm de acudir a
todos os trouble spots do mundo,
castigando os maus e salvando os inocentes. O argumentário é algo apelativo e
colhe o apoio dos principais media: os EUA têm de defender e promover os seus
valores de liberdade e respeito pelos direitos humanos, só os EUA têm a
capacidade e credibilidade para liderar essas intervenções e que milhares de
pessoas estão a morrer fruto da inacção americana. A esta pressão interna,
acresce a pressão exercida no mesmo sentido por alguns países da Europa (França
e Reino Unido à cabeça) e do Médio Oriente (Turquia, Qatar e Arábia Saudita).
2-
O facto de a
Administração Americana nunca ter assumido a sua posição de forma clara e
fundamentada, deixa Obama vulnerável a acusações de hesitação e cobardia, que
seriam evitadas caso assumisse ab initio de forma firme qual era a sua posição
e as suas razões.
A divulgação por parte de Paris e de Londres do uso de
armas químicas por Damasco em quatro ocasiões, coloca Obama entre a espada e a
parede, visto que no Verão passado, e para resistir às pressões, anunciara que
o uso de armas químicas era uma red line para Washington. As armas químicas têm
um anátema porque são vistas (e são de facto) como armas horríveis. Contudo, o
seu efeito militar é na maioria das vezes bastante limitado devido à dispersão
do agente químico pela atmosfera. Daí não ser surpreendente que as estimativas
francesas e britânicas apontem para cerca de 150 mortes com armas químicas num
universo estimado pela ONU de 90.000 mortes na Guerra Civil da Síria.
E assim, sem querer, sem saber ao certo quem apoiar, sem saber o
nível de envolvimento que os EUA acabarão por ter, sem saber as consequências,
sem fazer a mínima ideia que regime sairá de uma eventual vitória dos rebeldes,
Obama vai deslizando para a Síria, porventura dizendo desesperadamente para si
mesmo: Intervir, ou não intervir, eis a questão.