Mostrar mensagens com a etiqueta Hwasong-12. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Hwasong-12. Mostrar todas as mensagens

14 novembro, 2017

C'est Excessivement Grave



C’EST EXCESSIVEMENT GRAVE

 
Lançamento do Hwasong-12 IRBM (Intermediate Range Ballistic Missile) com alcance estimado na ordem de 4500km. Este míssil sobrevoou o Japão nos dois últimos testes.

Nos últimos meses tem havido enorme crispação, agitação e alarme por causa da Coreia do Norte, país de pequena-média dimensão geográfica, demográfica e económica, mas com uma capacidade singular para causar reboliço e colocar as principais potências mundiais em sucessivas consultas, cimeiras e reuniões.

Este tom alarmista, a roçar a histeria e a obsessão como vai sendo característico do século XXI é, como já aqui escrevi, um pouco exagerado. Senão vejamos:

1- Cada vez que a Coreia do Norte testa um míssil, já nem falo dos testes nucleares (já foram 5), os governos da Coreia do Sul e do Japão reúnem de emergência, os Estados Unidos debitam mais sanções, a China resmunga e umas dezenas de países emitem declarações, lamentos e condenações.

Para quê? Só este ano, a Coreia do Norte já testou 12 mísseis balísticos, incluindo ICBM’s e continua a fazê-lo. O bulício que sucede a cada teste é uma mise en scène inconsequente. A experiência demonstra a sua futilidade e Pyongyang não faz mais nem menos testes por causa disso. Tornou-se um ritual: um dispara, os outros pulam e gritam e a vida continua.

2- Outro ritual vigente é executado por representantes dos serviços de informações dos EUA, do Japão e da Coreia do Sul, que têm audiências nos respectivos parlamentos, onde comunicam em tom grave e solene que a Coreia do Norte levará a cabo novos ensaios de mísseis, ou, alternativamente, testes nucleares. E os políticos reagem com gravidade, ao estilo do personagem de “Os Maias” de Eça de Queiroz, o embaixador da Finlândia em Lisboa, Steinbroken de seu nome, que gostava de exclamar “C’est três grave. C’est excessivement grave!”, a propósito de tudo e de nada.

Comunicar que a Coreia do Norte irá fazer novos testes com ar de quem acabou de realizar um sofisticado trabalho de espionagem é o equivalente a eu, que escrevo este post na esplanada da praia de Mindelo, declarar solenemente que logo à noite a maré será alta. Outro exercício inconsequente.

3- Ao contrário do que até o circunspecto Vladimir Putin declarou, um conflito armado na Península da Coreia não será uma catástrofe à escala global. Será, sem dúvida, uma catástrofe na Península da Coreia e, eventualmente, nos arredores, mas não à escala global. Portanto, não vale começar a aprovisionar os bunkers.

4- Mais importante é que a guerra, sendo um cenário possível, não é o mais provável. Como também já escrevi em Tempos Interessantes, Kim Jong Un e a liderança norte-coreana não são uns doidos varridos irracionais. A sua sobrevivência, a do regime e a do seu status é a sua prioridade e tudo farão para a garantir. Concomitantemente, só provocarão a guerra numa situação limite (real ou percepcionada).

Certo é que todas as ameaças, sanções, condenações, protestos e exercícios militares foram inúteis para provocar a alteração comportamental da Coreia do Norte. Goste-se ou não, a Coreia do Norte já é uma potência nuclear o que torna a opção bélica mais complicada e perigosa. Sendo claro que o arsenal nuclear de Pyongyang serve um propósito defensivo de dissuasão de ataques, ou tentativas de mudança ou decapitação do regime, o mais realista seria assumir mais este fracasso do regime de não-proliferação nuclear e ignorar olimpicamente a Coreia do Norte. A actual espiral sancionatória e belicista est grave. C’est excessivement grave, como diria o inefável Steinbroken.